Vencedor do Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes, este é o novo filme do diretor Garrone que fez sucesso com Gomorra (08), e que já tinha atrás de si uma longa carreira de 9 outros longas metragens inéditos no Brasil (que tal uma retrospectiva?) Na verdade, se havia alguma dúvida quanto ao talento do diretor estão resolvidas com está comédia escachada e inteligente, que consegue ser moderna (embora seja difícil satirizar a televisão já que por si só ela já é uma paródia ainda mais a italiana) e ao mesmo tempo faz lembrar a velha tradição do neo-realismo e das antigas comédias napolitanas (se passa em praça pública onde o herói tem uma peixaria, ele e toda a família mora num velho casarão e naturalmente todos são gordos, gritam muito, são cafonas, mas nem por isso deixam de ser humanos e com sentimentos).
Um dos problemas do cinema italiano para nós é que não conhecemos mais os atores e assim fica difícil nos identificarmos com eles e entender sua persona, seu estilo. É o caso do estreante Aniello Arena que tem um incrível e perfeito trabalho como protagonista. A surpresa foi pesquisar sobre ele e descobrir que ele estava cumprindo pena de prisão perpetua (!) na Prisão de Volterra por causa de seu envolvimento quando adolescente num esquadrão do crime organizado e duplo assassinato. Garrone o conheceu porque o pai é um crítico de teatro e foi assistir uma peça na cadeia (parece que montam uma por ano) e ficou tão impressionado que começou a gravar o monologo que Aniello fazia e tentou consegui-lo para Gomorra, mas não lhe deram liberação, que veio finalmente para Reality. Garrone rodou as cenas na ordem cronológica do roteiro o que facilitou embora ainda achasse cinema frio em oposição a Teatro. A história é inspirada em fato real, mas ele não é fã do Big Brother como o personagem de Luciano.
Embora o filme tenha estreado em março nos EUA e não tenha feito sucesso, o brasileiro tem tudo para se identificar com a história, além de ter a surpresa em saber que o programa Big Brother, mais ou menos nos mesmo moldes que o brasileiro, é um enorme êxito faz anos na Itália onde pela própria estrutura local provoca ainda maior impacto do que entre nós.
O herói Luciano é um pai de família, trabalhador, mas que tem o hobby de ser artista, se vestindo de drag queen para uma festa de casamento que será prestigiada por um dos participantes do antigo Big Brother. Assim começa a ilusão de que ele poderá ser também um astro da televisão. Pressionado pela família, se inscreve no programa e parece ter sido bem na entrevista-teste (não vemos essa cena, temos que acreditar nele), mas com a pressão de todo o bairro e fama repentina só por estar concorrendo, ele aos poucos vai perdendo a noção das coisas, passa a achar que o estão vigiando, baixa os preços, começa a dar aos pobres, os moveis de sua casa. Sem esquecer também que para melhor sobreviver fazia também um esquema ilegal com aparelhos domésticos.
Pode parecer exagerado, mas claro que é comédia e quem conhece o meio e o ser humano, pode crer que não é muito diferente. As pessoas piram quando querem ficar famosas a qualquer preço. Sem qualquer moralismo, o filme pinta esse retrato sem lhe tirar até mesmo uma certa ingenuidade. O trabalho do ator prisioneiro é incrível, um perfeito artista e eu gostei de reencontrar os atores aparentemente amadores, os tipos que tornaram o cinema italiano tão memorável. É um filme para ser descoberto e curtido.