A Beleza e o Rigor Formal, e a Emocao Subterranea
Por qualquer angulo que se pense, Ainda Estou Aqui esta entre os mais bem sucedidos filmes de Walter
Imagem: Divulga??o/Internet
Esqueçamos (ou tentemos, ao menos) os elementos acessórios à questão artística, como premiações, Oscar e aplausos duradouros em festivais internacionais. O que o cineasta brasileiro Walter Salles faz no multicomentado filme Ainda estou aqui (2024) é um grande esforço de rigor formal para chegar à beleza plástica e com ela buscar a emoção subterrânea em torno de seu tema. Extraído dum livro autobiográfico de Marcelo Rubens Paiva, o roteiro de Murilo Hauser e Heitor Lorega acompanha o desaparecimento, nas dependências do DOI-CODI, do político e ativista Rubens Paiva, no começo da década de 70, o governo Médici, o mais sanguinário período da ditadura militar brasileira; Rubens e sua esposa Eunice pertenciam à classe média e viviam com seus filhos no Rio de Janeiro, eram um menino (justamente Marcelo, o que eternizaria a vida familiar em livro) e quatro garotas; Salles descreve com grande senso cinematográfico os modos familiares e da juventude da época, em danças, cenários e visões de mundo, até o instante em que se dá a ruptura, Paiva é retirado à força de sua casa, torturado, morto e seu corpo desaparecido para sempre, ao mesmo tempo em que sua família é tomada como refém ou prisioneira do regime autoritário na própria casa em que as pessoas viviam.
A direção de atores de Walter é algo tão notável quanto seu engenho de montar e cruzar as imagens para contar uma história. Todo o elenco está afinado com o modelo de encenação. As Fernandas, claro, se destacam. Fernanda Torres, no papel da viúva de Paiva, está extraordinária. Mas a interpretação muda e breve de Fernanda Montenegro, vivendo Eunice na extrema velhice, numa cadeira de rodas, já tomada pelo Alzheimer, deslumbra e a põe definitivamente como a intérprete de exceção dentro do cinema brasileiro; um assombro.
Por qualquer ângulo que se pense, Ainda estou aqui está entre os mais bem sucedidos filmes de Walter, juntamente com Terra estrangeira (1995) e Central do Brasil (1998).
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro Uma vida nos cinemas, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br