O Processo de Conscientizacao Politica de um Pai

Sabemos: a politica tem como centro do cinema do greco-franc?s Constantin Costa-Gavras.

21/07/2025 02:42 Por Eron Duarte Fagundes
O Processo de Conscientizacao Politica de um Pai

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Sabemos: a política é o centro do cinema do greco-francês Constantin Costa-Gavras. Determina não somente seus assuntos mas a própria linguagem em que estes assuntos se movimentam. Desaparecido, um grande mistério (Missing; 1982), extraído dum livro de denúncia de Thomas Hauser em torno do golpe militar no Chile em 1973, derrubando o governo socialista de Salvador Allende, se insere nesta característica essencial da arte de Gavras, como aquilo que acontece diante das câmaras (a opressão dum registro político) conduz a imagens sombrias e inquietas. Em relação a seus filmes políticos dos anos 60 e 70 (Z, 1969; Estado de sítio, 1972), o realizador operou uma mudança narrativa: já não usa as personagens somente como signos duma ação política mas insere na construção dos seres o melodrama, o sentimento, uma certa interioridade; a dinâmica cinematográfica é levemente outra, embora essencialmente o Gavras antigo dialogue facilmente com o Gavras que podíamos deparar no começo da década de 80.

As relações entre militares e políticos de esquerda pareciam arquétipos a que a sanguinidade de filmar do cineasta dava movimento e energia, em Z. Em Desaparecido as relações são íntimas: o filho que desaparece nos escaninhos da ditadura chilena, o pai que a duras penas tem de descobrir o lado podre de seu país e de seu modo de vida, a nora como consciência narrativa são elementos interiorizados por Gavras, coisa que ele não saberia fazer dez anos antes. Em ambos os filmes, Z e Desaparecido, sua capacidade de filmar é um dado; sem a montagem trêfega de Z, Desaparecido se adensa mais. Desaparecido se punha na linha de filmes de conscientização das décadas de 70 e 80, cada um à sua maneira, como ocorria com Um dia muito especial (1977), do italiano Ettore Scola. A dona de casa do filme de Scola, ao se relacionar com um homossexual, descobre tardiamente que navega nas águas erradas do fascismo. O empresário americano de Desaparecido, ao ter seu filho vitimado pela violência da ditadura de Pinochet, também dá com a realidade inconveniente de que seu bem-estar americano é financiado por golpes de estado que subjugam povos miseráveis. A encenação em imagem de Z termina com a prisão dos militares pelo juiz; quando parece que tudo vai acabar bem, letreiros finais nos dizem da deposição do juiz e da volta dos militares gregos ao poder. Em Desaparecido, o truque se assemelha: as imagens finais mostram o pai vilipendiado ameaçando processar os burocratas americanos coniventes com a situação do Chile e a morte de americanos por lá; este ufanismo do pai se desmancha quando aparecem os letreiros informando que o processo não deu em nada.

Apesar de algumas diferenças de posição cinematográfica, em Desaparecido a amargura é a mesma de antes. Já sem o sarcasmo de antanho: mais um ranger de dentes, melodramático, nervoso. Os vinte e cinco minutos iniciais descrevem a vida e os sobressaltos dum jovem casal no Chile na transição entre o fim de Allende e o começo de Pinochet; logo depois que o jovem desaparece, a mulher empreende buscas infrutíferas e acaba chamando seu sogro, que vem dos Estados Unidos. A partir daí o filme acontece em seu esplendor: o veterano Jack Lemmon e uma jovem Sissy Spacek conduzem o ritmo narrativo articulado pelo engenho de Costa-Gavras.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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