Crítica sobre o filme "Pequeno Segredo":

Rubens Ewald Filho
Pequeno Segredo Por Rubens Ewald Filho
| Data: 08/11/2016

Já houve muitos filmes sobre Aids, nos últimos vinte anos, europeus e americanos, inclusive o recente e premiado The Normal Heart, 14, que desmistificava o assunto. São em geral penosos para o espectador, porque quase todo mundo perdeu algum parente ou amigo nessas condições. Situação essa que deixou de ser tão urgente, já que houve evolução se não na cura, pelo menos em paliativos. Atualmente (e infelizmente) a doença não é levada tão a sério e, por tabela, o mesmo sucede com este filme nacional que tem a tarefa ingrata de abordar o tema que além disso já foi mencionado (ainda que sem profundidade), no bom documentário O Mundo em Duas Voltas (07), que abordava o assunto ao retratar as viagens de iate/barco que a família Schurmann dava a volta ao mundo em um veleiro, muito popular porque rendeu programa semanal no Fantástico da Rede Globo. E aí já chegamos à conclusão, o anterior, também assinado pelo David, de Santa Catarina e membro da família, era melhor, mais movimentado, com melhor roteiro e estrutura (aqui com frequência a história fica confusa, muita coisa perde a emoção também porque há muitos diálogos em inglês - é coprodução com a Nova Zelândia) e ainda por cima carrega o peso de ter sido oficialmente indicado pelo Brasil para o Oscar de filme estrangeiro. Uma resolução ainda mais polemica quando o favorito parecia ser o Aquarius, que foi e continua a ser o preferido da crítica (não cabe aqui entrar no affair, já que Aquarius está pagando o preço de ter feito manifestação contra o governo de Temer, no Festival de Cannes!). Embora Aquarius tivesse mais chance de ser lembrado no Oscar e Globo de Ouro -os votantes adoram Sonia Braga! - e seja realmente um melhor filme.

Embora tenha uma delicada trilha musical (quase toda em piano), de Antônio Pinto, dando a impressão de que tentou tudo para dar um pouco de vida ao filme que não é um documentário. O roteiro comete bobagens (por exemplo, Marcello Anthony que tem personagem importante faz uma figuração praticamente muda!). Também procura ser discreto no drama trágico, quando na verdade, esta seria a verdadeira razão de ser do projeto, conquistar o espectador pelas lágrimas.

A diferença de quase todos os outros filmes que abordam a temática é que aqui a moça (paranaense) feita por Maria Flor (sempre encantadora) sofre atropelamento é fica contaminada pelo vírus da Aids por causa de transfusão de sangue. Ela tenta impedir que a filha sofra do mesmo mal assim como o marido neozelandês. Todos condenados a morte. Só que a menina Kat embora carregue o vírus, é sempre radiosa e feliz (o diretor até arranja uma dança de fadinha para ela, que mergulha já na fantasia, até porque a menina não convence como bailarina).

Enfim, o dilema se resume no fato de que gostaríamos de apoiar um filme com essa temática mas esbarra-se na trama mal alinhavada, história mal contada. Embora Julia Lemmertz se esforce muito, nem ela como mãe adotiva da criança consegue amarrar o resultado – eles se conhecem numa das viagens e se tornam muito amigos, passando a cuidar da menina. Na verdade, o foco central da história e a figura mais marcante é uma excelente atriz irlandesa, Fionulla Flanagan, que no papel da avó legitima (mãe do pai) praticamente rouba o filme. Fionulla é maravilhosa e já fez mais de 123 trabalhos em TV e cinema (Os Outros, Sim Senhor, Quatro Irmãos, Transamérica, Lágrimas do Sol, A Fortuna de Ned, Divinos Segredos).

Não acredito porém que o filme venha a seduzir a Academia.