Sempre fui grande admirador dos Irmãos Taviani, a quem entrevistei algumas vezes (e nelas, os dois completam a frase um do outro, confirmando a lenda real de que cada dirige um plano sucessivo, nas filmagens). Mas estava achando que eles tinham sido forçados a se aposentarem diante da nada brilhante industria do cinema italiano atual. Até que surgiu este filme que levou o premio ecumênico e o Urso de Ouro (premio máximo) do Festival de Berlim do ano passado. Alem de 5 Davids de Donatello, o premio mais famoso da Itália, entre eles melhor filme e diretor. Também o premio do publico do European Film Award. Foi ainda o representante da Itália no Oscar de filme estrangeiro.
Se eles estiverem meio esquecidos por aqui, é bom procurar rever algumas de suas obras-primas, como Pai Patrão, A Noite de São Lourenço, Kaos e etc. Paolo é de 1931 e Vittorio de 29 mas nem por isso perderam o vigor e o prazer de experimentar, realizando este filme diferente (a mesma proposta já foi feita em diversas maneiras mas nunca de forma tão contundente e sintética) que aos poucos começamos a absorver e apreciar. A ideia é utilizar o talento
natural dos italianos que como já demonstraram desde os tempos do Neo realismo são atores natos, capazes de toda naturalidade e expressividade possíveis.
O filme começa com uma representação teatral de Julio Cesar de Shakespeare num lugar confinado no que parece ser um grupo teatral normal, só masculino. Só aos poucos que vamos percebendo que é uma encenação realizada numa prisão de segurança máxima Rebibbia,perto de Roma e aqueles “atores” são todos prisioneiros, portanto criminosos (os letreiros ao final os identificam como mafiosos, assassinos e assim por diante). Talvez este seja o texto mais político do autor e como qualquer trupe teatral, a montagem é repleta de incidentes, conflitos, problemas com os burocratas e assim por diante.
Mas os diretores não estão preocupados em acusar ou criticar ninguém. A própria força do contexto e a naturalidade das interpretações se encarrega de deixar tudo acessível (Os irmãos Taviani ouviram falar do trabalho teatral na prisão e entraram em contato com Fabio Cavalli com a ideia de fazer a peça de Shakespeare e gravar a experiência). Chamado de semidocumentário (porque cada frase, cada ação parece ter sido ensaiada ate a exaustão) de forma que as comparações com a atualidade e a vida deles, ou seja o subtexto fica todo muito evidente. Embora fora do comum não é daqueles que é preciso
depois pensar em casa. Um detalhe discutível: o ator que faz Brutus (Salvatore Striano) foi liberado da prisão em 2006 e estreou antes em Gomorrah. Fotografado por Simone Zampagni, que foi assistente dos Taviani, em filmes anteriores, usando um mínimo de trilha musical, o filme porém não é para todos os públicos (e sem duvida haverá os que rejeitarão todo o processo de trabalho). Normal, cada cabeça uma sentença. Para mim ao menos o filme tocou e impressionou, por vezes ate comoveu.