Crítica sobre o filme "Igual a Tudo na Vida":

Eron Duarte Fagundes
Igual a Tudo na Vida Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 04/01/2005

IGUAL A ERIC ROHMER - O título deste texto é um exagero: ninguém pode ser igual ao francês Eric Rohmer, cineasta único em sua capacidade de dialogação e na utilização da fala e dos gestos do ator. Mas a função deste exagero é provocativa: chamar a atenção para um novo exercício rohmeriano de filmar a que o realizador norte-americano Woody Allen se entrega em Igual a tudo na vida (Anything else; 2003). Antes de mais nada, a exposição cerebral de conflitos sentimentais é algo que Allen aprendeu bem com seu mestre francês Rohmer. Como Rohmer, Allen, já avançado em anos, gosta de colocar diante de suas câmaras criaturas jovens: isto dá uma certa vitalidade a seu cinema.

Os diálogos não param nunca no novo Allen, seguindo a receita intelectual de Rohmer; afeiçoado por piadas e desfilando algumas tiradas literárias, que ousam referir do romancista russo Fiódor Dostoievski ao filósofo existencialista francês Jean-Paul Sartre, Allen é bastante irregular em Igual a tudo na vida, alternando momentos de algum êxtase cinematográfico com passagens francamente aborrecidas.

Nada é muito fácil no relacionamento dos jovens protagonistas de Allen, o pretendido escritor Jerry Falk e sua tresloucada namorada Amanda que lá pelas tantas começa a rejeitá-lo sexualmente; Allen interpreta David Dobel, confidente madurão de Jerry, e pode-se dizer que o desempenho do ator-cineasta volta a ter certos cacoetes que ele já teria vencido na fase atual de sua carreira; Danny DeVito, como o agente de Jerry, tem um elevado momento interpretativo na cena em que é despedido e sofre um ataque num restaurante. O par vivido por Jason Biggs e Christina Ricci é muito bem dirigido por Allen, e suas inquietações soam convincentes.

Longe do brilho de Dirigindo no escuro (2002), um incompreendido Allen perdido numa fase meio opaca do realizador, Igual a tudo na vida renova a constatação: Allen não decepciona nunca a quem vai ao cinema em busca duma narrativa tão abotoada quanto a de uma obra clássica da literatura do século XIX.