Na Pele

Um erotismo poético paira no ar desde a primeira cena de O Livro de Cabeceira, de Peter Greenaway

31/10/2016 21:48 Por Bianca Zasso
Na Pele

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O Livro de Cabeceira (The Pillow Book)
Ano:
1996
Direção:
Peter Greenaway

Há quem diga que tatuagem é um fetiche e que essa coisa de marcar a pele vai além da arte: é também uma forma de sedução. Certas coisas são tão fortes, tão importantes em nossas vidas que não há outro jeito de tê-las sempre por perto a não ser usando tinta e agulha. Essa é uma boa definição para o belíssimo filme O Livro de Cabeceira, do diretor Peter Greenaway. Quem conhece o trabalho do cineasta nascido no País de Gales mas criado em Londres, sabe que seus filmes não são facilmente digeríveis para o grande público. Até quem é fã precisa de umas duas ou três sessões para entender determinadas nuances propostas por ele em cenas e diálogos. Porém, O Livro de Cabeceira é considerado um de seus filmes mais acessíveis e tem uma forte influência da linguagem televisiva moderna. Em alguns momentos, tela se divide em várias, de tamanhos diferentes, mostrando ações de vários personagens ou então quando ganha ares de videoclipe, como na cena da overdose do personagem Jerome, vivido por um jovem e ainda desconhecido Ewan McGregor, um ano antes de conquistar as telas com o ótimo Transpotting, de Danny Boyle.

O longa é, de início, a história de uma relação intensa entre um caligrafista e sua filha Nagito, que ganha em cada aniversário uma mensagem escrita em seu rosto e nuca. Um momento íntimo recheado de tradições. Mas, ao longo da trama, Nagito cresce e busca em seus amantes o prazer através da tinta na pele e das formas da bela caligrafia japonesa. O que parecia ser apenas uma fantasia torna-se algo incontrolável, levando Nagito a buscar novos amantes, novas letras, novos corpos para suas histórias.

Mesmo privilegiando a linguagem visual moderna, Greenaway foi muito original ao acrescentar características típicas do cinema oriental, que possui simbolismos bem diferentes dos nossos. Um erotismo poético paira no ar desde a primeira cena de O livro de cabeceira, graças à autora do livro que deu origem ao filme, a cortesã Sei Shonagon, que criou a mais de mil anos as histórias eróticas que rondam a vida de Nagito.

Uma mulher escrevendo histórias em corpos masculinos. A pele como papel para explorar e dividir desejos. Coisas que só Peter Greenaway conseguiria traduzir na grande tela.

 

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Sobre o Colunista:

Bianca Zasso

Bianca Zasso

Bianca Zasso é jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Durante cinco anos foi figura ativa do projeto Cineclube Unifra. Com diversas publicações, participou da obra Uma história a cada filme (UFSM, vol. 4). Ama cinema desde que se entende por gente, mas foi a partir do final de 2008 que transformou essa paixão em tema de suas pesquisas. Na academia, seu foco é o cinema oriental, com ênfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questões fílmicas e antropológicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands. Como crítica de cinema seu trabalho se expande sobre boa parte da Sétima Arte.

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