Woody Allen tem seu público cinematográfico cativo. E pode até dar-se algumas ousadias sem fracassar nas bilheterias. É o caso de Todos dizem eu te amo (Everyone says i love you; 1996), em que ele investe sobre um gênero tradicional no cinema americano, o filme musical; enxertando em sua encenação cômico-dramática números musicais a que o humor de Allen empresta uma coreografia desarticulada e nada reverente para os padrões clássicos de canto e música, esta realização do cineasta se insere numa fase de sua carreira em que a alacridade da imagem e a captação dos diálogos do cotidiano intelectual pequeno-burguês por meio de elaborados planos-seqüência o aproximam cada vez mais do cinema do francês Eric Rohmer.
Claro: o americano Allen comunica-se melhor com o grande público do que o francês Eric Rohmer, tão cioso de seu rigorismo moral e estético. E é em Todos dizem eu te amo que Allen chega ao máximo de simplicidade em sua relação com o espectador, despojando seu roteiro e a forma de seu filme de algumas preocupações puristas que por via de regra inundam seus filmes.
Sem atingir a dimensão da fita anterior de Allen, Poderosa Afrodite (1995), que era uma obra-prima, mesmo assim este Todos dizem eu te amo oferece aos admiradores do diretor norte-americano uma nova oportunidade de ver o olhar seduzido pela grande beleza formal das imagens; é particularmente brilhante a maneira mágica como a câmara de Allen capta os cenários naturais das estações, revelando-o um aprendiz do cinema europeu adaptado à indústria americana.
Como já ocorria em Poderosa Afrodite, aqui também Allen contribui com sua racionalidade histriônica para reler em imagens a temática ingênua dos contos de fada, de uma maneira não-hollywoodiana. A seqüência quase ao final de canto e dança entre Woody Allen e Goldie Hawn (que literalmente levita diante das câmaras) é a materialização da magia no cotidiano.
Filme sentimental e romântico, Todos dizem eu te amo não deve ser confundido com as características de facilidade comercial que estes dois adjetivos trazem.