LANÇAMENTO DE "AS HORAS"

Estivemos na sessão para a imprensa do filme "As Horas" e pudemos avaliar que se trata de um filme inteligente, com um enredo em paralelo sobre trêm mulheres duferentes, em épocaas diferentes, inteligentemente colocando um livro de Virginia Wolf (uma das três mulheres) como fio condutor das emoções e sentimentos, hora delicados, hora fortes e complexos, tratando com inteligência temas que sempre perturbaram a sociedade. As atrizes estão todas excelentes, especialmente Maryl Streep. Destaca-se também a atuação de Ed Harris, talvez o personagem mais perturbador da história. Com uma boa direção, o filme se torna lento por vezes. A trilha musical é ótima (porém não deve agradar a todos) de Philip Glass.

O nosso colunista Eron Fagundes fez uma matéria sobre o filme no canal "Cinemania"

Vejam abaixo o release distribuído à imprensa pela distribuidora Lumiere/Miramax:

AS HORAS

De: Stephen Daldry
Com: Nicole Kidman, Julianne Moore, Meryl Streep, Ed Harris, Tony Collete, Claire Danes, Jeff Daniels, Stephen Dillane, Allison Janney, Jonh C.Reilly, Miranda Richardson, Eileen Atkins, Linda Bassett, Jack Rovello

{SINOPSE}

Três eras, três mulheres e três histórias se mesclam em As Horas.
Cada mulher está ligada às outras como elos de uma corrente, sem que tenham consciência de que o poder de uma grande obra literária está modificando suas vidas para sempre.
A primeira é Virginia Woolf, que vive num subúrbio londrino nos anos 20, lutando contra a insanidade enquanto começa a escrever seu primeiro grande romance, A Senhora Dalloway. Duas décadas mais tarde, Laura Brown, casada, com filhos e morando em Los Angeles no final da 2ª Guerra Mundial, lê A Senhora Dalloway e o acha tão revelador que está pensando em fazer uma mudança radical em sua vida. E há ainda, na Nova York dos dias de hoje, Clarissa Vaughan, uma versão moderna da Sra. Dalloway de Virginia Woolf, apaixonada por seu amigo Richard, um poeta brilhante que está morrendo de Aids. As histórias se entrelaçam e por fim se fundem num momento surpreendente.


{SOBRE A PRODUÇÃO}
Inspirado no romance A Senhora Dalloway, escrito por Virginia Woolf em 1925, Michael Cunningham escreveu As Horas 75 anos depois. Agora, As Horas é transformado em filme, sendo resultado de uma inspirada colaboração entre alguns dos mais renomados talentos criativos do cinema.
Publicado em 1998, o romance de Michael Cunningham foi aclamado como uma obra literária da maior importância. Recebeu o prêmio Pulitzer de Ficção, o PEN/Faulkner, e foi eleito Melhor Livro de 1998 pelos jornais The New York Times, Los Angeles Times, Boston Globe, Chicago Tribune e Publishers Weekly.
Jameson Currier, do Washington Post Book World, escreveu que Cunningham "criou de forma primorosa algo original, um trio de histórias que se entrelaçam magnificamente e se alternam capítulo a capítulo…seu trabalho mais maduro e magistral".
"Cunningham levou a cabo um dos projetos literários mais desafiadores que se possa imaginar. O retrato que Cunningham faz de Woolf é comovente. Em As Horas, Cunningham fez o impossível: lançou mão de uma obra literária consagrada e, trabalhando em cima dela, tornou-a uma obra sua", conclui a resenha do Yale Book Review.
Retratando a forma como três mulheres de épocas diferentes são unidas por uma obra literária magistral, As Horas conta a história dessas três personagens muito diferentes que têm em comum a sensação de que têm vivido suas vidas no lugar de outra pessoa.
Virginia Woolf, que mora num subúrbio londrino no início da década de 20, luta para começar a escrever A Senhora Dalloway, e para superar os problemas mentais que ameaçam engoli-la. Laura Brown, uma jovem mãe e esposa do período pós-Segunda Guerra em Los Angeles, está começando a ler A Senhora Dalloway, e é tão profundamente afetada pelo livro que passa a questionar a vida que escolheu para si. Clarissa Vaughan, que vive na Nova York de hoje, torna-se uma versão moderna da Sra. Dalloway, enquanto planeja aquela que pode vir a ser a última festa para seu amigo e ex-namorado Richard.
