Pouca gente lembra ou sabe que houve uma guerra entre Japão e China na época em que os militaristas belicosos do Japão estavam querendo se expandir (e que eventualmente resultaria em Pearl Harbor). E que por causa disso, os chineses até hoje ressentem e não gostam dos japoneses (que também ainda não reconheceram direito seus erros e exageros).
Não foi só a guerra, mas por causa do comportamento sanguinários dos invasores, que mataram e estupraram sem dó ou piedade. Quem pesquisar irá encontrar tragédias horríveis e injustificadas, ainda pouco conhecidas no resto do mundo.
Acho que não existe no Oriente no momento um diretor do porte de Zhang Yimou, que é amigo de Spielberg (ajudou na realização dos shows de abertura e encerramento das Olimpíadas e foi quem indicou Christian Bale para o papel de americano envolvido na história).
O longa, que é uma coprodução com os EUA, foi o indicado oficialmente pela China para o Oscar de filme estrangeiro e durante anos fez filmes belíssimos de arte (como Lanternas Vermelhas) que eram perseguidos pela censura.
Até que um dia se cansou e passou a realizar aventuras (O Herói é uma obra-prima e um dos meus filmes preferidos) e montagens de ópera, usando seu domínio técnico (ele foi antes fotógrafo) e bom gosto. Aqui Yimou retorna ao tema do que foi justamente seu primeiro longa como realizador, Sorgo Vermelho (87), que passou aqui faz tempo e está esquecido.
Mas já era uma denúncia muito chocante dos fatos até então pouco divulgados. Um detalhe curioso é que Yimou selecionou uma cineasta da Palestina para fazer estágio na produção, na rodagem e pós-produção, Annemarie Jacir. Esteve em produção por 164 dias, em que se trabalhava 18 horas por dia.
Ele retorna ao assunto agora se fixando no chamado Estupro de Nanking (a cidade que inventou a tinta famosa), que aconteceu em 1937, na chamada Segunda Guerra Sino Japonesa, um agente funerário John (Bale) que chega a uma igreja católica na cidade para fazer o enterro de um padre. Mas acaba sendo o único ocidental num convento onde está um grupo de estudantes e também de prostitutas fugitivas de um bordel. Sem querer, é obrigado a se vestir de padre e de servir de involuntário protetor dessas jovens, diante das investidas dos invasores japoneses.
Feito com a habilidade habitual do realizador (enquadramentos precisos, belos movimentos de câmera, figurino muito elaborado, utilização estética das cores,) o roteiro acaba sendo um pouco previsível. Já é velho clichê do cinema a figura do homem sem fé ou bandeira, que se entusiasma por uma causa que o leva ao heroísmo e sacrifício como é o caso de John, ou a redenção (como as prostitutas).
Talvez seja esse o problema que impediu o filme de ter maior repercussão pelo mundo (seu prêmio mais notável é uma indicação ao Globo de Ouro). Vocês devem se lembrar de que o próprio Bale teve problemas com o governo da China que acabou declarando ele pessoa não desejável quando assumiu a defesa de um contestador (se esquecendo que lá é uma ditadura comunista).
O New York Times chegou a dizer que o filme parece “um musical backstage - passado nos bastidores - que de vez em quando é interrompido por um desagradável estupro ou assassinato”. E o classifica como um blockbuster de atrocidades na linha de Galipoli e E o Vento Levou. Inclusive por causa de sua longa-metragem.
Concluindo que há uma desproporção entre os eventos e o tratamento distanciado que o diretor dá ao assunto e sua recusa de assumir um ponto de vista. Eu diria mais, sua indignação, o próprio terror da violência. Prendendo-se mais ao melodrama e o fotogênico.
Ainda assim, os que desconhecem os fatos podem e devem conhecer o filme. Nem que seja como lição de história. Ah, Bale como sempre está tenso e revoltado, naquele tom que já conhecemos.