06
de outubro de
2003
AS
ESCOLAS E MOVIMENTOS CINEMATOGRÁFICOS - 2
A Censura
No
sistema americano não existe, nem nunca existiu um
sistema de censura federal. No caso, cada Estado poderia impor
sua própria censura, o que provocou enorme confusão.
Por isso, os estúdios preferiram se organizar e instituir
um sistema de auto-censura, que persiste com algumas mudanças
até hoje. Acreditam que é melhor se auto-censurarem
do que permitir que estranhos cortem os filmes sem qualquer critério.
Nos primeiros tempos do cinema, havia maior liberdade, principalmente
até os primeiros anos da década de trinta. Coincidiu
que aconteceram em Hollywood alguns escândalos famosos,
que tiveram muita repercussão. Principalmente, o envolvendo
o comediante gordo, Fatty Arbuckle (Chico Bóia), que foi
acusado pelo assassinato de uma garota com quem teria tido relação
sexual (foi inocentado, mas a sua carreira foi arruinada). Isso
aconteceu em 1921 e provocou a criação do chamado
Hays Office (o nome vem de seu diretor Will Hays), que publicou
o seu código apenas nos anos trinta, em parte, porque
Mae West estava fazendo filmes muito ousados, com frases de duplo
sentido e muita malícia. Pressionados pela Legião
de Decência dos Católicos, eles passaram a supervisionar
os roteiros e as filmagens, procurando cenas e detalhes dignos
de objeção. Tudo era proibido: nudez, sugestão
de nudez, palavrões, xingamentos, adultério, etc.
O crime sempre tinha que ser castigado (daí a moral "crime
não compensa"/"crime doesn't pay") e o
final feliz (happy-end) deveria ser moralista. Também
proibiam as camas de casal, mesmo para personagens casados na
vida real. Por isso, surgiram as camas individuais no mesmo quarto,
e mesmo assim, o casal só podia se tocar se o pé de
um deles estivesse firme no chão.
Esse
código vigorou até meados dos anos cinqüenta
e a surpresa é encontrar tantos filmes que conseguiram
burlar a vigilância. Houve a famosa briga do produtor David
Selznick pelo final de "E o Vento Levou",
quando Clark Gable usa a palavra "damn" (maldito, que
em inglês,
seria um xingamento anti-religioso) quando diz que "I couldn't
give a damn" (literalmente, "Não estou dando
a mínima", em português corrente). Mas, foi
uma exceção. Os censores não viram sugestões
do proibido homossexualismo em fitas como "O Proscrito" e "Gilda".
Conclusão: apesar da censura rigorosa, a pior que o mundo
já teve, Hollywood conseguiu ter a sua melhor fase e o
seu melhor momento, conhecido como a Idade de Ouro.
As
barreiras da censura começaram a cair a partir dos
anos cinqüenta, diante da concorrência da televisão
e da necessidade de voltar a atrair o público para as
salas. O diretor Otto Preminger foi o pioneiro, lançando
filmes sem o selo de aprovação do código,
usando a proibida palavra "Virgem" em "Ingênua
até Certo Ponto" ("The Moon is Blue",
53) e falando em viciados em drogas, em "O Homem
do Braço
de Ouro" ("The Man With the Golden Arm",
56). Nos anos 60, o código foi forçado a se modificar
e, em 68, foi criado um novo sistema de classificação.
Os estúdios apresentavam os filmes para serem classificados
por uma comissão, que não tinha o poder de cortar
ou proibir a sua exibição. Se o estúdio
ou cineasta preferir lançar o filme sem a classificação
(como aconteceu com "Showgirls", de
Paul Verhoeven, em 95, e "Happiness" de
Todd Solondz, em 98), teve problemas para conseguir salas e para
colocar anúncios do filme
nos jornais mais conservadores. Hoje em dia, está em vigor
a classificação.
NC-17
- Proibido para menores de 17 anos (substituiu o antigo X, que
passou a ser usado também para filmes pornográficos).
R
(Restricted) - Não é permitida a entrada de
menores a não ser acompanhados pelos pais. O filme terá cenas
fortes de violência, sexo, ou os dois. Temática
adulta (na classificação, eles especificam e os
jornais americanos publicam).
PG-13
- Não é permitida a entrada de menores de
13 anos sem os pais ou responsáveis. Foi criado para o
filme "Indiana Jones e o Templo da Perdição",
em 84, para fitas que têm alguma violência, não
recomendadas para crianças pequenas.
PG
(Parental Guidance) - O filme pode ter algo que pode assustar
ou ofender crianças.
