Uma Cronica de Sombras e Estranhezas
Em Avenida Beira-Mar a coisa parece mais secreta, mais subterranea


Avenida Beira-Mar (2024), dirigido a quatro mãos por Maju de Paiva e Bernardo Florim, é uma narrativa cinematográfica que não se entrega facilmente ao observador. É esquivo e estranho; sua estranheza de filmar não é a mesma de O clube das mulheres de negócios (2024), de Anna Muylaert, onde a simbologia social e política assume uma ponte ostensiva; em Avenida Beira-Mar a coisa parece mais secreta, mais subterrânea. Surge a discussão do gênero na pele dum menino-menina que transita facilmente entre o feminino (inicial) e o masculino (revelado) para criar um outro paradigma ou conceito; mas tudo é feito com lentidão, cronisticamente e sem os arroubos da Muylaert e seu afinado elenco. Em Avenida Beira-Mar, mesmo aquela que seria uma interpretação de transbordar, a veterana Andréa Beltrão, se identifica com o desglamurizado suburbano dos outros intérpretes, cujo amadorismo é utilizado no extremo pelos diretores.
A história passa-se numa praia de Niterói. Rebecca, uma menina negra de 13 anos, vive com sua mãe branca; o equilíbrio entre a experiência da Beltrão e a naturalidade da adolescente Milena Pinheiro é obtido nos cruzamentos de imagens da realização. Em certo dia, Rebecca encontra uma amiga, Mika, que logo se revela uma garota trans, quando Rebecca a visita (ou o visita, em família a figura é João Pedro, não Mika); a amizade cresce, desenvolve-se, cria um liame entre a menina e a menina-menino, entre uma jovem negra que convive com sua estranha mãe-branca e uma jovem branca internada em seus demônios familiares.
Belo, soturno, namorando o perigo das situações, é um tento do cinema brasileiro para se prestar atenção.
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)


Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro Uma vida nos cinemas, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

relacionados
últimas matérias




