Crítica sobre o filme "Faroeste Caboclo":

Rubens Ewald Filho
Faroeste Caboclo Por Rubens Ewald Filho
| Data: 29/05/2013

Muita gente me disse que estava planejando assistir este filme porque é inspirado na canção da Legião Urbana/Renato Russo, já que gostaram tanto de Somos Todos Jovens. Não façam isso. São dois filmes completamente diferentes e opostos. E na verdade, qualquer semelhança entre aquela história biográfica, não especialmente bem contada (já que deixa a parte mais dramática de fora) e este aqui é circunstancial e injustificada. Até por que a semelhança do filme com a famosa e longa canção é muito vaga e distante. Você pode ouvi-la nos letreiros finais e vai ficar estarrecido como pouco tem a ver com o filme. Que basicamente é uma história de drogas, os personagens passam o tempo todo fumando maconha, isso na primeira parte, e depois cheirando cocaína com arroubos de Scarface. O que vai tornar o filme proibido para menores, mas faz muito tempo, desde o auge de Oliver Stone, que não via um uso tão intenso e exagerado de droga num filme. 

Depois de Tarantino e Django fica ainda mais difícil suportar o que seria uma sátira ao faroeste a la italiana sem virar parodia ou transcender seu tema. O roteiro é um amontoado de desencontros, superficial e absurdo, mais uma vez dando vida a um dos mitos do cinema brasileiro que é essa história de que moça rica gosta de rapaz pobre e bandido, que ao menos Nelson Rodrigues dava algum sabor (lembro agora de Terror e Êxtase, de Antonio Calmon, 79, que era Denise Dumont de mocinha rica e Roberto Bonfim, de bandido), mas é preciso que ao menos os personagens tenham algum traço de humanidade, de verdade, alguma razão para seu comportamento além do uso desenfreado da droga. O filme já começa quebrando uma regra quando transforma logo no começo do filme seu Herói João de Santo Cristo em vilão, já que mata sem explicações e frieza um policial (matou virou bandido para o público). Algum tempo depois vem a explicação, já que ele teria eliminado o sujeito justamente que havia liquidado seu pai, e ainda sem justificativa.

O problema é que embora ele seja o narrador e fica dizendo coisas poéticas e literárias em momento algum chega-se a ter um retrato mais completo ou convincente deste João de Santo Cristo que depois de cumprir pena na cadeia vai procurar um primo torto latino (feito pelo uruguaio de O Banheiro do Papa que está também em novela da Globo e que demonstra aqui que não é infalível, até ele mergulha no caos total). Tudo é muito prejudicado porque os personagens são muito mal delineados, tanto João (prejudicado também porque o ator não tem a chance de mudar a expressão de permanente aborrecimento) quanto a moça rica de Brasília (nos anos ainda da ditadura), um personagem sem a menor estrutura ou lógica, ainda mais porque sua relação com o pai senador é mal concebida e desenvolvida (a moça Isis Valverde tem uma figura doce que faz pouco mais do que chorar e fumar maconha). Apesar de ele ser obviamente bandido (dar uma flor de madeira não o torna romântico) ela mergulhar na relação nunca convence (a falta de personagens de apoio também atrapalha já que a preferem desenvolver uma trama policial em cima dos traficantes rivais acoplados com policiais corruptos e sem escrúpulos). Ainda assim há menos sexo do que violência e drogas, inclusive com uma sequência de estupro, masculino, felizmente atenuada na montagem final, mas dispensável (até porque alguém sendo vítima de tal violência esdrúxula justificaria uma vingança ainda maior do que a mostrada. Sem esquecer que este é daqueles filmes de que diziam quando era criança de que acabava por falta de personagens).

O pior é que não se pode dizer que o filme é mal feito, a técnica está lá, só foram tomadas as decisões erradas resultando num filme nefasto e muito desagradável.