OSCAR 2004: UM PEQUENO BALANÇO

01 de março de 2004

É uma situação difícil, ter quase certeza de que Cidade de Deus não iria levar nada e ao mesmo tempo ter que manter o sorriso, a animação, a esperança nem que seja para que o espectador não desligue ou mude de canal. Mas foi o que sucedeu comigo. Por um lado, uma vontade tremenda de que eu me enganasse, de que a Academia me surpreendesse e desse ao menos um Oscar para a gente. Sim, porque eu também me sentia emocionalmente envolvido.

Em parte por fazer a transmissão há tantos anos e nunca ter tido o prazer de anunciar ou comentar um prêmio para brasileiros. Seria realmente um clímax, um ápice, um grande prazer.

E nem tenho idéia de como reagiria (já fiquei muito emocionado quando o fotógrafo indicado ao Oscar César Charlone no tapete vermelho lembrou-se de ter sido meu aluno. Foi gentileza dele. Quem tem orgulho disso sou eu).

Esse envolvimento pessoal, nós todos temos com o Oscar, ainda mais este ano (está virando questão de honra um dia trazermos um Oscar para o Brasil, mesmo que a gente tenha várias dúvidas a respeito de sua justiça. Basta lembrar os erros que comete, como os de Benigni e Gwyneth, num passado não muito distante). De qualquer forma, parece clichê dizer isso mas ter as indicações, chegar lá, já foi uma super-vitória, por sinal inédita (nunca houve antes um filme rejeitado pela comissão do Oscar de Fita Estrangeira, que depois conseguisse quatro indicações normais.

Ou seja, de certa maneira negando a competência deles. Não é o melhor dos estrangeiros, mas é melhor dentre todos!).

Mas estamos querendo mais. Fora isso, a Academia este ano esteve altamente previsível. Era evidente que Senhor dos Anéis iria ganhar os prêmios principais porque tinha realmente chegado seu momento (aliás, depois de muita injustiça, em 2003 levou apenas dois e Jackson nem foi indicado). Mas 11 realmente eu nem cheguei a especular. Mas devia tê-lo feito porque, na verdade, seus concorrentes eram fracos. Nenhum deles tinha categoria, peso, pretensão para derrotá-lo. Já elogiamos muitas vezes a Saga e não premiar o filme iria parecer, no futuro, um absurdo total. Talvez, as poucas surpresas sejam mesmo um prêmio de fotografia para Mestre dos Mares (por sinal, injusta, a fotografia é medíocre, assim como a própria carreira dele), e o fato de terem acertado com As Invasões Bárbaras como melhor estrangeiro (já fizeram tanta besteira que estavam desacreditados. Acho mesmo que Denys Arcand deve o prêmio a Cidade de Deus; diante das indicações, ele resolveram tomar vergonha na cara).

O curta de Saldanha não era realmente muito bom. E Sob a Névoa da Guerra, mesmo sendo inferior a Na Captura dos Friedmans, ao menos é um bom trabalho de um grande documentarista veterano e até agora ignorado (Errol Morris, incluído no meu Dicionário de Cineastas). Os atores premiados, foi o esperado.

Quanto à festa, como sempre, eu perco um pouco o distanciamento crítico. Mas me pareceu lenta, aborrecida, com canções tétricas e sombrias, poucos momentos mais engraçados (o ponto alto foi, sem dúvida, a gag feita por Blake Edwards, coerente com sua carreira, e notável para um senhor de 81 anos). Não acho que o produtor Joe Roth tenha senso de espetáculo, nem os humoristas estiveram especialmente brilhantes. Embora Crystal saiba reagir às situações (o finalzinho, onde o produtor dizia ter namorado uma prima dele, foi muito bem aproveitado por ele).

Sabe Deus quando terei (teremos) uma nova oportunidade de concorrer a tantos prêmios. Mas temos Diário da Motocicleta do Waltinho pintando por aí, e o cinema brasileiro realmente parece ter tomado prumo. Ainda não desisti do sonho.

 

Por Rubens Ewald Filho