Crítica sobre o filme "Vida de David Gale, A":

Eron Duarte Fagundes
Vida de David Gale, A Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 13/04/2004

Desde O expresso da meia-noite (1978), o realizador inglês, radicado em Hollywood, Alan Parker tem revelado uma fraqueza por golpes narrativos plásticos capazes de aliciar o espectador mais despreparado. Cheio de pretensas intenções críticas sobre o tema de que se aproxima superficialmente e valendo-se dos conhecidos fricotes visuais britânicos, Parker tem-se dado bem no cinema americano graças às facilidades de comunicação com o público.

Seu novo filme, A vida David Gale (The life of David Gale; 2003), parte de um assunto espinhoso: a questão da pena de morte nos Estados Unidos. Colocando em cena um professor de filosofia, vivido com despojado interesse por Kevin Spacey, Parker inicialmente discute antropologicamente o problema da usurpação pelo Estado do direito de matar, revocando Sócrates e Platão; para a ligeireza do cinema de Parker, as referências são muito pretensiosas e deslocadas.

Depois de seu começo intelectualizado, a narrativa resvala nos lugares-comuns. O que seria um questionamento metafísico da pena de morte se transforma num caso de escândalo individual: um professor de filosofia é acusado de estuprar uma de suas alunas. A trajetória da personagem é contada em flash back numa versão que ela mesma dá ao depor diante duma jornalista que se interessa por seu caso, um curioso desempenho da atriz Kate Winslet; o que, nas mãos dum Orson Welles, se verteria num semidocumentário, por Parker vai de equívoco em equívoco ficcional.

A pretendida trama sinuosa e nebulosa se converte em confusão de roteiro. Parker continua o mesmo: não aproveita a excentricidade de suas idéias para uma análise aguda da sociedade americana; prefere mergulhar no artificialismo formal de que a platéia gosta.