Este foi um dos poucos filmes de ficção, rodado pelo processo Cinerama, que utilizava três câmeras simultâneas. O outro foi no mesmo ano, O Mundo Maravilhoso dos Irmãos Grimm, de Henry Levin e George Pal (também 62, que por alguma razão não está em circulação). O problema do sistema que foi muito usado para documentários é que na junção entre os projetores criava-se uma mancha escura, que prejudicava o resultado (e os dois filmes foram feitos em uma única versão, não pensaram em usar também uma câmera comum). A novidade é que com a evolução digital eles lhe deram um banho e conseguiram apagar a maior parte dessas manchas. Qualquer fã de faroeste ou mesmo de simples cinema tem que ver este filme justamente por causa de sua tecnologia ímpar e inaudita (eu assisti ao filme originalmente em Cinerama em Miami, quando fazia em 63 um curso na Universidade de Coral Gables). Mas depois nunca mais o revi integralmente e foi uma grata surpresa. Em parte porque a única estrela que percorre o filme inteiro do primeiro ao último episódio é minha favorita Debbie Reynolds, numa de suas interpretações cheias de energia e vibração, passando de mocinha a velha (no final, ela arruinada vem morar com o sobrinho George Peppard). Além disso tem a chance de cantar alguns números, como Raise a Ruckus Tonight e o clássico Greensleeves (na versão americana chamada de Home in the Meadow).
Mas o que é notável é a tecnologia do filme que usa sempre uma câmera que será projetada numa tela curva, ou seja, já ajustada para uma lente grande angular. Com um ator no centro e os outros ao lado compondo um formato estilo Santa Ceia. Mas com tudo, absolutamente tudo, até mesmo bem a distância em foco. Como foi quase todo rodado em esplêndidas paisagens naturais, o resultado é espetacular. Com imagens incríveis de quase toda a América do Norte (Lone Pine, High Sierras, ambos na Califórnia, Badland, Black Hills South Dakota, Shawnee Foret Illinois, Canyon de Chelly, Arizona, Cedar Mountain, Monument Valley, ambos em Utah, Rio Cumberland, Kentucky, Eugene no Oregon, Rocky Mountains, no Colorado etc). Ou seja, é um jeito único de narrar e de se observar uma história, de tal jeito que não foi feita outra experiência semelhante.
Começa com uma ouverture (longa de 4 minutos e meio, com canções folclóricas) e entramos numa narrativa inspirada em uma série de matérias da revista Life transformadas em roteiro do especialista no gênero James R. Webb. Dividido em capítulos e interligados pela narração em off de Spencer Tracy, que traça um retrato histórico da evolução da conquista do Oeste. A primeira parte é a chamada Os Rios, aonde uma família de emigrantes (Karl Malden e Agnes Moorehead e suas duas filhas Carroll Baker e Debbie, e os menores) chegam ao Canal do Eire buscando o caminho do Oeste. Ali, Carroll conhece um caçador de peles (James Stewart, envelhecido demais para esse tipo de papel, não convence, nem com sua peruca horrível) enquanto são atacados por piratas do rio e saem numa espécie de jangada, só que pegam o caminho errado e são vítimas de uma corredeira. Todo filme de Cinerama tinha sequências de câmera subjetiva, para melhor aproveitar o efeito de parque de diversões, o público adorava como hoje sucede no 3D. Aqui esta é a primeira onde a back projection não chega a atrapalhar muito mas é impossível não perceber que os atores foram substituídos por dublês masculinos (no caso das moças, o que é evidente e escandaloso). Ainda assim é menos do que se temia. Outras sequências semelhantes irão ocorrer depois 1) um ataque a caravana de colonos, pelos índios, que mais querem matar os cavalos. No melhor estilo No Tempo das Diligências 2) Um estouro de manada de búfalos que ataca a ferrovia, provocado pelos índios 3) uma fuga espetacular num trem em movimento, tiroteio entre xerife e bandidos. Com toras de madeira para dar mais efeito.
Curiosamente, a sequência em que poderia se prestar melhor para efeitos, a da Guerra Civil não tem esses momentos. Foi dirigido pelo mestre John Ford, com muita ternura e ritmo mais lento. Dá uma rápida visão do Presidente Lincoln e depois no campo de batalha em Shiloh, numa conversa entre o General Sherman (John Wayne, super representando) e o General Ulysses Grant (Morgan). Eu gosto na sequência de Russ Tamblyn, que faz um confederado que quer largar tudo aquilo, virar desertor, mas acaba em conflito com George Peppard, fiel soldado sulista (o ator cai na canastrice ainda mais diante da naturalidade de Tamblyn). Mas todo o episódio é quase um entreato, mais triste (Carroll Baker faz bem a mãe de Peppard, que perde o marido na guerra) e com menos ação. O filme retoma o fôlego trazendo uma memorável interpretação de um dos melhores “bad men” do cinema, Richard Widmark, que faz o líder que está construindo a estrada de ferro a qualquer custo, mesmo que custando vidas e guerra com os pele-vermelhas. Henry Fonda faz um velho caçador e Peppard sai desiludido para virar xerife no interior. O que nos leva a parte final. Eli Wallach é o chefe dos bandidos que assaltam o trem, em algumas cenas muito bem realizadas (e numa delas, o marido de Yvonne de Carlo, Bob Morgan, stuntman, perdeu as pernas). O clímax é com as toras de madeira e trombadas formidáveis.
A narração final é em cima de paisagens diversas até chegar aos viadutos, símbolos da Terra Prometida (como diz a canção que conclui a trilha!).
Para os atores, era muito difícil representar porque haviam três lentes na câmera do Cinerama, e não sabiam para onde olhar. No filme dos Grimm, não conseguiram acertar quase nunca, mas aqui o problema foi solucionado fazendo com que olhassem sempre com inclinação de um terço diante da câmera. Na projeção dava mais ou menos certo. Mas foi uma das razões porque largaram o sistema depois deste filme e resolveram usar apenas o 70 mm, ou seja, um único negativo e uma única câmera. O Cinerama hoje sobrevive em pouquíssimos lugares como curiosidade histórica. Foram cortadas as cenas de Hope Lange, que fazia a namorada de George Peppard, que era filha de Fonda. Segundo Debbie, seu personagem iria se afogar no rio, mas acharam melhor que ela unisse as gerações. Por causa das linhas divisórias nas separações entre os projetores, eram colocados objetos como árvores, lâmpadas, janelas, portas, sempre para ajudar a disfarçar o incomodo defeito. O filme teve mais de 12.000 figurantes. Gary Cooper iria fazer o papel de Linus Rawlings, mas morreu antes da filmagem começar. James Stewart aceitou o papel, mas nunca se sentiu à vontade nele. Tinha 54 anos e fazia alguém de 28! Aliás, percebe-se. O filme inspirou depois de uma série de TV da ABC do mesmo nome em 1979. Foi a maior bilheteria de 1962. A explicação para os atores que overacting (Wayne, Peppard, Cobb) é que ficaram intimidados pelo tamanho das câmeras e acharam que tinham que ser teatrais. Na verdade, quem se sai melhor são os mais discretos como a grande Thelma Ritter (que faz a parceira de Debbie na caravana). Quando queriam um plano próximo, as câmeras com as três lentes ficavam muito próximo do rosto do ator, apenas 18 polegadas de distância. O filme passou com intervalo (era necessário porque os rolos tinham que ser ajeitados).
Enfim, eu gostei muito de A Conquista do Oeste. É uma experiência e tanto!