RESENHA: Instinto Materno
Um filme romeno que, segundo Rubens Ewald Filho, poderia ser bem melhor se a protagonista fosse Fernanda Montenegro
Instinto Materno (Pozitia Copilului/Child´s Pose) Romênia, 2013, de Calin Peter Netzer. Com Luminita Gheorghiu, Bogdan Dumitrache, Natasa Raab, Ilinca Goia, Florin Zamfirescu.
Acho que chegou o momento de eu encarar uma realidade. Eu não tenho maior afinidade com o cinema da Romênia e não consegui me envolver com nenhum deles que em determinado momento teve repercussão em Cannes e passaram por aqui. Chegaram a prever uma retoma de produção, com novos cineastas, mas isso não sucedeu. Este aqui ganhou o Leão de Ouro em Berlim assim como prêmio da crítica. Mas não ficou nos finalistas dos Oscar® de língua estrangeira (mas erram tanto que não isso não significa muito). Não conheço o diretor que fez dois filmes antes (Maria e Medalha de Honra, inéditos aqui). Não gosto também da interpretação nem da figura da atriz principal Luminita Gheorghiu que tem 34 créditos em sua carreira incluindo o pioneiro 4 Meses, 3 Semanas, 2 Dias (07) e outro que passou meio em branco mas os americanos admiram, A Morte do Sr. Lazarescu (05). Foi por este que ganhou o prêmio dos críticos de Los Angeles.
Quem teve uma mãe dominadora vai reconhecer a figura desta megera, mas como está na moda atualmente, nenhuma explicação psicológica é dada. O diretor limita-se a seguir os personagens, ou persegui-los melhor dizendo, deixando as conclusões para o espectador. Como o que não falta no cinema são super mães (Joan Crawford é uma que me vem a cabeça uma monstra na vida e na ela, Mamãezinha Querida que o diga!) esta Cornelia é uma senhora cinquenta e tantos anos bem sucedida na sociedade de Bucarest, que briga muito porque esta afastada de seu filho Barbu, pelo que ela culpa a namorada dele. Arquiteta bem de vida, ela vem socorrê-lo quando é preso ao atropelar e matar uma criança pobre e camponesa, acusado de dirigir embriagado. Envolta em peles ela tenta intervir. Fica claro o contraste entre os ricos e bem de vida e a família da criança pobre e humilde, que precisa ser subornada. Como se não falassem a mesma língua.
Não é uma historia nova (não me lembro porém de algo parecido no cinema). Ao contrario, já aconteceu com pessoas próximas ou distantes. É um retrato miserável do que o poderio econômico manipula qualquer igualdade mesmo em país dito socialista. Cornelia está convencida que o filho é inocente e tudo demonstra o contrario, ela vive elogiando ele, seus feitos esportivos. Sempre fumando, sempre querendo passar por elegante (na verdade patética), é um grande personagem feminino que Fernanda Montenegro faria magnificamente lhe acrescentando uma humanidade, uma fragilidade detrás da pose que eu não consegui perceber aqui. Ela é o tempo todo desagradável e mesmo repulsiva. Talvez se tivesse lampejos de humanidade resultasse melhor. O mais próximo disso é a cena em que ela ouve calada os detalhes da vida sexual da namorada e o filho.
Escrito pelo mesmo que fez a Morte do Lazarescu, percebo agora que o filme ao me irritar, conseguiu o seu propósito. E essa mãe me deixou aterrorizado. Sim, elas existem. Continuam a existir.
Sobre o Colunista:
Rubens Ewald Filho
Rubens Ewald Filho é jornalista formado pela Universidade Católica de Santos (UniSantos), além de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados críticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veículos comunicação do país, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de São Paulo, além de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a década de 1980). Seus guias impressos anuais são tidos como a melhor referência em língua portuguesa sobre a sétima arte. Rubens já assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e é sempre requisitado para falar dos indicados na época da premiação do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fãs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleção particular dos filmes em que ela participou. Fez participações em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minisséries, incluindo as duas adaptações de Éramos Seis de Maria José Dupré. Ainda criança, começou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, além do título, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informações. Rubens considera seu trabalho mais importante o Dicionário de Cineastas, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o único de seu gênero no Brasil.