Mesclando três histórias acerca de três mulheres que buscam sentido para suas vidas, As Horas dá vida à crença de Virginia Woolf de que todas as vidas se entrelaçam.
Quando Scott Rudin adquiriu os direitos para filmar o romance, muitos se perguntaram se não seria difícil demais transformar em filme uma obra literária não-linear e cheia de nuances. Mas é inegável que a idéia de múltiplas histórias que se misturam e se passam em épocas diferentes representa um conceito altamente cinematográfico, que remonta a 1916, com o filme Intolerância, do diretor D.W. Griffith. Com elenco estelar, um diretor consagrado e roteiro de um dos mais aclamados dramaturgos contemporâneos, As Horas fez uma transição segura das páginas para as telas. O diretor Stephen Daldry (de Billy Eliot) comenta: "Achei que a idéia de se ter três histórias, três mulheres e a relação entre elas era uma maravilhosa oportunidade de tentar criar uma única narrativa".
O roteirista David Hare considera o livro de Michael Cunningham "uma obra literária extraordinária". E acrescenta: "Considero a tática de contar três histórias, sem que o leitor seja capaz de entender a forma como se conectam, absolutamente fascinante. De certo modo, Michael consegue prender a atenção do leitor mesmo que este não saiba exatamente como as peças se encaixam. Então, quando se compreende como se encaixam é profundamente satisfatório".
Para David Hare a estrutura do roteiro deveria ser diferente da estrutura do romance. "Encontrei minha maneira de mixar as histórias e de fazer novas conexões. Eu sabia que podíamos reproduzir o prazer que o livro proporcionava, o de ir compreendendo aos poucos o modo como as três histórias se encaixam", conta ele.
Como a maior parte do que consta no livro é o que se passa na mente dos personagens, o maior desafio para Hare era transmitir através da ação e dos comportamentos aquilo que no romance de Cunningham era internalizado.
"No filme, não se pode ter voz interior a não ser que seja voz em off", pondera Hare. Ele continua: "Tomamos uma decisão específica logo no princípio no sentido de que não haveria voz em off e, uma vez decidido isso, tive de criar alguns acontecimentos que expressassem o que se passava dentro das mentes dos personagens sem que isso fosse dito. Por exemplo, a questão da volta do marido de Laura da guerra - era preciso deixar claro como a experiência da guerra afetou seu casamento. Há o tema da 2ª Guerra Mundial que perpassa o filme, o que tive de tornar explícito na cena da festa de aniversário no final, em que ele fala com ela sobre como a viu pela primeira vez. No livro, é claro, isso não é exteriorizado. Tive de inventar uma série de acontecimentos assim para demonstrar o que acontecia com os personagens internamente. Por exemplo, fiz muitas mudanças no amigo de Clarissa e na vida privada da personagem para demonstrar diversas coisas que se passavam em suas mentes".
David Hare, contudo, apreciou o desafio. "É aí que está a graça em se fazer filmes. Eu não só não me permiti usar voz em off, como estava decidido a evitar flashbacks. Obviamente, no livro há muito do passado de Clarissa e Richard quando jovens, e isso fica maravilhoso no livro. Ocorre que nós já tínhamos três histórias e não me parecia uma boa idéia ainda fazer flashbacks numa delas. Eu preferi me valer de coisas que os personagens diziam e da forma como eles estavam juntos, em vez de mostrar. Acredito que ao não nos permitirmos essas saídas, estabelecemos uma disciplina que dá um resultado bem melhor".
O roteirista se reuniu com Michael Cunningham antes de iniciar o trabalho. "Michael tinha planejado originalmente um livro bem mais extenso e então ele pôde me fornecer informações valiosas sobre os personagens e suas vidas", recorda Hare. E prossegue: "Ele sabia tudo sobre eles e foi extremamente generoso em relação ao seu tempo e boa vontade. Minha admiração pelo que Michael escreveu aumentava ainda mais à medida que eu trabalhava no roteiro. Acho bastante incomum escrever o roteiro de um filme a partir de um romance e continuar a admirar o livro tanto quanto no começo. Isto se aplica ao livro de Michael. A vida de uma mulher, num dia, é uma representação de toda a sua vida: é essa a idéia. Michael me disse: 'Virginia Woolf seguiu um caminho e eu outro; agora, David, pegue a bola e tome a direção que quiser.' Foi uma oferta muito generosa, ele me ofereceu sua confiança. E, evidentemente, se um autor faz uma oferta dessas ao outro, este dará o melhor de si para respeitá-la".
