Crítica sobre o filme "Estranho no Ninho, Um":

Eron Duarte Fagundes
Estranho no Ninho, Um Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 16/05/2003

Depois de seus inícios na sua pátria tchecoeslovaca, com alguns filmes hoje só exibidos em cinematecas (uma bela crônica da juventude de Praga nos anos 60 em Os amores de uma loira, 1965), o cineasta Milos Forman explodiu em Hollywood especialmente com esta bomba acionada pela mais característica interpretação de Jack Nicholson em Um estranho no ninho (One flew over the cuckoo’s nest; 1975), que conquistou os principais Oscars do ano em que disputou as estatuetas. Como ocorreu em tudo o que Forman rodou (seu mais recente trabalho visto por aqui, O mundo de Andy, 1999, apresentava o pior dos maneirismos narrativos de Forman, inclusive com uma direção de ator em que sobressaía a canastrice de Jim Carey), este clássico às vezes exageradamente endeusado mistura uma certa personalidade autoral com algumas concessões à indústria.

De uma certa maneira a objetividade crítica do filme ao debruçar-se sobre aspectos da sociedade americana da época obedecia a um modelo de cinema que, mesmo valendo-se dos atributos formais do sistema, queria minar este sistema em sua base com seu próprio veneno.

O que sobrevive nesta narrativa de loucos é a gota de irreverência com que Forman disseca a demência e a repressão da sociedade ocidental. O manicômio em que a rebeldia da personagem de Nicholson é internada simboliza o totalitarismo social e a enfermeira vivida por Louise Fletcher é o signo ditatorial em ação; ao cabo a criatura de Nicholson, cuja capacidade de enfrentamento parecia inesgotável, é tornada em cordeirinho pelo sistema; surge então o ato da notável personagem do índio, que, antes de fugir, mata por asfixia seu amigo ex-rebelde, pois prefere vê-lo morto a tornar-se a sombra de si mesmo vagando sob as garras do poder.

Pode-se comparar a trajetória da personagem de Um estranho no ninho com a do protagonista de Laranja mecânica (1971), de Stanley Kubrick: ambos são mal-criados, marginais, gostam de sexo e enfrentar, e ambos no fim são subjugados pelo sistema. É claro que a metáfora de Forman não tem a exuberância de símbolos de Kubrick. E Forman vai-se adequando formalmente melhor ao sistema de linguagem de Hollywood.