Sugerem que os pais orientem a escolha do filho.
G
- Para o público em geral. Sem restrições.
Mas os diretores, em geral, colocam algum palavrãozinho
para o filme não ficar marcado como coisa de criança
e ganhar o PG.
No
Brasil, sempre houve uma censura governamental muito rigorosa,
que terminou com a queda do governo militar.
Durante a ditadura
de Getúlio Vargas, houve o controle dos filmes estrangeiros
que pudessem inspirar idéias contra o governo. Fazendo
a classificação por idade, a censura ficou mais
rigorosa durante o governo militar, que para evitar repercussão
internacional, não proibia o filme oficialmente (os filmes
eram enviados extra-oficialmente para Brasília e a censura
opinava sobre sua possível liberação). Haviam
cortes e proibições, de tal forma que uma fita
como "Z", de Costa Gavras, ficou proibida aqui mais
tempo do que na própria Grécia (a fita de 69, denunciava
a ditadura grega que nesse meio tempo caiu). Ainda assim, a censura
e o governo permitiram a existência da chamada pornochanchada,
comédias com erotismo e nada pornográficas, certamente,
achando que eram boas para manter o equilíbrio social.
Aos poucos, o cinema realmente explícito foi surgindo
nas telas, por causa de mandados de segurança, emitidos
por juizes corruptos. À partir do fim dos anos 70, surgiram
os filmes que ficaram ilhados em cinemas dos centros das cidades.
Mas a censura só foi abolida oficialmente com o governo
de José Sarney e a nova Constituição.
Realismo
Poético Francês
A
França manteve e mantém até hoje, com
altos e baixos, a maior indústria cinematográfica
da Europa, fazendo filmes comerciais e criando estrelas de renome
internacional (que ocasionalmente, também faziam filmes
em Hollywood, como Maurice Chevalier, Charles Boyer, Danielle
Daffieux, Michele Morgan, Jean Gabin etc.). A vitória
do chamado Front Popular (Frente das Esquerdas Comunistas) despertou
a esperança de mudanças sociais e permitiu a criação
de alguns filmes. Mas o chamado realismo poético, aconteceu
basicamente nos anos trinta, com fitas policiais, caracterizadas
por finais trágicos e histórias muito românticas.
Os ares pessimistas refletiam, de certo modo, o espírito
francês, que no começo da Segunda Guerra, foi derrotado
pelos nazistas e teve seu território ocupado, inclusive
Paris e a indústria do cinema. Os cineastas mais marcantes
dessa escola eram o diretor Marcel Carné, junto com o
roteirista e poeta Jacques Prevért, em fitas como "Cais
das Sombras", "Trágico Amanhecer" e "Hotel
do Norte", sempre com Jean Gabin. Mesmo durante
a ocupação,
continuaram fazendo filmes, mais alegóricos para disfarçar
a censura, como "Os Visitantes da Noite" e "O
Boulevard do Crime" (lançado em DVD no Brasil),
considerado o melhor filme francês
de todos os tempos (votado pelos próprios membros da indústria
do cinema francês). Paralelamente à Carné,
também faziam filmes memoráveis na época,
Julien Duvivier, Jean Renoir, filho do pintor (o anti-bélico "A
Grande Ilusão" -lançado em DVD no
Brasil- e "A Regra do
Jogo") - os
dois tiveram que se refugiar nos EUA durante a Guerra - e Jean
Vigo.
O
Esforço de Guerra
Hollywood
e praticamente toda a América do Norte, lutaram
para se manter neutros durante a Segunda Guerra Mundial. Os mais
lúcidos, como o presidente Roosevelt e os estúdios
da Warner, perceberam que Hitler era um louco que queria dominar
o mundo e, portanto, a guerra era inevitável. Mas os estúdios
não queriam perder seus mercados na Europa e na Alemanha
(Hitler era um grande fã do cinema americano) e adiaram
o máximo possível a denúncia aos desmandos
do ditador e à perseguição dos judeus (embora
a existência de campos de concentração e
extermínio só tivesse sido descoberta após
o fim da Guerra). Os que ousavam falar mal eram perseguidos e
acusados de comunistas (ainda mais quando o ditador soviético
Stalin fez um estranho pacto de não agressão com
Hitler, confundindo mais as coisas). Charles
Chaplin criou tantos
inimigos, que nos anos cinqüenta, deixou o país acusado
de indesejável. Esse isolacionismo absurdo, mas bem típico
dos americanos, mudou inteiramente quando os japoneses, aliados
dos nazistas no chamado Eixo, atacaram covardemente a base americana
de Pearl Harbor, no Havaí. Desde esse dia, a América
e toda a indústria do cinema se dedicaram inteiramente
ao chamado "Esforço de Guerra".