Hare já tinha trabalhado com Stephen Daldry antes de As Horas. Daldry o dirigiu em sua estréia como ator na peça de teatro Via Dolorosa, de autoria de Hare, montada no Royal Court, em Londres, que ficou quatro meses em cartaz na Broadway. "Ele é um diretor que possui o dom de compreender a emoção contida em qualquer material", elogia Hare.
Stephen Daldry ainda não tinha lido o romance de Michael Cunningham quando Scott Rudin lhe apresentou um esboço inicial do roteiro de David Hare. "Eu estava de férias no sul da França quando recebi o roteiro", conta ele. E continua: "Minha reação foi de encará-lo como um roteiro magnificamente escrito e uma oportunidade maravilhosa de explorar e pesquisar A Senhora Dalloway, um dos melhores livros já escritos".
Daldry acrescenta que adorou o livro de Cunningham e que, embora o autor tenha dado total liberdade aos realizadores para o transformarem em filme, eles se mantiveram fiéis ao livro. "Michael nos disse que éramos livres para fazer o que entendêssemos apropriado. Foi libertador e, conforme o roteiro avançava, acabava mantendo-se fiel ao rico universo explorado no romance", ressalta Daldry.
Para o diretor, a essência de As Horas é seu profundo respeito pelas mulheres e os desafios que enfrentaram ao longo dos turbulentos e imprevisíveis acontecimentos do século 20. "No filme, nossas mulheres lutam ao longo do dia que lhes é dado, dia que definiram para si mesmas e que outros definiram para elas", explica Stephen Daldry. E continua: "Há um verdadeiro heroísmo, e acho que isto foi uma das coisas que me atraíram no roteiro - é um dia na vida de cada uma dessas três mulheres. E talvez represente todos os dias. Talvez a trajetória, a luta, o estoicismo e as dificuldades emocionais que enfrentam, talvez as batalhas e o heroísmo estejam tanto no jardim de casa e no quarto, e ao se fazer um bolo na cozinha, quanto em escalar montanhas ou ganhar guerras. Acredito que o heroísmo na vida das mulheres é constantemente subestimado, ou posto em segundo plano em comparação ao heroísmo na vida dos homens. Obviamente, os esforços são enormes e profundos, e possuem a mesma importância".
{O elenco e os ensaios}
Meryl Streep, que interpreta Clarissa Vaughan, recebeu originalmente o livro As Horase presente de uma amiga. "Achei o livro lindo", diz ela. E completa: "Quando meu empresário me ligou eu não conseguia imaginar como poderiam transformá-lo num filme, como aquele mundo interno poderia ser traduzido num filme. Mas quando recebi o roteiro, vi que era maravilhoso. David Hare é muito sensível e um escritor muito habilidoso".
A atriz já conhecia o trabalho de Hare, por ter atuado na versão para o cinema da peça de sua autoria, Plenty. "David consegue expressar coisas que estão dentro das pessoas. Ele as coloca numa determinada situação em que possam transmiti-las através da atuação. E eu acho que foi isso que me convenceu que As Horas seria um bom projeto para se trabalhar", comenta Meryl Streep.
Julianne Moore, que atua no papel de Laura Brown, elogia: "David Hare conseguiu traduzir tanto a realidade emocional do romance como a estrutural. Sinceramente, eu não acreditava que isso pudesse ser feito, mas ele o fez lindamente". Fã do romance de Michael Cunningham, Moore acrescenta: "Leio muita ficção e ela raramente me surpreende. Quando se lê muito, aprende-se a encontrar pistas e se antevê o que vai acontecer. Mas As Horas me surpreendeu de verdade e me emocionou. Quando alguém consegue fazer isso você se sente como se tivesse 12 anos de idade novamente. Cunningham consegue ser realista em relação às coisas dolorosas e difíceis na natureza humana, e ao mesmo tempo tremendamente esperançoso e inspirador. Sua idéia de acompanhar as horas de nosso dia, de nossas vidas, e o que isso significa - é isso que é ao mesmo tempo doloroso e valioso na vida, tudo ao mesmo tempo. Fiquei muito comovida".
