Ainda bem que alguns amigos me recomendaram o filme que eu estava desprezando (porque perdi a estreia por causa da viagem) e assim corri o risco de ser injusto com este filme independente que ganhou o prêmio de melhor diretor no Festival de Sundance, prêmio do público em Austin, melhor filme em New Hampshire, estreante em Londres e foi muito bem em Toronto. E que ainda se dá ao luxo de ser co-produzido por Chris Columbus e sua mulher (ele foi quem dirigiu Esqueceram de Mim e fez os dois primeiros filmes de Harry Potter) e o brasileiro Rodrigo Teixeira (Frances Ha, O Cheiro do Ralo, Tim Maia, Alemão e outros). Num total de 22 co produtores, num orçamento relativamente pequeno de 3 milhões e meio de dólares, para uma renda ate agora de 22 milhões (boa por causa de sua baixo custo).
Ainda assim é preciso ressaltar que não se trata de um mero terror, embora esteja fazendo boa carreira porque as pessoas se assustam. Fiquei tão impressionado com o filme pelo cuidado técnico e a simplicidade que me fez lembrar os filmes suecos de Bergman (A Fonte da Donzela, O Sétimo Selo) com sua paisagem rústica e segundo diz o próprio diretor, O Iluminado, de Kubrick (câmera parada, proporção de 1.66:1 para captar a altura das árvores da floresta). E mesmo o colorido nada brilhante ou fantasioso, mas sombrio e ameaçador. O diretor fez antes apenas dois curtas que tinham temas parecidos , The Tell Tale Heart (08), inspirado em Allan Poe, Hansel e Gretel (em vídeo,07) e ainda um remake de Nosferatu o Vampiro. Além disso ele é desenhista de produção (ou seja, diretor de arte e figurinista) e apesar de jovem tem 15 créditos em séries de TV, curtas e longas.
Ele conforme confirma nos letreiros finais fez uma pesquisa profunda sobre casos de presença diabólica entre os pioneiros que emigraram para a América, todos fanáticos religiosos e se fixou nesta história real sucedida na Nova Inglaterra em 1630 (ou seja, bem antes do caso famoso de Salém). Confiram os créditos acima na ficha técnica, que vocês perceberão que ele foi buscar na Inglaterra dois atores excepcionais ainda que não famosos mas que estão na série Game of Thrones, a mãe (que tem uma máscara incrível) e o pai (outra figura notável). Ainda que sejam as crianças que mais impressionam, em particular o menino (que tem um solo quando está tomado pelo dito diabo impressionante) e a protagonista Anya (que por sinal é filha de argentino!). Que certamente irá fazer carreira. O único que causou problemas foi a figura central do Bode diabólico (o diretor teve que cortar cenas com ele, deve ter sido por isso que o bicho apesar de expressivo apareça tão pouco em cinema!).
Outra coisa que eu não me lembro de ter visto em cinema foi o recurso final do diretor, que dá dois “fade outs” (mudança de cena com escurecimento em negro) já na conclusão, uma relativamente curta, outra mais longa que tem a finalidade de preparar para a conclusão (ainda assim na sessão que vi, o público deu uma resmungada que pode ter sido também causada pelo clima de tensão geral). Enfim, são duas sacadas que demonstram a criatividade do projeto.
Não gosto de resumir muito a história que a meu ver tira o impacto do filme. Mas aqui é sobre uma família que é logo no começo expulsa da comunidade e tem que ir sobreviver na floresta. A moça mais velha está cuidando do bebê da família, quando este desaparece aparentemente levado por uma bruxa que vive na floresta. Ela vai atrás e a bruxa que era uma velha assustadora agora aparece na figura de uma mulher cativante que a corrompe. O problema é que toda a família fica de alguma maneira contaminada. Tudo ampliado pelo fanatismo e a iluminação obscura (afinal é no meio de lugar nenhum) e todo o clima aterrador. Não há sustos fáceis ou truques. É todo o filme que nos faz mergulhar nos meandros da sombria e devastadora alma humana. Não percam. Vai estar entre os melhores do ano.