04
de novembro de 2003
Depois
do promissor Garota, interrompida (1994), o
cineasta norte-americano James Mangold derrapa ao incursionar
por uma aventura grotesca
e surrealista em Identidade (Identity; 2003). Como em O
anjo exterminador (1962), do espanhol Luis Buñuel,
um grupo de pessoas não consegue sair de um lugar onde
acontecimentos sinistros perturbam ainda mais esta impossibilidade; à maneira
de Psicose (1960), do inglês Alfred Hitchcock,
o clima claustrofóbico é buscado pela utilização
do cenário desolado dum motel de beira de estrada. Mas
me parece que a verdadeira inspiração de Mangold é uma
realização ianque recente, Cidade dos sonhos (2001),
de David Lynch; como na obra-prima de Lynch, há personagens
que são mais de uma personagem, há em cena um diretor,
há uma atriz, há um estranho acidente de carro,
há muita nebulosidade cujo sentido escapa não somente
ao espectador mas ainda à própria montagem do filme,
obscura e mal feita. O excesso de pretensão do realizador
materializar-se-á também quando sua câmara
se detiver sobre um exemplar de O ser e o nada (1943),
obra de filosofia de Jean Paul Sartre –que vem fazer este
monumento sartreano, colocado no carro ao lado da personagem
de John Cusack,
entre estas criaturas sem profundidade que Mangold foi buscar
não sei onde? Buñuel, Hitchcock, Lynch, Sartre – é muito
peso para os ombros frágeis de Mangold.
Chove
o tempo inteiro ao longo da narrativa de Identidade. Ao tratar
dos aspectos oníricos que levam as pessoas a serem
mais de uma personalidade, Mangold foi além do que seu
braço de montagem permitiria. Para realizar uma investigação
cinematográfica que buscava a complexidade, faltou ao
cineasta de Identidade aquele prodígio formal do francês
Alain Resnais, que em Meu tio da América (1980), recentemente
revisto na “Mostra Grandes Nomes do Cinema Francês”,
revela sua extraordinária habilidade para montar a complexidade
em cinema.
Por Eron Fagundes
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