A atriz acredita que sua personagem tem algo em comum com Virginia Woolf. "O que Laura tem em comum com Virginia Woolf é a depressão. Porém, enquanto esta a vê como uma doença, algo contra o que tem que lutar, Laura vive alienada. Ela não está presente nem em sua própria vida, sua profunda infelicidade é o estado da sua vida. O que me agrada no romance e no filme é que se trata de apenas mais um dia, outro punhado de horas que ela terá de atravessar. O que ela não espera é que aconteça alguma grande transformação.".
Segundo Julianne Moore, que tem dois filhos, o papel de Laura a tocou fundo. "Quando fiz o filme meu filho tinha três anos e meio, e durante as filmagens eu estava grávida de minha filha. No livro o menininho é mais novo, mas teria sido impossível trabalhar com uma criança de três anos neste filme. Eu conheço a ligação que existe entre mãe e filho. O fato de este menino ser tão ligado à mãe, conseguir sentir sua depressão e estar tão perdido - isso partiu meu coração. Não estou certa sobre se seria capaz de compreender caso ainda não fosse mãe, mas o que é angustiante é que você percebe que Laura faz a única escolha possível para ela no final de sua história. Na verdade, ela está escolhendo viver em vez de morrer. Trata-se de uma mulher confusa com um casamento que não queria estar vivendo, ela não tem a menor idéia quanto à sua sexualidade, está desesperadamente infeliz, nem sequer sabe o que quer ser nesta vida. E está perdida, sem opções. É um mundo diferente e vemos um mundo diferente na vida de Clarissa. Ali está uma mulher que teve um filho porque queria tê-lo, está com quem deseja estar, fez escolhas em sua vida. Laura praticamente não fez escolhas, ela se refugia nos livros".
A título de preparação para seu papel como Virginia Woolf em As Horas, Nicole Kidman se lançou na pesquisa da vida e do trabalho da escritora. "Parte de se interpretar alguém que realmente existiu consiste em encontrar sua essência", afirma Nicole Kidman. E acrescenta: "David Hare me deu muitas informações sobre ela e Michael Cunningham também. Durante esse período eu simplesmente me apaixonei por ela, que foi uma mulher que abraçou a morte, a loucura e o amor. Sempre achei muito interessante a profundidade com que conseguiu captar o que há de patético na vida. Simultaneamente, era brincalhona e tinha uma alegria de viver que fazia as pessoas desejarem estar perto dela. Ficavam fascinadas, sentiam-se atraídas por ela. E ela era grata ao seu marido, Leonard, por ser tolerante com ela. Muito daquilo contra o que ela lutava era para poder respirar, poder viver em Londres que era onde ela queria morar, e não ficar presa, em Richmond. Acho que a criatividade recebe interferência do ambiente. Eu me identifiquei muito com isso".
A personagem Virginia teve um efeito profundo em Nicole Kidman. "É interessante como os personagens vêm a você num determinado momento de sua vida, quando precisa deles. Eu não estava num estado de espírito dos mais divertidos naquela época e ela foi catártica para mim de um modo estranho. Há uma bonita fala no roteiro sobre como os mortos nos dão presentes. E Virginia me deu um presente. É tudo muito estranho: naquele momento da minha vida eu precisava dela. Eu precisava interpretá-la".
Na opinião de muitos, Nicole Kidman não parecia indicada para retratar Virginia Woolf, sobretudo em função da ausência de semelhança física. Stephen Daldry admite: "Não há muita semelhança física entre Nicole Kidman e Virginia Woolf". E acrescenta: "Mas há uma espécie de magnetismo animal semelhante. E usei a palavra 'animal' no melhor sentido. Já que Nicole não pode parecer exatamente Virginia Woolf, tentamos de algum modo mostrar a essência do que foi aquele rosto extraordinário".
A própria Nicole Kidman teve receio de aceitar o papel. "Sabe, quando é preciso desfigurar seu rosto como eu fiz, e se está interpretando alguém tão diferente do que se é, especialmente em se tratando de uma australiana interpretando uma personagem que é um ícone para os ingleses e para as feministas, se pensa, 'Nossa, é assustador!' Eu tive de confiar na pessoa que estava me guiando nesse processo. E Stephen me guiou. Ele ajudou a me moldar e me dirigiu, dando-me uma grande confiança para seguir em frente".
