Pode-se dizer que A duquesa (The duchess; 2008), superprodução de época dirigida por Saul Dibb em seu primeiro filme, mantém sua dignidade fílmica graças aos acordes harmonizados do elenco (Keira Knightley, como já se percebera em Desejo e reparação, 2007, de Joe Wright, é um êxtase de gestos e suspiros, enquanto seu parceiro Ralph Fiennes compõe uma estudada fleuma britânica, sem falar que os intérpretes acessórios como Hayley Atwell na pele da amante do duque e Dominic Cooper emprestando vida ao amante da duquesa estão adequadíssimos), à utilização sensível dos recursos de produção e à direção sem grandes vôos mas correta de Dibb. Todavia, não se pode deixar de dizer também que A duquesa, passadas certas coisas das epidermes emocionais mais plásticas e melodramáticas, faz aportar no coração do espectador um gosto de vazio, de que não se disse quase nada sobre os temas básicos do filme, o retrato duma sociedade repressiva e condicionante e a condição da mulher numa época difícil.
É claro que Dibb não tem (e certamente nem aspira a isto, quero crer) o sentido de cinema do italiano Luchino Visconti, que em filmes como Sedução da carne (1954) e Noites brancas (1957) atingiu um equilíbrio mais profundo ao topar os sentimentos humanos no fundo de uma época; caindo nos lugares-comuns, Dibb torna as anotações de época recheios (embora exuberantes, como o guarda-roupa de produção) e converte as aspirações sentimentais das personagens em melodramas um tanto destoantes. São reservas que se podem fazer a A duquesa, não para desqualificar o filme, mas pô-lo à sua altura: bonito e superficial. Em face da habilidade artesanal de Dibb e o excelente elenco com que contou, será fácil para a mulher de hoje, ainda um pouco vítima de certos condicionamentos sociais arraigados, encontrar um pouco de si e de sua vida na figura provocativa e rebelde de Georgiana Cavendish (1757-1806). Aquilo que o gaúcho Beto Souza não logrou fazer pela mulher contemporânea em Dias e noites (2008) a partir dum romance de Sérgio Jockyman, Dibb se aproxima melhor em A duquesa valendo-se da biografia romanceada de Amanda Foreman.