Crítica sobre o filme "Aquarius":

Rubens Ewald Filho
Aquarius Por Rubens Ewald Filho
| Data: 04/09/2016

Estive em Gramado onde transcorreu com sucesso o Quadragésimo Quarto Festival de Cinema (ano que vêm chegaremos aos simbólicos 45, um récorde para festivais brasileiros!). Sou um dos curadores, isto é, junto com mais dois críticos fazemos a seleção dos filmes que vão concorrer ou mesmo serem apresentados fora de concurso. Gramado é uma cidade encantadora e votada como a mais desejada pelos turistas nacionais. Mas é sempre difícil fazer escolhas (felizmente faço parceria muito bem sucedida com o critico gaucho Marcos Santuário) e por isso ficamos muito felizes com o sucesso retumbante do filme de abertura de Aquarius do pernambucano Kleber Mendonça (ele é um critico e professor de cinema,velho companheiro nosso no Festival de Cannes e a qualidade do seu trabalho é um belo exemplo de como também no Brasil críticos e intelectuais podem fazer bom cinema!).

Co-produzido por Walter Salles e Carlos Diegues, o filme foi bem recebido no recente Festival (onde provocou certa polêmica ao fazer protesto contra o atual presidente da República), mas no momento e aqui em Gramado, eles não recorreram a protestos, talvez pela unanimidade com o filme. O primeiro grande acerto do diretor foi chamar Sonia Braga, que há muitos anos vive em Nova York participando de filmes e series de americanas, visitando o Brasil muito ocasionalmente. A verdade é que ela não recebeu convites que sabiam usar sua idade madura (parece que 66 anos) num projeto com conteúdo inteligente e atual. Pois a minha querida e antiga amiga Sonia nunca teve melhor interpretação de sua carreira. Embora sempre tenha sido um animal cinematográfico (ou televisivo), extremamente sensual, fazendo tudo com verdade e empatia, nunca lhe deram um papel /personagem que fosse um verdadeiro desafio. Fazendo o papel de uma escritora que vive num apartamento de frente para o mar em Recife (onde só ocasionalmente recebe a visita dos três filhos), vivendo com sua empregada de confiança. Mas o jovem herdeiro de uma construtora tem planos ambiciosos para o lugar que vai manter o nome justamente de Aquarius e, de repente, sozinha tem que enfrentar as sabotagens que irão culminar num final muito forte e até chocante.

Durante todo o filme também acompanhamos a trajetória da protagonista que é viúva, sofreu uma operação que lhe exterminou um seio com câncer, frequenta a praia em frente onde já tem amizade com os salva-vidas, convive com as amigas da mesma idade, ouve seus velhos discos LPs. O único defeito que achei foi o começo que e um pouco desajeitado e os atores jovens nem sempre lembram os que irão interpretá-los mais velhos e não acho que o filme possa ter censura mais livre porque tem alguns momentos de sexo explícito. De certa forma, também é um retorno ao mesmo ambiente e região do bom filme anterior de Kleber, o primeiro longa, O Som a Seu Redor.

Na verdade sinto que estou passando por cima de uma analise mais profunda de um filme muito rico em conflitos sociais, que vai desenhando aos poucos um incrível retrato de mulher no que vem a ser, ao menos até agora, um trabalho excepcional e o melhor filme brasileiro do ano. Também obviamente deveria ser o indicado nosso ao Oscar estrangeiro. Não percam.