Tallulah e a Gravidade

Confira os detalhes de Tallullah, que foi lançado com exclusividade na plataforma Netflix, que também é a responsável pela produção

13/08/2016 00:49 Por Bianca Zasso
Tallulah e a Gravidade

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De acordo com o nosso amigo dicionário Aurélio, gravidade significa a propriedade atrativa exercida pela Terra sobre os corpos. Explicações científicas e linguísticas são importantes, mas a dúvida também é bem-vinda nas nossas descobertas. Além da força feita pelo planeta para nos manter com os pés no chão, o que mais nos prende neste mundo? A filosofia e a literatura possuem boas amostras das substâncias mágicas que nos ajudam a continuar a caminhada. Agora, uma roteirista apresenta a sua receita. A americana Sian Heder dirigiu dois curtas-metragem e faz parte do talentoso time que roteiriza a série Orange is the new black. Seu primeiro longa é fruto de sua experiência prestando serviços de babá em hotéis na juventude.

Tallullah foi lançado com exclusividade na plataforma Netflix, que também é a responsável pela produção, no dia 29 de julho, depois de uma passagem pelo Festival de Sundance. O título é referente ao nome da protagonista, interpretada por Ellen Page, que nas primeiras cenas parece ser mais uma rebelde que vaga pelo mundo pilotando um furgão. O mantra “sem lenço e sem documento” rege sua realidade apenas por alguns minutos de filme. Depois do sumiço do namorado, Nico, sem um tostão no bolso e com o estômago pedindo socorro, Tallulah resolve procurar a mãe do garoto, Margo. Além de dinheiro, ela quer uma despedida, já que o jovem Nico a deixou sem deixar vestígios. Eis que no meio do caminho, numa de suas maratonas invadindo hotéis em busca do que comer, ela encontra Carolyn, uma loira embriagada e insegura que a confunde com a camareira e deixa sua filha bebê, Madison, aos seus cuidados. Tallulah percebe que maternidade não é o forte de Carolyn e resolve assumir o posto de babá. Só que as horas passam, mas a ressaca da mãe de Madison não. É aí que a garota, numa atitude mais instintiva que racional, leva a criança com ela rumo à casa da Margo. A pseudo-sogra de Tallulah está em plena crise. O marido saiu de casa para viver com outro homem, ela não quer assinar os papéis do divórcio, perdeu as esperanças de voltar a ver o filho e seu único “amigo” (uma tartaruga) morreu. Batidas na porta trazem Tallulah com um bebê no colo e a mentira de que aquela menininha é fruto de seu relacionamento com Nico. Nasce uma família.

Ao longo de Tallulah, descobrimos que todos, até os coadjuvantes, tentam manter inteiro a qualquer custo aquilo que definem como razão de suas vidas. Carolyn se desnuda ao falar sobre como esperou que o sentimento maternal aflorasse e acabou frustrada. Margo encara cada manhã como se fosse um peso, procurando respostas para o fim de seu relacionamento. Até Tallulah, que parecia não ser apegada com nada nem ninguém, procura um destino melhor que o seu para Madison, entre uma fralda e outra. Tallulah apresenta muitas técnicas já mostradas por Sian Heder em Orange is the new black, incluindo a parceria com a atriz Uzo Aduba, que faz uma pequena participação. Os flashbacks bem colocados e a humanidade dos personagens são o brilho de Tallulah, proporcionados por atuações sem um pingo de afetação. Junto com Ellen Page, Allison Janney e Tammy Blanchard completam o trio que sustenta a história e não deixa a emoção cair em lágrimas baratas até a chegada dos créditos finais.

O que nos prende? A resposta pode não ser única, ou até nem haja resposta. Tallulah solta ao público algumas delas, incompletas até. A batalha de colocar um bebê sequestrado em um roteiro sem descambar para uma perseguição boba com lição de moral é pesada. Sian Heder foi uma soldada competente e criativa. Assistir Tallulah é deixar por pouco mais de uma hora e meia o nosso mundo e viver um voo sem destino. Mas sem pânico: sempre haverá algo que nos segura perto do solo, para além da gravidade.

Tallulah
Ano: 2016
Direção: Sian Heder
Disponível na plataforma Netflix

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Sobre o Colunista:

Bianca Zasso

Bianca Zasso

Bianca Zasso é jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Durante cinco anos foi figura ativa do projeto Cineclube Unifra. Com diversas publicações, participou da obra Uma história a cada filme (UFSM, vol. 4). Ama cinema desde que se entende por gente, mas foi a partir do final de 2008 que transformou essa paixão em tema de suas pesquisas. Na academia, seu foco é o cinema oriental, com ênfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questões fílmicas e antropológicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands. Como crítica de cinema seu trabalho se expande sobre boa parte da Sétima Arte.

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