Apesar do júri deste ano do Festival de Cannes ter tido Steven Spielberg como presidente, o filme vencedor da Palma de Ouro do Festival foi esta produção franco-belga-espanhola, que se tornou famosa por causa de suas cenas de sexo lésbico, quase explicito (o caso esta ainda aberto para discussões, as cenas são longas, duram de 6 a 9 minutos e mostram as duas moças em ação, no que me pareceu mais uma encenação representada do que factual. Não há closes de órgãos sexuais, e embora seja convincente - afinal essa é a função de mostrar aqueles momento - não lembra nada o equivalente de filmes pornográficos). O fato é que este é outro daqueles filmes franceses duro de assistir, com quase três horas de projeção, com pouco alivio e a história praticamente toda narrada em closes e widescreen.
Não estou reclamando não. Só prevenindo que é preciso ter paciência e não entrar por engano. O diretor tunisiano Abdellatif Kechiche tem um estilo particular, que já foi possível antes se perceber no seu premiado O Segredo do Grão (não vi o Venus Negra por descuido, mas já estou providenciando). Narrativa longa, cheia de detalhes, dando atenção para personagens secundários que no final das contas não interferem tanto na trama. No caso deste filme ele se baseou numa famosa história em quadrinhos para adultos homônima, que aliás já saiu no Brasil em livro (a Livraria Martins Fontes a editou!). Mas ele aproveitou muito pouca coisa do livro (que já começa com a decisão da heroína de se suicidar, coisa que é esquecida na tela) e partiu para outra experiência. Chegou a começar com outra atriz quando parece ter se apaixonado pela quase desconhecida Adèle (com o sobrenome mais impossível de se dizer dos últimos anos), que pessoalmente (esteve no Brasil promovendo o filme) não é nada demais, mas na tela cresce e vira uma figura apaixonante e uma excelente atriz, que passa no rosto tudo que sente e pensa. O fato é que a câmera perseguiu as duas moças de maneira implacável rodando cerca de 600 horas de copião, inclusive fazendo cenas em que vomitavam e urinavam! Tanto que a relação entre o diretor e atores é bem estremecida e cheia de queixas. O diretor pessoalmente fala baixo, foge de respostas e parece mais um capataz.
Isso porém não tem muito a ver com o resultado que francamente me envolveu e me interessou. Adèle é uma estudante de segundo grau que depois de experimentar com um colega, se desaponta e vai tentar uma relação com uma jovem de cabelo azul, assumidamente lésbica (feita pela já estrela Leia Seydoux). Mentindo aqui, fingindo ali, as duas começam um intenso affair sensual onde ambas se declaram apaixonadas. Naturalmente brigam, mas Adéle não consegue esquecer assim tão fácil. Ver esse romance florescer e decair pode ser penoso (sabendo disso o filme não foi indicado ao Oscar® de filme estrangeiro no lugar entrou o bonito e fácil Renoir). Mas quem se interesse pelos caminhos novos do cinema tem que comparecer.