Foi muito bem recebido como filme de abertura do recém Festival de Gramado (assim como teve ótimas críticas em Berlim, no Tribecca) este antigo projeto de Lucy Barreto, que há mais de 15 anos tentava produzir uma adaptação do livro de Carmen de Oliveira, Flores Raras e Belíssimas que por sua vez é inspirado em fatos reais, o romance e vida em comum. Entre uma das mais consagradas poetisas americanas do século passado, Elizabeth Bishop (1911-79), várias vezes premiada inclusive com o Pulitzer e a brasileira Lota (Maria Carlota) de Macedo Soares, 1910-67, arquiteta e paisagista que foi responsável pelo parque do Flamengo no Governo Carlos Lacerda, no estado da Guanabara (Rio).
O filme com roteiro de Matthew Chapman (marido de Denise Dumont e que fez a Grande Arte, O Júri, A Tentação) relata o complicado romance entre as duas, quando Elizabeth vem nos anos 1950 visitar o Rio de Janeiro onde mora uma antiga colega da faculdade (a fraca Tracy) que tem um caso com Lota (interpretada com o talento habitual por Gloria Pires, sem nunca exagerar no tipo como costumam fazer os atores em novelas de televisão). Elizabeth é uma mulher complexa, que não aceitava bem sua homossexualidade, com tendência para o alcoolismo e extremamente insegura em relação ao seu trabalho como poetisa, mas em Lota, consegue encontrar a segurança e força que precisa para escrever e se tornar um sucesso (ainda que complicada porque a ex, quando se separa de Lota, continua próxima e chega a adotar uma criança, uma menina formando um perigoso triangulo amoroso). Quem faz a poetisa é a atriz australiana Miranda Otto (de O Senhor dos Anéis, onde fez Eowyn) que fisicamente lembra bastante Meryl Streep, mas é também uma atriz delicada e sensível, que funciona muito no personagem.
Apreciei especialmente no filme o fato dele ser o primeiro que vejo onde a figura de Carlos Lacerda não aparece de forma negativa como tudo que se tem lido e visto a respeito dele nos últimos anos, quase beirando a caricatura. Aqui se mostra ele amigo de Lota e depois contratando-a para criar o Parque do Flamengo, ainda hoje um espaço notável do Rio.
Feito com dificuldade e pouco dinheiro (teve cenas feitas em Nova York, reconstrução de época, bons figurinos), porque por causa da temática não foi possível captar todo orçamento e foram obrigados a fazerem empréstimos em bancos. O resultado é um trabalho muito digno de Bruno Barreto, que optou por manter um visual de época (assim como a trilha musical constante) que resultam num trabalho tocante e mesmo comovente.