Nunca
se viu nada igual, nem antes e nem depois. Todos colaboraram
de alguma
maneira, alguns perderam a vida. Carole Lombard, estrela e mulher
de Clark Gable, morreu num desastre de aviação
em 42, depois de ter ido vender bônus de guerra (bônus
era uma espécie de papel do governo que custeava a luta
armada). Leslie Howard, o astro inglês de "E
o Vento Levou", morreu quando os nazistas atacaram o seu avião,
achando que o Primeiro Ministro inglês, Winston Churchill,
estava à bordo. Todos os atores mais famosos serviram
as Forças Armadas e alguns se tranformaram em verdadeiros
heróis, como James Stewart, que se tornou General da Força
Aérea. Todos os estúdios mandavam filmes para serem
vistos pelos soldados, mesmo antes deles passarem nas salas americanas.
Enquanto em Los Angeles, se organizava a Cantina de Hollywood
(Hollywood Canteen), dirigida por Bette Davis, onde os soldados
eram servidos e entretidos por astros e estrelas. Alguns deles,
como Bob Hope e Marlene Dietrich, negligenciaram as suas carreiras
e enfrentaram perigos reais no front de guerra para divertir
os soldados. Nesta época, eram produzidos filmes de dois
tipos: os de pura diversão (em geral, comédias
ou musicais para esquecer os problemas) e os de propaganda. Como
não havia televisão, era através dos cinejornais
semanais que o público do mundo inteiro ficava sabendo
do andamento da guerra. Serviram como diretores e fotógrafos,
os cineastas mais importantes de Hollywood, como Frank Capra,
John Ford, Alfred Hitchcock, William Wyler e John Huston (todos
fizeram documentários memoráveis sobre a Guerra, às
vezes com risco pessoal).
Como
os mercados europeus e asiáticos estavam fechados
aos filmes americanos, o jeito foi aumentar o contato com a América
Latina, através da chamada Política de Boa Vizinhança,
que privilegiou os ritmos e atores latinos.
Foi
assim, que a maior estrela brasileira, Carmen Miranda (1913-1955),
ainda que nascida em Portugal, foi parar em Hollywood e se tornou
estrela dos estúdios da Fox, criando um tipo especial
e muito particular, que a consagrou como Brazilian Bombshell
(a Bomba Brasileira). Falando rápido, muito divertida
e usando roupas extravagantes, Carmen dominou durante o período,
cantando e representando, fez imenso sucesso e apenas a morte
prematura prejudicou a sua carreira. Carmen foi a maior das latinas,
mas foi aberto espaço também para outras coisas
brasileiras, inclusive por Walt Disney, que criou personagens
brasileiros, como o Zé Carioca, para poder sobreviver à crise
(devido à falta do mercado exterior).
Também na guerra nasceu o conceito de pin-up, as fotos
de garotas colocadas nas paredes ou armários, em geral,
com um alfinete (um pin). Os estúdios forneciam as fotos
das favoritas dos pracinhas, como Betty Grable (dona das pernas
mais bonitas), Rita Hayworth (a deusa do sexo), Dorothy Lamour
(do sarong), Veronica Lake (cabelo caído na testa), Lana
Turner, Paulette Goddard (o sweater)e Ann Sheridan (a Oomph Girl,
o termo é onomatopaico e não tem maior sentido).
Nas
telas, os astros que não puderam combater por razões
de saúde, venciam a guerra nos filmes (como John Wayne
e Errol Flynn, numa época onde havia escassez de bons
atores). A realidade do conflito, porém, custaria a ser
mostrada. Nem mesmo Spielberg, em "O Resgate do
Soldado Ryan", em 98, conseguiu fugir de clichês sentimentais,
embora tenha sido o primeiro a mostrar com mais realismo, como
foi realmente um combate contra o fogo inimigo.
Neo-Realismo
Durante
a Segunda Guerra, o cinema europeu teve grandes dificuldades
para sobreviver. O país que se saiu melhor neste aspecto
foi a Itália. Embora a sua tradição cinematográfica
fosse apenas de filmes românticos, super espetáculos
de gladiadores (como Cabiria) e comédias românticas
de telefones brancos, tinha também uma forte tradição
de humor popular, sustentado pelo teatro revista musicado (onde
surgiram as novas estrelas, como Anna Magnani e Aldo Fabrizzi).