"Foi uma benção trabalhar com esses atores", declara Stephen Daldry. E continua: "Não apenas Julianne, Meryl e Nicole, mas todo o elenco. Foi uma felicidade e um aprendizado cada dia em que presenciei seus diferentes métodos de trabalho".
De fato, As Horas funcionou como um ímã para os atores e até mesmo os menores papéis atraíram grandes talentos. Allison Janney, que faz o papel de Sally, namorada de Clarissa. conta"Achei que nunca me liberariam das gravações de The West Wing por tempo suficiente. Mas ficaram tão empolgados quanto eu e trabalharam feito loucos para que eu pudesse participar".
Toni Collette, que atua como Kitty, contracenando com Julianne Moore, também adorou a oportunidade de fazer parte de um elenco tão notável. Ela descreve sua personagem como "alguém que diz uma coisa sempre querendo dizer outra". E observa: "Kitty viveu protegida toda a sua vida e agora é a sua vez de cair. Mas ela o fará com um sorriso nos lábios. As Horas é um livro brilhante e sua adaptação para o cinema é fabulosa. Enquanto trabalhava no filme eu tinha a sensação de ter muita sorte de ter qualquer participação nele. É tão inteligente, inspirador e sensível, e eu me orgulho de fazer parte dele".
Quando ofereceram a John C. Reilly o papel de Dan Brown, ele não teve de pensar muito. Reilly ficou intrigado com a possibilidade de criar em cima de um personagem semelhante a outro que ele havia interpretado em outro filme. "Senti como se eu o conhecesse de alguma forma. Ele é um veterano de guerra que participou da 2ª Guerra Mundial, e eu atuei em Atrás da Linha Vermelha".
Jeff Daniels, que interpreta Louis Waters, ex-namorado de Richard, o poeta que está morrendo de AIDS, diz acerca de seu personagem: "O que eu gostei no papel foi poder dar vida à situação universal em que duas pessoas, recordando os velhos tempos depois de muitos anos afastadas, voltam a falar das coisas boas e ruins e, o mais importante, das coisas que ficaram mal resolvidas. Ali estão de novo, como se fosse ontem. Não demora muito até que a conversa sobre amenidades seja substituída por comentários ásperos, e então os mísseis começam a ser lançados e todos tentam se proteger. Afinal, para que servem os velhos amigos?"
O ator elogia o diretor do filme: "Stephen vem do teatro, como a maior parte do elenco, então a atenção dada à investigação do personagem é bem específica. Stephen revia cada momento, assegurando-se de que tinha pensado em tudo".
O ator ganhador do Tony Stephen Dillane, que aparece em As Horas como o marido de Virginia, Leonard Woolf, encontrou a chave para o papel no roteiro de David Hare. Ele comenta: "Achei a adaptação para o cinema excelente, muito comovente. Leonard Woolf era um homem notável, profundamente comprometido com seus ideais, fosse na vida pessoal ou politicamente. Sua autobiografia é uma leitura que recomendo. Woolf tem a rara habilidade de captar detalhes contemporâneos à época, que nos transportam para o tempo em que viveu. Ele era engajado nas questões políticas e artísticas da época. Era um homem que procurava viver segundo aquilo em que acreditava e recorda seus sucessos e fracassos com uma sinceridade que desarma. Alguns pensam que Leonard Woolf era insensível e superprotetor, e que controlava a vida de Virginia Woolf de forma obsessiva. Outros dizem que Virginia Woolf desejava e precisava da proteção de Leonard Woolf contra seus próprios instintos autodestrutivos. Quem saberá dizer? O roteiro acompanha o livro ao tender mais para a primeira interpretação".
Duas vezes indicada ao Oscar, Miranda Richardson, que interpreta a irmã de Virginia Woolf, Vanessa Bell, diz que uma das coisas que a atraiu em As Horas foi a força do texto e a idéia de que sua personagem dá uma certa leveza à vida de Virginia Woolf, bem como ao filme. "É um roteiro tão complexo e lindamente escrito que reflete o conteúdo do livro e ao mesmo tempo tem qualidades próprias", diz. E completa: "Adorei que minha personagem, Vanessa, em comparação à irmã, Virginia, tivesse um modo de ser mais despreocupado. A relação das duas me faz lembrar de vários relacionamentos entre irmãs. Havia quase que uma simbiose entre elas, com uma sutil rivalidade subjacente. Acredito que Vanessa sentisse que devia cuidar de Virginia como se fosse sua filha, e ao mesmo tempo ela parecia se sentir tentada a evitar emocionalmente a intensidade de Virginia".
