A peça Um fax para Colombo foi escrita em 1992 por Denise Stoklos para meditar sobre os caminhos de nossa América desde que o genovês Cristóvão Colombo, financiado pelo império espanhol, um dos dois países “donos do mundo” no século XVI, desembarcou entre nós. Reapresentado neste junho de 2025 como parte duma trilogia do teatro básico de Denise, o texto revela um poder atual que em momento algum deixa os nervos da encenação e do espectador flácidos; o rigor político e verbal é ritmado pelas formas despojadas e diretas de interpretação de Denise, ainda que tudo soe metafórico (Colombo é metáfora, é, como se diz brechtianamente em certo momento da peça, o indivíduo histórico Colombo é somente uma desculpa para lucubrações além dele, além de Colombo, que é somente um signo ou um símbolo).

Denise senta-se diante do espectador, a uma mesa, o cenário é ela, sua voz, esta mesa, o volume de um livro que ela lê ou simula ler. Fixa, estática mas expelindo emoção pela voz, pelas sinuosidades de seus tons, e também pelos gestos medidos da intérprete. Racional: como um filme do francês Jean-Marie Straub. Rasgadamente latino-americano: como num trecho de filme de Glauber Rocha, citado a certa altura. Nas mãos (no corpo, na voz, no gestual) de Denise a densidade explosiva do texto pulsa, navega, acelera-se, enerva-se, incomoda o observador; isto está longe da digestão habitual do espetáculo, é tão estético quanto político ou é a política que se erige numa estética.

Com Denise, passamos nosso fax “histórico” para Colombo, que talvez não consiga pôr, finalmente, seu ovo de pé. Denise escreveu antes suas reflexões (solitariamente) e depois dirigiu e interpretou a transformação dramatúrgica de suas cerebrais frases porém sanguíneas. Um fax para Colombo é um tiro na direção do conformismo colonizado de nossa América.

(Peça vista no Teatro PRIO, Jockey Clube, Rio de Janeiro, em junho de 2025)

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)