Se você é um saudosista, fã do Fúria de Titãs de 1981, a refilmagem de Louis Leterrier pode soar exagerada e artificial no excesso de efeitos especiais de última geração. Se você não curtiu o original de Desmond Davis, é bem provável que o remake lhe desagrade na mesma proporção. E, se você é novo para tudo isso, há uma chance muito remota de que você leve tudo na brincadeira e consiga se divertir. Em todo caso, porém, a qualidade deste novo Fúrias de Titãs indeciso acerca de qual tom deveria resgatar é duvidosa e certamente transparente. Mesmo que consiga servir como mero pretexto para divertimento banal, o longa-metragem é tão dispensável quanto o original é para o século XXI em sua forma datada e ultrapassada.
A película retrata a jornada perigosa do semi-deus Perseus (Sam Worthington) filho mortal de Zeus (Liam Neeson) quando sua família de criação é assassinada por Hades (Ralph Fiennes) em uma de suas expedições para manipular o mundo dos vivos. Jurando vingança contra o anjo do mal que visa usar Zeus para disciplinar os humanos cada vez mais descrentes, os interesses de Perseus unem-se aos do reino de Argos, ameaçados por Hades a sacrificar a princesa Andromeda (Alexa Davalos) para evitar o caos, Perseus parte com tropas para descobrir uma forma de matar o Kraken, monstro do mar que será libertado caso o sacrifício não ocorra.
Baseado no fraquíssimo roteiro original de Beverly Cross, a releitura escrita a três mãos realiza várias (e até oportunas) mudanças na história. Na refilmagem, há um embasamento muito mais sólido não só para a trama e as engrenagens desta, mas para os próprios personagens que, se não interessantes, ao menos possuem personalidade e motivações orgânicas algo crucial que faltou no original. Dito isso, o maior problema de Fúria de Titãs reside na sua indecisão acerca de qual clima abraçar. Repleto de diálogos bobos e ocorrências patéticas ao longo da duração, o filme insiste em se levar a sério, acreditando estar dialogando sobre temas fortes e pertinentes quando deveria estar preocupado no resgate puro do escapismo mágico oferecido pelo gênero. Portanto, a irregularidade marca a metragem, repleta de altos e baixos. Exige-se, então, máxima tolerância por parte do público mais cínico.
Realmente não há lugar no filme para cinismo, mesmo que no núcleo da história concentre um número particular de deuses decidindo sobre os castigos da humanidade pela falta do ser humano em idolatrá-los neste caso não é nem cinismo, mas tolice mesmo. Principalmente levando em conta a abordagem do texto e do diretor, Leterrier, que arranca algumas risadas involuntárias no seu retrato do Olimpo e do traje dos deuses (algo que faz jus à tosqueira do original, diga-se de passagem). A verdade é que não existem temas fortes ou envolvimento emocional cercando a obra há apenas a pretensão deslocada de se estar realizando um filme sério. A partir desta óbvia constatação, resta ao filme o entretenimento. E, até certo ponto, convence muito bem como divertimento descompromissado. A tolerância, porém, esgota-se, ao passo que os personagens se tornam mais toscos, os diálogos mais bregas e as resoluções mais idiotas. E o desfecho estúpido da obra certamente te envia para fora da sessão certo de que você não só deve esquecer do filme que acabou de ver, como precisa esquecer dele.
O elenco de Fúria de Titãs, por outro lado, está em total sincronia, entrando no espírito dos personagens e no clima da história. O destaque fica por conta de Ralph Fiennes, mesmo que pareça reprisar em momentos seu papel como Lorde Voldemort em Harry Potter. Sam Worthington, por sua vez, encarna a mesma canastrice proposta por Harry Hamlin no original sua atuação é oca e não temos como pedir mais. Liam Neeson, que já dublou o grande Aslam em As Crônicas de Nárnia, é a escolha ideal para personificar Zeus mesmo com o figurino nada glorioso.
Apesar de tudo roteiro, direção, elenco (altos, baixos, virtudes, vergonhas) o que reina em Fúria de Titãs são os efeitos especiais extravagantes, que consomem a história por inteira. Há momentos em que nada mais importa a não ser aquela criatura meticulosamente computadorizada, aquela sequência de batalha estrategicamente manipulada ou mesmo os cenários cuidadosamente ilustrados. A força do filme é, por bem ou por mal, sua técnica. E é ela quem dá vida ao filme quando todo o resto falha. Claro que, no final das contas, não é o suficiente. Em terra de deuses e monstros, deveria haver mais que mitologia e sacrifício falta emoção e pungência. Mas, mais que isso, faltou objetividade.