Crítica sobre o filme "Jacques Tati - A Obra Completa: Carrossel da Esperança, As Férias do Senhor Hulot, Meu Tio, Playtime - Tempo de Diversão, As Aventuras de Sr. Hulot no Tráfego Louco, Parada, Curtas-Metragem":

Rubens Ewald Filho
Jacques Tati - A Obra Completa: Carrossel da Esperança, As Férias do Senhor Hulot, Meu Tio, Playtime - Tempo de Diversão, As Aventuras de Sr. Hulot no Tráfego Louco, Parada, Curtas-Metragem Por Rubens Ewald Filho
| Data: 05/12/2018

Curtas

Reunião de curtas de Tati (1909-82) que geralmente aparecem como bônus em edições dos longas em outras edições. São interessantes mais para estudar e entender a evolução do estilo do humorista, que se desenvolveria no personagem do Mr. (Sr) Hulot. Dentre eles, Escola de Carteiros por exemplos é quase um ensaio para o longa de estreia dele Carrossel da Esperança (Jour de Fête, 1948). O primeiro. Sparring, é dirigido pelo futuro grande cineasta René Clément (O Passageiro da Chuva). O Curso Noturno já é colorido e em fim de carreira. E tem os demais, como extra. É coisa para cinéfilos, vale a pena!

 

As Férias do Sr. Hulot ****
O primeiro filme em que Tati lançou seu personagem Hulot que depois voltaria em Meu Tio, Playtime e Traffic. Este é o seu filme mais singelo, discreto e romântico. Hulot já cria o tipo (chapéu, cachimbo, capa de chuva), mas nunca é deflagrador das piadas. Ele vai passar as férias numa pequena pensão, numa praia da Bretanha, onde admira de longe uma jovem. Há grande cuidado com a trilha sonora (onde não há quase diálogo e o herói só diz uma palavra: “Hulot”). São “gags” visuais refinadas e antológicas. Mas é preciso ir devagar para saber curti-las melhor.

 

Meu Tio *****

Este é mais famoso e admirado filme do Tati. Clássico vencedor do Oscar de filme estrangeiro e do Prêmio Especial do Júri em Cannes. Provavelmente o melhor filme de Jacques Tati, que abriu falência por causa das despesas que teve ao realizar Playtime (1967). Ele tem um estilo muito especial que por vezes até evita o riso. Joga o tempo todo com a expectativa da plateia. Num filme anterior, As Férias do Sr Hulot (1953), ele estabeleceu as bases de seu personagem, Sr. Hulot com seu guarda-chuva, sua capa, chapeuzinho e infalível cachimbo. Faz uma crítica a desumanização urbana, às casas modernas que parecem mais casernas fazendo um paralelo entre o pesadelo “kitsch” da mansão de seu cunhado com o pequeno e modesto bairro popular em que ele mora. Há momentos impagáveis como as brincadeiras com o chafariz e principalmente a reação da empregada com a porta automática da garagem, mas o tom do filme é basicamente lírico. Até mesmo a fotografia e a música procuram acentuar os contrastes entre os dois ambientes. Não é, porém, para qualquer público, é preciso de acostumar aos poucos com o seu estilo e genialidade!

 

Play Time - Tempo de Diversão ****

Tati foi um dos mais importantes cômicos do mundo. Ele brinca com a expectativa do espectador, criando as “anti-gags” (o espectador pensa que o carro de água vai molhar um sujeito, mas na hora a expectativa falha). Ele levou onze anos para fazer este filme, empenhou toda sua fortuna nele, construiu uma cidade com todos os detalhes num estúdio de 15.000 metros quadrados e acabou falindo. Esta é uma redução da versão original que tinha 152 minutos. É uma espécie de Tempos Modernos em versão atualizada. Os turistas americanos chegam a Paris e veem a mesma paisagem que deixaram em sua terra. Os edifícios são sinteticamente iguais, as novidades eletrônicas assustadoras e os sinais característicos de Paris (Torre Eiffel, Arco do Triunfo) são apenas vistos por reflexos nas portas de vidro. O personagem de Tati, o famoso Mr. Hulot, não é o principal. Às vezes, ele aparece como “background” para alguma coisa mais importante. O humor é sutil, fino, discreto. E por isso nem sempre eficiente. Ninguém se identifica com Hulot, ou mesmo gosta dele. Sente-se apenas um pouco de pena em alguns momentos líricos. Os personagens quase nunca deflagram a “gag”, ela acontece suavemente. Fica a impressão de distanciamento, um pouco frustradora. Mas é um filme com piadas excelentes que no todo não chega a empolgar.

 

Trafic (As Aventuras de Sr. Hulot no Tráfego Louco) ***

Não confundir com a homônima série de TV ou o filme de Soderbergh. Este foi o último filme do humorista francês Jacques Tati (1907-82) (porque o seguinte, Parade, 1974, é apenas a gravação em videotape de uma apresentação meio circense realizada na Suécia). Após levar sua produtora a falência com o delirantemente elaborado e caro Tempo de Diversão (Playtime, 1967), para cuja realização uma cidade inteira foi construída, Tati teve que se contentar com esse projeto bem mais barato e modesto. E cuja frugalidade, infelizmente, abateu a criatividade exuberante do diretor, com sua genial capacidade de fazer humor sutil ao extremo. Ele aparece apenas ocasionalmente em um filme lento e irregular, que deixa o espectador com a expectativa de uma gag sensacional que não se efetiva. Mesmo o tal carro-para-campistas que ele projeta promete ser mais engraçado e inesperado do que acaba se revelando. Tati é tão talentoso que os poucos momentos de brilho compensam, mas não espere obras-primas como As Férias do Sr. Hulot ou Meu Tio. No Brasil foi exibido originalmente como As Aventuras de Mr. Hulot no Tráfico Louco.

 

Parada **

Este filme feito para a TV sueca, mas exibido nos cinemas, foi o melancólico final de carreira do grande cômico francês Jacques Tati, então falido e sem oportunidades de trabalho devido aos custos astronômicos (bancados por ele) e o baixo retorno de bilheteria de Tempo de Diversão (Playtime, 1967) e As Aventuras de M. Hulot no Tráfego Louco (Trafic, 1971). Ele foi então convidado por um circo sueco para uma parceira onde conceberia o roteiro, atuaria como mestre de cerimônias e faria mímicas entre os números meio hippies do grupo. Que na verdade não tem nada de especial nem antológico, com mágicas, palhaçadas, brincadeiras com a plateia e até uma banda de rock psicodélico. Tati, claro, dá um show em suas intervenções, como guarda de trânsito, boxeador, pescador e, em especial, como o inacreditável tenista em câmera lenta. Mas é pouco para quem estava acostumado com seus filmes. Feito em vídeo, cópia de qualidade inferior.