O governo fascista fez muito pelo cinema, criando um grande estúdio
nos arrabaldes de Roma (a famosa Cinecittá), assim como
melhorou a sua infra-estrutura, incluindo escolas de cinema e
técnicos. Com uma série de diretores experimentados
e de qualidade, como Alessandro Blasetti e Mario Camerini, o
cinema italiano descobriu o segredo de rodar em exteriores, naquilo
que acabou sendo chamado de Neo-Realismo.
Usava-se
o termo realista em contrapartida à artificialidade
dos estúdios americanos, que rodavam tudo em estúdio:
das ruas de Paris aos palácios ingleses. Mas, até eles
foram obrigados a dar o braço a torcer diante do sucesso
dos italianos. O precursor do Neo-Realismo foi um nobre comunista,
de formação teatral, chamado Luchino Visconti,
que filmou a saga dos pescadores, "La Terra Trema" (47),
com atores amadores e em cenários autênticos. Antes
disso, uma versão italiana não autorizada de "The
Postman Always Rings Twice", de James Cain, e "Obsessão (42)", já prefiguravam as lições
da escola.
Os
italianos tentaram usar a falta de recursos como linguagem.
Usavam filme vencido (porque não tinham outro); rodavam
com amadores, porque não tinham dinheiro para pagar profissionais
e nem para pagar estúdios (em Cinecittá, estavam
os refugiados). Na linha de frente, estava Roberto Rossellini,
que tinha um passado meio comprometedor (co-dirigiu um filme
com o filho do ditador fascista Mussolini), influenciado por
Fellini (co-roteirista) e, principalmente, por Sérgio
Amidei, o escritor fez "Roma, Cidade Aberta" (45),
estrelado por sua mulher Magnani (um monstro sagrado, que passou
a ser a maior estrela do cinema italiano) e inspirado em fatos
reais.
A
regra da escola era de filmar com o mínimo de fricotes,
captando a realidade como de fato era, fazendo denúncia
social (o partido comunista italiano tinha grande influência),
rodando o mínimo possível (em parte por falta de
dinheiro) e mostrando as coisas como realmente eram, mesmo que
feias. "Roma", por exemplo, narrou um massacre de religiosos
e civis nas mãos dos nazistas. Serviu de ponto de partida
para outras experiências semelhantes do diretor. Curiosamente,
os filmes neo-realistas foram mal acolhidos pela crítica
e público na própria Itália. Mas tiveram
enorme impacto no exterior, onde Rossellini foi considerado gênio,
provocando uma paixão na estrela sueca de Hollywood, Ingrid
Bergman (que engravidou dele, enquanto rodavam juntos Stromboli,
e ainda era casada com outro. Um escândalo tão grande
que provocou a expulsão - em termos - de Ingrid do cinema
americano durante mais de uma década). Rosselini fez outros
filmes na escola, mas foi sempre super valorizado pela crítica.
Melhor
que Rossellini era um outro diretor italiano, Vittorio De Sica.
Ator e galã de muitos filmes, dirigia fitas mais
leves, quando resolveu fazer com roteiro do seu parceiro Cesare
Zavattini, "O Ladrão de Bicicletas" (48): a
história de um homem, pregador de cartazes de cinema nas
ruas, que tem seu instrumento de trabalho (bicicleta) roubado
e, junto com o filho, sai pelas ruas de Roma tentando encontrá-lo.
De
Sica tinha coração, era um poeta e demonstrou
isso em seus filmes posteriores, escapando para a fantasia (Milagre
em Milão) e até para o sentimentalismo (exceto
quando mostrou o triste destino de um velho, em Umberto
D). O
que o
prejudicou perante à crítica, foi ter se tornado
novamente um ator muito popular (juntamente, com Gina Lollobrigida,
na série Pão, Amor e...,)e principalmente, quando
fez parceria com Sophia Loren e Marcello Mastroianni. De Sica
abriu caminho para uma outra vertente do cinema italiano, criando
a comédia à la italiana, feita com temas sociais,
rindo da própria desgraça, usando atores populares
(como Totó) e analisando a presença italiana na
Guerra (ao contrário dos franceses, que são difíceis
de fazerem auto-análise, os italianos são mestres
em se auto-criticar e parodiar). Esse tipo de comédia
se tornou muito popular em torno de vários astros, principalmente
Mastroianni, Vittorio Gassman, Alberto Sordi, Ugo Tognazzi e
Nino Manfredi.
