Crítica sobre o filme "Casablanca":

Eron Duarte Fagundes
Casablanca Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 16/02/2001

A atriz sueca Ingrid Bergman, em sua autobiografia História da minha vida (1980), dizia das confusões durante das filmagens de Casablanca (1941): diretor, roteirista e outros técnicos discutindo o tempo inteiro, atores sem saber o que estavam fazendo em cena. Isto não seria exatamente o antiprofissionalismo de Hollywood, que deveria gerar uma narrativa tão confusa quanto uma produção amadorística? Curiosamente o filme dirigido pelo húngaro Michael Curtiz passou à história do cinema como o mais caracteristicamente hollywoodiano trabalho já realizado: tudo é muito limpo em suas imagens (limpo demais, talvez) e os diálogos, longe de perderem o sentido ou parecerem improvisados, compõem um enredo evidente –a personagem de Ingrid hesita entre dois amores, seu marido e seu ex-amante, e no fim tudo se compõe à maneira moral de Hollywood, o casal casado parte e o amante se detém no lugarejo, Casablanca, perdido à boca e à margem da Segunda Guerra Mundial, onde vai continuar a tocar seu bar de música ao vivo e ventilador de teto.

Casablanca é o oposto de Cidadão Kane (1941), de Orson Welles. Curtiz é um artesão da indústria e as emoções de que usa são bastante superficiais; é a desabusada superficialidade do cinema o que tem encantado as mais diversas platéias nestes sessenta anos da existência do filme. Não se pode negar o carisma clássico de Humphrey Bogart e sua capacidade de empurrar o filme para diante. E ademais, há em cena um deslumbrante desempenho da maior intérprete que o cinema já produziu: quando ela ouve a música de seu nostálgico amor pela personagem de Borgart, Ingrid empresta à sua criatura uma emoção facial raramente apresentada pelo cinema; isto remete a uma outonal representação de Ingrid, aquela em que ela vive uma dura mãe em Sonata de outono (1978), de Ingmar Bergman. De rostos, tênues palavras e alguns cenários impressionistas é feito o fascínio de Casablanca, muito longe da grandeza das obras-primas do cinema, mas certamente uma peça histórica que merece ser vista, revista e analisada.