O canadense radicado há décadas nos Estados Unidos James Cameron desenvolveu desde os anos 80 do século passado uma forte habilidade para entreter o público de Hollywood. Apesar de suas repetitivas incursões pela pieguice do espetáculo, Cameron faz filmes débeis bons de ver. Em Avatar (2009), milionária superprodução feita para o deslumbramento do olhar, Cameron chega a seu momento mais precioso, onde um certo sentimentalismo e muitos lugares-comuns da narrativa são facilmente esquecidos pelo espectador para se deixar embalar notavelmente pela admirável plástica hollywoodiana das imagens. E Cameron se vale com inteligência e sensibilidade da tecnologia 3-D, permitindo ao espectador desfrutar de tudo sem ranços tecnicistas; a trivialidade da historinha contada por Cameron, inserindo a imagem dentro da imagem para relatar enredos paralelos (um na civilização, outro na selva), fazendo de um mundo o espelho do outro pela adulteração do físico das personagens que habitam os dois mundos (e neste sentido a relação universo digital-mundo real é exposta e exacerbada), pois, como dizia, antes que se escorregue num anacoluto labiríntico, esta boba historinha é superada por uma grandiloquência fílmica que seguidamente virá a apaixonar o assistente, provocando-o de sua passividade nas salas dos cinemas.
Cameron foi o criador dos efeitos especiais de uma das obras emblemáticas do cinema americano dos anos 80, Fuga de Nova York (1980), do norte-americano John Carpenter. Cameron provavelmente nunca será um cineasta capaz de intensidades cinematográficas; ele somente faz bem seu ofício de artesão comercial do cinema. Mas Avatar é um pequeno salto em sua filmografia; tem uma sensorialidade que em seus filmes anteriores faltava. Está longe de propor uma revolução cinematográfica, como 2001, uma odisseia no espaço (1968), do norte-americano Stanley Kubrick. Mas, mesmo que contenha muitas coisas bobas, é uma bobagem bem-feita e por vezes convincente.
Demais, poder rever em cena uma enigmática navegante de mundos estranhos na pele de Sigourney Weaver é reativar nossos melhores e mais jovens estímulos cinematográficos. Avatar repõe em discussão alguns mitos clássicos, lembrando mesmo os faroestes à antiga transpostos para um universo de modernidade tecnológica, como este cruzamento do bom selvagem com o cristão civilizado apiedado. E há uma leitura que se evidencia: a guerra do Iraque ou qualquer guerra imperialista; o imperialismo bélico dos americanos contra os aborígenes simula esta alegoria fantasiosamente política. É claro que sem a ferocidade real de Redacted (2007), obra-prima de Brian de Palma inédita nos cinemas brasileiros.