Também
na Itália, nos anos 60, surgiu um tipo de
produção popular de fitas de ação,
uma espécie de Hollywood de expatriados no Tibre. Faziam
fitas épicas de halterofilistas (com o americano Steve
Reeves e imitadores), faroestes spaghetti (os melhores deles
com Clint Eastwood, música de Ennio Morriconi e direção
de Sergio Leone), policiais, suspenses, dramas sobre a Máfia,
filmes eróticos, pornochanchadas etc..
O
Neo-Realismo também permitiu o sucesso mundial de um
novo tipo de mulher, mais exuberante, mais gordinha e mais de
verdade do que o similar americano.
Novas
estrelas que faziam papéis de catadora de arroz
(Silvana Mangano, que se casou com o produtor Dino de Laurentiis
e tornou-se símbolo de elegância, sob as ordens
de Visconti e Pasolini); de pizzaiola napolitana (Sophia Loren,
casada também com um produtor, que projetou a sua carreira
em âmbito internacional); de bersagliera (Gina Lollobrigida,
a única que teve que dirigir a sua carreira sozinha, com
seios fartos, Lollo, virou sinônimo disso); com presença
espontânea, elas se tornaram mitos e símbolos de
uma era.
Também outros cineastas tiveram a chance de tomar caminhos
paralelos, sejam os mais politizados (Giuseppe De Santis); ou
mais versáteis (Mario Monicelli, Dino Risi, Luigi Zampa
e Luigi Comencini); ou à partir dos anos cinqüenta
(Marco Bellochio, Pasolini. Dois deles tiveram destaque especial:
Visconti, que fez uma brilhante carreira em filmes de época,
bem produzidos, operísticos e requintados; e, Fellini,
que merece um destaque à parte. Ambos demonstram que o
cinema italiano dos anos cinqüenta e sessenta, foi o melhor
do mundo, alcançando um padrão técnico e
artístico inigualável).
Fellini
foi um dos maiores cineastas de todos os tempos, um dos poucos
a criar um universo próprio, que virou adjetivo
- felliniano - poético, autobiográfico e de raízes
populares, fez filmes chaplinianos para sua esposa Giulietta
Masina (a morte de Fellini foi provocada por um câncer.
Logo depois, ela partiu ao seu encontro), comédias satíricas
para Alberto Sordi e descreveu como ninguém o que era
Roma no início dos anos 60, em "A Doce Vida"
(La Dolce Vita - lançado em DVD no Brasil. mas cuidado, há uma
versão tosca que saiu em bancas de jornal que não vale a pena.
Fique com a "Edição para Colecionadores" da Versátil)). Era fantástico
mesmo quando se tornava autobiográfico, narrando e prevendo
sua própria crise criativa (com a obra-prima "Fellini
Oito e Meio"), depois revisitando a sua cidade
natal e a infância, de forma estilizada em "Amarcord" -
lançado em DVD - (lembro-me
do dialeto de sua vila natal, Rimini). Misturando atores famosos
- Mastroianni, foi seu alter-ego - com amadores, que ele escolhia
pelo rosto e fazia com que dissessem números, porque dublava
tudo e utilizava a música circense de Nino Rota. Fellini
criou um dos universos imaginários mais ricos deste século.
Esse
esplendoroso universo de cinema acabou sendo destruído
pela televisão, nos anos setenta. Antes, existia na Europa,
em particular na Itália, apenas estações
estatais como a RAI. Quando foram liberadas as TVs particulares,
o público abandonou as salas, como já havia ocorrido
nos EUA, duas décadas antes (não é à toa
que Fellini falava tão mal da TV em seus filmes).
E
o cinema praticamente morreu, só conseguindo fazer algo,
através da co-produção com a TV.
Assim
mesmo, algo escapou. Tinham os herdeiros do Neo-Realismo, como
o ex-roteirista Ettore Scola; os Irmãos Taviani;
o comunista homossexual e católico provocador, Pasolini
(que morreu assassinado). Só nos anos noventa, o cinema
rencontrou o caminho popular, com comediantes como Roberto Benigni
(A Vida é Bela) - lançado em DVD - e
Nanni Moretti (Aprile, Caro
Diário).
Apesar de tudo, os italianos continuam recordistas de Oscars,
tiveram sucesso com o comovente "O Carteiro e o
Poeta" - lançado em DVD -,
do napolitano Massimo Troisi (que morreu do coração
no dia em que terminou o filme) e também fizeram o filme
mais admirado dos anos noventa, "Cinema Paradiso",
de Giuseppe Tornatore, uma carta de amor ao cinema do interior,
das pequenas salas que morriam e das imagens do cinema que ficaram
para sempre em nossa memória.
Por Rubens Ewald Filho
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