Durante a pré-produção, Stephen Daldry insistiu num longo período de ensaios para ele e os atores, algo raro na realização de filmes. Ele explica: "Como venho do teatro tenho dificuldade em predeterminar a minha visão de uma cena ou de uma seqüência de cenas sem trabalhar isso com os atores previamente. Para mim, é a única forma de trabalhar a dinâmica interior e a emoção contidas numa cena. Partindo daí, consigo planejar o posicionamento da câmera. É maravilhoso ter a presença do roteirista nos ensaios, pois ele pode reescrever o texto a partir da contribuição dos atores, ajustando-o às suas qualidades e fraquezas. E, mais importante, tivemos muita sorte por trabalharmos com um grupo de atores tão experiente, muitos dos quais com anos de carreira no teatro. Eles conseguiam participar do processo de ensaio de um modo com que David e eu entendíamos. Isso nos ajudou muito".
Houve uma outra razão para que Stephen Daldry entendesse ser crucial um longo período de ensaios. "Uma das maiores vantagens de ensaiar e conhecer muito bem o roteiro antes das filmagens foi saber o padrão de corte de uma história para outra. Em termos de ritmo, o que se vê é basicamente o que ensaiamos, o que não é comum. Sabíamos bem quando uma história levaria a outra e qual era o ritmo das histórias em conjunto, tudo isso antes de filmar."
{O visual e a música}
Para a criação do visual de As Horas, Stephen Daldry contou com o auxílio da desenhista de produção Maria Djurkovic, da figurinista Ann Roth e do diretor de fotografia Seamus McGarvey. Todos trabalharam em conjunto a fim de criar um visual que unificasse as três histórias e realçasse as características que tinham em comum.
Ann Roth se concentrou no visual do grupo de Bloomsbury. "Todo esse grupo de pessoas - os pintores, Vanessa e Duncan Grant - tinha cores bem fortes. Eu pretendia ligar tudo, o filme inteiro, juntar tudo através das cores. Julianne Moore usa as mesmas cores que Meryl, que usa as mesmas cores que Nicole Kidman", ela ressalta.
Kidman destaca que o figurino criado por Ann Roth foi a chave que a ajudou a moldar Virginia. Os sapatos, os tecidos e até mesmo um lenço, tudo permitiu a Nicole reagir de forma fiel à época e, talvez, a Virginia Woolf também. "Assim que eu vestia aquelas roupas, era como se pudesse me movimentar de um modo diferente", revela a atriz".
"Foi como criar três unidades distintas, assegurando-me, porém, de manter a uniformidade, para que o filme resultasse como uma unidade. Trata-se de um trabalho fabuloso para um desenhista de produção. É quase como fazer uma colagem, pensando nas cores que se vai usar ou não. O figurino de Ann e a iluminação de Seamus ajudaram a completar isso, de modo que tivéssemos um todo uniforme", afirma Maria Djurkovic.
O diretor Stephen Daldry, contudo, tinha consciência de que buscar uma total unidade entre as histórias seria um equívoco. Ele comenta: "Sempre desejamos ter um processo específico para unificar as histórias, a fim de que houvesse não apenas coerência no visual, como também diferenças. Há uma oposição visual entre as histórias e boa parte disso foi alcançado através de coisas simples como as cores. As cores variam de história para história, no entanto, de alguma forma a paleta de cores em cada uma delas tem a ver com a anterior. Assim, os elementos unificadores estão no padrão de edição, na paleta de cores, nos movimentos da câmera de história para história e nas técnicas de revelação da película. Procuramos evitar o que classifico como movimentos 'decorativos' da câmera. Mais do que predeterminar o efeito emocional de um movimento de câmera, tentamos permitir que os atores controlassem o efeito emocional. Fizemos com que a câmera respeitasse os atores. E, é claro, tivemos um elenco fantástico, e uma grande parte do trabalho ficou por conta deles".
O compositor Philip Glass, cujo trabalho geralmente parece concentrar a própria essência da passagem do tempo, criou a trilha sonora de As Horas. "Eu utilizei a música para estabelecer uma ponte entre as histórias e não para separá-las", diz ele. E esclarece: "Um dos aspectos mais interessantes deste filme é que passa de uma história a outra, e a mesma música começa numa história e continua na seguinte. Alguns podem pensar que cada história deveria ter sua própria música. Eu optei por não fazer isso".
