Os Hormônios Plenos
Mate-me por Favor (2016), dirigida por Anita Rocha da Silveira, é o que se pode chamar um filme hormonal: respira hormônios, todos os que cabem nos seres humanos
Mate-me por favor (2016), produção carioca dirigida por Anita Rocha da Silveira, é o que se pode chamar um filme hormonal: respira hormônios, todos os que cabem nos seres humanos. E para tanto vale-se exclusivamente das personagens jovens. Entre os jovens, a saliência é das personagens femininas. Temos aí os hormônios da juventude em cena que se expande para a tensão hormonal da própria linguagem cinematográfica, tensa e acalorada desde sua sequência inicial.
A sequência que abre a narrativa dá o tom de suspense mais macabro de toda a atmosfera fílmica. Uma mulher é filmada intensamente em primeiro plano, sozinha na noite, como uma fêmea perdida. Lá pelas tantas, escorrem lágrimas de seus olhos; a câmara, que a seguia, se detém neste plano próximo do rosto angustiado. Depois ela parece estar fugindo no seio da escuridão: em determinado momento o espectador não vê nada na tela senão o escuro. E por fim a vemos cair no terreno, ou talvez alguém a tenha atacado.
Então surge o título do filme, em letras garrafais, e as histórias começam. Ficando estes planos iniciais da garota na escuridão quase como uma epígrafe, um apólogo, uma anotação extradiegética. Basicamente entre meninas se dá o que vem depois. Assustadas todas com crimes em série na Barra da Tijuca, bairro de classes altas do Rio de Janeiro. Lá pelo fim do filme uma garota evoca uma história criminal, clássica e marcante, da sociedade carioca, contada pela mãe desta garota que reconta para as amigas: uma atriz assassinada por seu parceiro de elenco ajudado pela esposa, na vida real, deste parceiro, ali mesmo na Barra da Tijuca ainda em boa parte recoberta pela floresta. O espectador mais antigo e informado reconhece o caso Daniela Perez, do início dos anos 90. Em cena, os nomes das pessoas envolvidas no episódio policial-histórico-telenovelesco não são citados.
Essencialmente carioca em suas entonações e no próprio espírito das criaturas em cena, Mate-me por favor traz um lado subterrâneo e sombrio da cidade do Rio de Janeiro que pode empolgar-nos cinematograficamente. Freneticamente jovem, o filme em momento algum envereda para superficialidades fáceis; é, antes de tudo, uma garrafada no estômago passivo e descansado do observador de cinema.
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro Uma vida nos cinemas, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br