Crítica sobre o filme "Dias de Nitezsche em Turim":

Eron Duarte Fagundes
Dias de Nitezsche em Turim Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 07/07/2004

As inquietações formais do realizador brasileiro Júlio Bressane têm dividido os analistas do cinema nacional. Suas abstrações estéticas estão sempre além da linha de gol dos padrões habituais do cinema.

Em Dias de Nitezsche em Turim (2001) Bressane constrói um cinema cerebral-intelectual que busca visitar a mente do filósofo alemão Friedrich Nietzsche em sua passagem (já quarentão) pela cidade italiana de Turim. Trata-se da época mais demente da vida de Nietzsche, que legou à humanidade uma obra filosófica perturbadora e transgressora. As loucuras cinematográficas de Bressane buscam na literatura de Nietzsche um correspondente estético. O texto do pensador germânico derrama-se, em off, pelas imagens do filme, que vão do rigoroso 35 mm ao granulado vídeo passando pela instabilidade amadorística do Super-8; movimentos desfocados e a mistura de um certo rigor com algum amadorismo formal criam um mosaico barroco que Bressane orquestra com seu brilho inventivo.

A fusão da palavra com a imagem no filme de Bressane não chega ao deslumbramento hipnótico de Wittgenstein (1995), do inglês Derek Jarman, e que é um dos mais belos trabalhos de cinema dos anos 90. Mesmo assim, um Bressane, com toda a irregularidade, ativa um cérebro cinematográfico de um espectador adormecido no lugar-comum. É bom lembrar igualmente que Júlio Bressane foi um dos objetos de análise da obra-prima O vôo dos anjos (1990), ensaio de Jean-Claude Bernardet; Bressane é considerado pelo poeta e ensaísta Haroldo de Campos o maior cineasta brasileiro de hoje (entrevista concedida ao jornalista gaúcho Juremir Machado da Silva e introduzida em seu livro O pensamento do fim do século, 1993).