O Rigor Ascetico de Jeferson De

Doutor Gama, um filme frontal e descarnado, usando a objetividade desde o despojamento da reconstituicao de epoca

12/09/2021 01:51 Por Eron Duarte Fagundes
O Rigor Ascetico de Jeferson De

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O escritor, advogado, jornalista e abolicionista Luiz Gama é a personagem sobre a qual se debruça a narrativa do filme Doutor Gama (2021), dirigido por Jeferson De, ele próprio um cineasta negro. A cinebiografia escrita por Luiz Antônio acompanha inicialmente os traumas de infância de sua personagem, filho duma africana livre e dum fidalgo (branco) português; entre seus infortúnios, o menino Gama foi vendido aos 10 anos como escravo para quitar dívidas de seu pai. Sem complacência e sem concessões de nenhuma espécie, Doutor Gama traça o desenvolvimento moral e intelectual de Luiz Gama, a despeito das coisas que lhe aconteceram e do tempo em que viveu. A primeira cena é o discurso de Gama adulto, na defesa dum jovem negro que matara seu senhor branco porque este abusava da esposa do rapaz negro e a seviciara; esta cena é depois inserida na diegese narrativa nas sequências de tribunal.

Doutor Gama é um filme frontal e descarnado, usando a objetividade desde o despojamento da reconstituição de época. Sua visão da realidade (histórica e social) do negro brasileiro diverge bastante do que, por exemplo, fez Carlos Diegues. Não há aqui a descontração brincalhona de Xica da Silva (1976). Nem ainda a aridez histórica de Ganga Zumba (1964). Nem mesmo o transbordamento de encenação de Quilombo (1984). O que vemos em Doutor Gama é uma outra coisa: um processo quase bressoniano de filmar, Luiz Gama é um pouco como a Joana d’Arc de Robert Bresson.

Pode-se pensar no filme americano O sol é para todos (1962), de Robert Mulligan, para comparar. No filme de Mulligan não há o tempo da escravidão, mas sim o do ambiente racista que é herança ou etnia do mundo dos escravos; mas ali também um advogado (branco no filme de Mulligan) que se compromete em seu meio ao defender um jovem negro acusado de atacar e violentar uma jovem branca. No entanto, há uma considerável distância entre as desconversações dum filme de Hollywood sobre questões sociais e a autenticidade de registro do filme brasileiro.

Pode-se dizer que Doutor Gama é uma obra extremamente necessária no seio cultural brasileiro.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@vdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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