Crítica sobre o filme "Mordomo da Casa Branca, O":

Rubens Ewald Filho
Mordomo da Casa Branca, O Por Rubens Ewald Filho
| Data: 01/11/2013

A revista Veja definiu este filme como sendo uma propaganda do governo Obama e não há a menor dúvida que é uma maneira cínica e verdadeira de definir este novo trabalho do polêmico Lee Daniels (o nome dele está no título porque a Warner criou polêmica afirmando que era um nome registrado em 1919 por ela e foi dessa forma que os Weinstein resolveram o caso). Famoso por “Preciosa” (duas indicações ao Oscar, por direção e filme), fez o recentemente exibido, “Obsessão” (outro que tinha suas ousadias) e retorna aqui num filme que tem trilha musical do português Rodrigo Leão, famoso por sua participação no Grupo Madredeus e nos filmes de Wim Wenders. E curiosamente é assinado por 41 produtores (deve ser algum recorde) e 21 maquiadores (que tiveram o difícil trabalho de transformar astros famosos em políticos celebres). E foi um êxito de bilheteria nos EUA (custou 30 milhões de dólares e rendeu por lá 115 e por enquanto no exterior apenas 14, embora seja evidente que terá menos interesse para o resto do mundo).

O roteiro foi escrito não pelo diretor, mas por Danny Strong (que não é negro, é ator, já ganhou Emmys pelo telefilme Game Change, escreveu bons filmes como A vida em Preto e Branco, Seabiscuit e agora a série os Jogos Vorazes). Ele se inspirou num artigo de revista de Will Haygood chamado “A Butler well Served by this Election”, publicado no Washington Post em 7 de novembro de 2008, que foi inspirado numa figura real. O personagem de Cecil Gaines, foi baseado em Eugene Allen, que serviu como mordomo na Casa Branca por 3 anos, de Eisenhower a Ronald Reagan, ou seja, de 1957 a 86 e morreu em 2010. O script originalmente tinha cena com o presidente Obama e foi rodada com um ator para ser finalmente descartada na edição final (ai sim tudo mundo iria perceber seu “parti pris”). Matthew MacConaughey iria fazer John Kennedy, mas não pode e o papel foi parar com James Marsden. Na verdade, todos os presidentes aparecem muito pouco e o que deixa pior impressão é John Cusack como Nixon (que está bêbado). Jane Fonda tem aparição breve como a Sra Reagan, Liev Schreiber faz Lyndon Johnson, Robin Williams é Eisenhower (Melissa Leo fazia a mulher dele Mamie, mas foi cortada). Alguns outros aparecem em cenas de arquivo. 

Também alguns famosos surgem rapidamente Mariah Carey como a mãe que ficou louca, Vanessa Redgrave como a velha bondosa, e principalmente Oprah pela primeira vez desde Bem Amada (de 98, onde não faz ela mesma). Fala-se de prêmio para ela, mas sua interpretação não é muito marcante e o único que parece ter previsão de ser indicado ao Oscar é mesmo o já vencedor por O Último Rei da Escócia Forest Whitaker. Isso num ano onde há várias outras interpretações notáveis de atores negros.

Apesar de muito badalado não espere muito do filme, porque seu roteiro é extremamente convencional, sem nunca aprofundar coisa alguma deixando o protagonista como testemunha muda da história americana. Que não é assim tão honrosa. A observar sua obscura política racial só me deixou perturbado em perceber quanto tempo demoraram para cair em si e ir terminando com o racismo, ao menos com as absurdas leis segregacionistas. Uma mancha na história do país que eles não se apressaram a corrigir. E no final se tratam o protagonista com respeito, não fazem mais nada do que a obrigação. E já tarde. Não é tampouco uma direção inspirada.

 

A parte mais tocante da história seria quando o herói é criança ainda numa fazenda de algodão em Macon, Geórgia, onde o jovem patrão usa a mãe dele como escrava sexual (o que deixa louca) e não deixa para o rapaz outra solução se não fugir. Os ingênuos produtores acham que seria uma boa lição de vida para o espectador que pensaria que só mesmo na América poderia alguém tão pobre e desafortunado chegar a um emprego tão bom. Que seria algo inspirador. Só que tudo é contado meio rapidamente porque temos que acompanhar Forest por suas futuras aventuras. Vem para o norte, se tornando protegido de mordomo na Carolina do Norte, depois vai ser garçom no chique Hotel Excelsior de Washington e se casa com uma empregada do lugar. Eventualmente é recomendado por um amigo para a Casa Branca, onde sem muita dificuldade passa nos testes e fica nos bastidores do poder, com um lugar privilegiado para observar a história em marcha. Gosto mais do filme quando ele fica politicamente mais complicado, com as manifestações dos anos 60, um filho dele se engajando na luta dos Panteras Negras e assim são ao menos discutidos por alto fatos como a Guerra do Vietnã, as tropas que foram mandadas para Little Rock para forçar a integração das escolas, as marchas pelos direitos civis, o apartheid na África do Sul. Nesse sentido será uma boa aula de história.

Erra em caracterizar muito mal (digo por maquiagens erradas, cenas ruins) os presidentes e só mesmo Forest consegue manter a dignidade e dar um foco ao filme. Sem dúvida é manipulador (a melhor cena seria a de Oprah como a mãe que bate na cara do filho lembrando-lhe alguns fatos, ao menos tem força). E não é grande coisa como cinema.