Este mais recente filme de Hector Babenco me fez pensar como os trabalhos do bons diretores são tremendamente pessoais, um reflexo do que ele é, do mais positivo ao mais extremo. E quando se gosta de determinado artista faz sentido de gostar de tudo dele, inclusive seus possíveis defeitos. Como aqui, onde há momentos de grande beleza, de intensa dor entremeada de outros grosseiros e perturbadores. Porque foi assim que ele sentiu e quis mostrar. Como diz na apresentação da melhor maneira que sabia fazer. Alguns vão ficar chocados (algumas cenas eróticas poderiam ser exageradas mas são parte fundamental do conceito do filme), outros podem se emocionar. Em momento nenhum Meu Amigo Hindu é fácil ou complacente. É a cara de um grande diretor judeu/argentino/brasileiro que deu um longo mergulho nos infernos lutando pela vida com uma raiva e potencia que permeia todo o filme.
Não me incomoda nem um pouco que o filme seja todo falado em inglês, ainda que a maior parte do elenco seja brasileiro (quase todos se saem bem e nunca tropeçam no texto). Ainda assim fazer filme falado em inglês é uma convenção do cinema americano e mesmo o europeu simplesmente uma questão de atingir maior público. Ou querer ser compreendido por um maior público (infelizmente é uma história muito pesada e o filme tem tido dificuldade de conseguir exibição no exterior e mesmo ser aceito pelos brasileiros). Mas eu admiro os filmes de Babenco e sua avassaladora sinceridade autobiográfica, inclusive sua licença poética de dar titulo ao filme a partir de uma pequena porção de história (quando esta sofrendo tratamento do câncer, ele conhece e brinca com um menino indiano, que lhe dá um momentos de alegria).
Como nem todos sabem, Babenco ficou doente de um câncer justamente no momento do auge de sua carreira, quando estava estourando O Beijo da Mulher Aranha (que em 86 lhe deu indicação ao Oscar de direção). Quem o interpreta com o nome de Diego Farman é o ator americano Willem Dafoe (que foi Cristo para Scorsese em A Última tentação de Cristo, 88) que além de raspar a cabeça, se expõe totalmente com enorme coragem e notável habilidade. Parte do seu suplício ele compartilha com a nova esposa (Maria Fernanda) e numa festa de casamento reúne os amigos, o filme tem muita gente conhecida fazendo papeis pequenos, como Gianechini que faz uma versão do Dráuzio Varela e para quem tem uma bela frase. Algo como Nada mais triste do que a morte de Fellini. Porque nunca mais teremos filmes de Fellini (Babenco é dos raros cineastas atuais que são cinéfilos vorazes). Enfim, vai para os Estados Unidos (grande parte da ação se passa na autêntica casa do diretor) e inicia uma brutal luta para vencer o câncer (uma das partes mais tocantes é sua relação com um irmão que pede dinheiro para colaborar na operação , forçando sua mulher a vender apartamento).
Pontuado pela magnífica trilha, aliás como sempre de Zigbniew Preissner, o filme como já disse é irregular. Mas os pontos altos são emocionantes, como a homenagem ao Gordo e o Magro e depois Cantando na Chuva (Bárbara Paz que sempre foi uma boa atriz demonstra o carinho por Babenco, numa empolgante reprodução da canção tema daquele filme). E tudo o mais também me fez abraçar o filme com afeto e respeito.