Glass preferiu seguir o estilo que o autor do livro, Michael Cunningham, adotou no romance, seguido igualmente pelo roteirista David Hare - criar algo contínuo, que atravessa o tempo e o espaço à medida que as histórias se entrelaçam.
Ele pondera: "Afinal, não se trata de fato de histórias independentes, cada segmento está contando parte de uma mesma história. E o ponto de vista emocional mantém-se coerente, já que as três lidam com autodestruição e sobrevivência. Busquei a mesma coerência na música, para que fosse um fio entremeando esses três períodos no tempo, como meio de torná-los um só".
A coerência estrutural era uma questão vital para todos no filme. Philip Glass recorda: "Michael Cunningham enfrentou isso no romance, Stephen Daldry teve de lidar com isso enquanto diretor, e também era essencial para a música. É muito interessante que a imaginação de um escritor possa ir tão longe em épocas e vidas diferentes e encontre as conexões. É uma forte afirmação do poder da arte".
{As locações}
As filmagens tiveram início em fevereiro de 2001, em Nova York, com duas semanas de trabalho dedicadas praticamente à seqüência em Greenwich Village. Para o exterior do apartamento de Clarissa foi usado um prédio histórico próximo a uma casa onde viveu Mark Twain. O apartamento de Richard ficava na região de Meat Market.
Em seguida às filmagens em locação em Nova York, a equipe foi para Miami filmar os exteriores da seqüência de Laura Brown, que na verdade se passa na Los Angeles dos anos 50. Depois, a produção se dirigiu para Londres, onde muitos interiores foram filmados nos Pinewood Studios. Para se passar pela residência de Virginia e Leonard Woolf em Richmond, foi escolhida uma velha casa ao sul do subúrbio de Luton. O diretor revela: "Procuramos outras casas em Sussex e a gerente de locação me levava as fotos todos os dias em minha casa. Por fim, ela disse, 'O que é incrível nesta casa é que é idêntica às de Sussex.' Depois de discutir o assunto, chegamos à conclusão de que a minha casa seria a melhor locação, e eu adorei filmar nela. Foi sensacional. A equipe tomou cuidado com a casa. Normalmente, eu não deixaria uma equipe de filmagem sequer se aproximar dela!".
No início da primavera, Nicole Kidman teve de filmar a seqüência do suicídio. Stephen Daldry enfatiza: "Ela estava ciente de que teríamos de colocá-la num rio de verdade, com uma correnteza forte, e de que teria de ficar embaixo d'água. Tratava-se de uma situação bastante perigosa. No entanto, no que diz respeito a Nicole, nunca se cogitou a possibilidade de outra pessoa fazer a cena. Foram necessários vários dias para filmar essa seqüência, incluindo a parte em que o corpo de Virginia é arrastado pela correnteza para o leito do rio. A pessoa naquelas cenas é Nicole Kidman".
Nicole Kidman e os demais atores fizeram questão de retornar mesmo que fosse para inserir tomadas mínimas no filme. "A uma certa altura eu quis inserir algumas imagens da mão de Virginia enquanto ela escrevia. Pareceu-me sem sentido usar outra pessoa para as tomadas. Nicole estava ocupada trabalhando em outro filme, mas veio a Londres, vestiu o figurino e a filmamos escrevendo. Eles fizeram grandes esforços para retornar após a fotografia principal para filmar pequenas tomadas como essa sempre que precisávamos", elogia o diretor. Nicole Kidman, que é canhota, aprendeu a escrever com a mão direita para fazer o papel e até conseguiu imitar a letra de Virginia Woolf.
"Todos estavam concentrados no que faziam", concorda Stephen Daldry. E completa: "Mas também foi divertido, pois era um trabalho sério. E foi isso que o tornou divertido. Foi um processo de verdadeira colaboração entre todos os envolvidos. Ao longo de todo o processo houve um sério trabalho de equipe. E que equipe nós tínhamos!"
E conclui "Espero que mesmo para quem não conheça nada sobre A Senhora Dalloway, nem sobre Virginia Woolf, isso não faça a menor diferença e não comprometa o prazer de assistir este filme. E quanto àqueles que leram A Senhora Dalloway, sabem que é um mapa do tesouro e terão - assim espero - tanto prazer quanto tivemos ao explorá-lo".