Crítica sobre o filme "Blaxploitation Vol. 2: Rififi no Harlem, O Terrível Mister T, Foxy Brown, Willie Dynamite":

Rubens Ewald Filho
Blaxploitation Vol. 2: Rififi no Harlem, O Terrível Mister T, Foxy Brown, Willie Dynamite Por Rubens Ewald Filho
| Data: 16/01/2018

 

Foxy Brown

Um dos mais famosos filmes dos chamados “blaxexploitation”, uma série de produções modestas endereçadas ao publico norte-americano negro, que estava começando a apoiar e consumir filmes desse gênero, policiais violentos, onde finalmente os atores negros ocupavam o lugar de protagonistas, sempre com humor e resoluções curiosas (mas também orçamentos modestos). Foram exibidos no Brasil, mas tiveram pouco sucesso porque sempre o nosso público foi relutante com a temática (a única exceção eram os filmes de Sidney Poitier, que foi consagrado aqui mais tarde os que faziam comedia como Whoopi Goldberg e Eddie Murphy). De qualquer forma, fazer com que os vilões fossem brancos já foi uma novidade (ou escândalo? )para uma época ainda problemática e com rancor de racismo. Muitos críticos acham que eles foram o que iria influenciar filmes de ação de brancos como Dirty Harry e Desejo de Matar! Tecnicamente precário, hoje é um interessante retrato de uma era e o despertar de um gênero!

 

Livros:

My Life in Three Acts (Minha Vida em Três Atos)

Foxy a Memoir (Foxy uma Memória) Pam Grier (com Andrea Cagan). Editora Springboard. 2010.

 

Não conhecia direito Pam Grier antes de Tarantino ter escrito para ela, o filme Jackie Brown (Idem, 97). É que ela havia ficado famoso como estrela de filmes de ação, os chamados “black exploitation films”nos anos 70, onde interpretou as primeiras heroínas negras do cinema, primeiro como parceira dos mocinhos (Hit man, Grite Blackula, Grite) depois como verdadeiras transgressoras em filmes como Coffy, Foxy Brown, A Arena, Sheba Baby a Pantera Negra do Harlem. Ou seja, no começo dos anos 70, muito antes de Angelina Jolie já havia um role model, uma mulher que fazia justiça com as próprias mãos e demonstrava que uma black woman podia ser forte, lutadora, justiceira (na época nem as brancas conseguiam isso).

Havia uma razão para sabermos pouco de Pam porque esses filmes para o negro americano passavam em branco por aqui (perdoe o horrível trocadilho). Mas foram todos fracassos de bilheteria, mesmo em cinemas populares de tal forma que com o tempo nem eram importados. Só depois com Eddie Murphy e Whoopi Goldberg que aos poucos esse preconceito, digamos assim, foi superado. Mas bem lentamente. Dai minha curiosidade em ler esta autobiografia e me surpreender com um fato importante: em geral, quando estrelas contam sua historia fico assustado como elas fizeram besteira, agiram burramente e se comportaram como tolas (às vezes mesmo indo contra sua imagem de inteligente como foi o caso de Jane Fonda). Esta é uma exceção: Pam que não chegou a sofrer privações quando criança, foi estuprada várias vezes quando muito jovem (porque assim as mulheres eram tratadas em seu meio), mas recusou-se a se entregar, a se dar por vencida e conseguiu forjar uma carreira bem sucedida de mais de 90 trabalhos em cinema e TV (um sucesso recente foi a serie The L Word, 2004-2009, sobre lésbicas condição que ela não assume no livro).

Essa coragem e determinação, a que eu chamo também de inteligência, a fez vencer também a luta contra o câncer e várias circunstancias da vida pessoal. Por exemplo, ela foi noiva do campeão de basquete Kareem Abdul Jamal (recusou-se a se casar quando ele se converteu ao islamismo e exigia que ela fizesse o mesmo, inclusive aceitando outras esposas. Não aceitou abrir mão de seus direitos de mulher para dar obediência total ao marido. O capitulo se chama Meu namorado e Deus!).

Outra coisa espantosa é a sinceridade de Pam, que se revela num capitulo que conta algo para mim inédito, seu romance com o astro Richard Pryor que era viciado em cocaína e droga pesadas. E que foi interrompido quando o ginecologista dela preveniu que havia liquido seminal no seu útero que colocava em perigo sua saúde! Consequência dos excessos da droga. Eventualmente Pryor (1940-2005) que nunca superou seus problemas (a mãe era prostituta e ele foi criado no bordel da avó onde o pai era cafetão) morreu de doença degenerativa.

O curioso é que Pam fala muito pouco dos filmes que tornaram icônica, eles mal são mencionados e descartados em algumas linhas (mesmo Tararantino não merece muito mais). Mas tragédias também estiveram próximas. Tem muito impacto quando ela conta de um irmã adotiva que teve câncer, foi largada pelo marido, depois se casou com fanático religioso que a impediu que procurasse ajuda médica (era daquele culto Ciência Cristã que não acredita em médicos) e eventualmente morreria disso. E de um outro sobrinho que se matou diante da mãe que lhe proibia ter vida pessoal.

Outro episódio curioso é quando ela tem que fugir de Sammy Davis Jr (ajudada por Liza Minnelli que a escondeu) que queria fazer sexo com ela a qualquer preço (e com a anuência da esposa).

Ou seja, ficamos sabendo pouco sobre sua carreira (elogios a Paul Newman com que fez Forte Apache, o Bronx, menção rápida a Tim Burton de Marte Ataca), mas ao menos descobrimos uma mulher forte e inteligente.