Crítica sobre o filme "Bela Que Dorme, A":

Rubens Ewald Filho
Bela Que Dorme, A Por Rubens Ewald Filho
| Data: 21/06/2013

Faz mais de 50 anos que o diretor Marco Bellochio impressiona a gente (ao menos desde a estreia em 65 com o poderoso De Punhos Cerrados, ele nasceu em 1939). Passou por momentos menos felizes, mas nos últimos tempos retomou a melhor forma com o sucesso aqui de Vincere (09) e agora com este filme que ganhou a Mostra Internacional de São Paulo (crítica) e dois prêmios em Veneza. Desta vez se inspirou em fato real: os últimos dias de vida de Eluana Anglaro, uma jovem que durante 17 anos sobreviveu no estado vegetativo até quando sua família tomou a polícia decisão de desligar os aparelhos. O caso acabou provocando na Itália um confronto aberto entre os que apoiavam e condenavam a eutanásia.

Não é exatamente um docudrama, mas tem o ar febril de um caso que movimento povo e provocou até confrontos de rua. Grande parte dos figurantes eram pessoas que realmente tinha estado diante do hospital em Udine (também real). Ainda assim preferiu-se inventar personagens fictícios, tanto da vítima quanto de sua família. Desde o começo a produção causou polêmicas de tal maneira que não queriam que ele recebesse ajuda da Film Commission de onde foi rodado (a região de Friuli Venezia Giulia) chegando mesmo ao cumulo de no final das contas fecharem a comissão!(francamente fanatismo religioso- de qualquer religião- é o que há de mais burro e frequente no mundo!). De qualquer forma Bellochio conseguiu administrar a trama complexa com pelo menos três níveis de narrativa tornando-a compreensível e mesmo envolvente. Foge de soluções fáceis deixando também claro duvidosa ação do então primeiro ministro Berlusconi que envolve a política e o parlamento sem a menor necessidade. Quem faz o papel da mãe da menina doente desde acidente de carro é a grande Isabelle Huppert, no papel de uma famosa estrela de cinema. Obsessivamente católica, a ponto de representar o papel da Igreja no conflito do filme. Enquanto isso outro casal de ideias opostas mesmo assim se apaixona. (o rapaz chamado Roberto, Michele Riondino, tem um irmão mentalmente doente). Numa terceira história, o Dr. Pallido (Pier Giorgio Bellochio sente-se atraído por uma viciada em drogas com tendência suicida (Maya) sedada enquanto o pessoal da clínica aposta quanto tempo ela ir sobreviver! (você é livre de se matar, ele diz para a garota, e eu sou livre de te impedir!), mas como o tema é política, o filme traz uma coisa rara, um político honesto, Beffardi (Toni Servillo) recém eleito, mas que tem votar na lei criado por Berlusconi para impedir que a moça não mais respirasse artificialmente. Mesmo que seja contra sua consciência.

E o humor não está ausente quando mostra o médico que prescreve pílulas animar e sossegar os políticos (inclusive um banho turco iluminado a velas que parece a Roma antiga!). O fato de não ter tido conhecimento dos fatos quando eles sucederam pode incomodar alguns e faz perder alguns detalhes, mas não me incomodou, achou assim o filme ainda mais forte e poderoso.