O Instante Mgico de Minnelli

Um dos filmes em que a especfica sensibilidade cinematogrfica de Vicente Minnelli transborda Agora Seremos Felizes

07/03/2016 09:55 Por Eron Duarte Fagundes
O Instante Mágico de Minnelli

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O norte-americano Vincente Minnelli teve no sangue, em seus pontos mais altos, os cruzamentos mágicos do cinema, aqueles momentos em que a densidade da poesia da imagem supera qualquer racionalidade que o espectador queira impor ao comportamento da câmara. Um dos filmes em que a específica sensibilidade cinematográfica de Minnelli transborda é Agora seremos felizes (Meet me in St. Loius; 1944); é claro que o observador deste alvorecer do século XXI, brutalizado pelas formas de ver e pensar que hoje em dia poluem o cérebro, poderá ter alguma dificuldade em captar o sensível de Minnelli, marcado por alguma ingenuidade romântica e por uma insistente simploriedade das relações entre as personagens; mas é inegável que o realizador tem o dom do cinema, aquela peculiar energia para filmar um baile em suas variegadas evoluções, montar cenários refinadíssimos em suas evocações dos estados de espírito das criaturas narrativas e articular um cinema pictórico-poético em que um certo barroquismo contracena com sugestões impressionistas. Um pintor e um poeta do cinema: eis Minnelli. Talvez a cena mais exemplar deste processo fílmico topado na figura de Minnelli seja aquela em que Esther e o vizinho a quem ela ama percorrem a casa desligando as luzes; o escurecimento das cenas pelos gestos das personagens e a própria particular reconstituição de época conferem ao trecho um jogo visual que empurra a relação fílmica para uma espécie de caverna de símbolos onde a magia essencial do cinema se instala como poucas vezes se viu na sétima arte.

O roteiro acompanhado pela lente de Minnelli não deixa de ser simplório. Uma novelinha quase radiofônica, para nos situarmos na época. Um chefe de família, no início do século XX, recebe a oferta de sua empresa para uma atividade mais bem remunerada em Nova Iorque. A mudança de todos para a grande cidade traria transtornos gerais, pois cada um estava acostumado com sua peculiar vida na província em expansão. Especialmente transtornos sentimentais para as garotas. Esther teria de abandonar seu amado vizinho. Não é bem novelesco o entrecho? E, mais ainda, um final hollywoodiano, Minnelli faz o patriarca voltar atrás e as coisas se conciliam. No entanto, o romantismo ilusório de Minnelli (que é forte) de maneira alguma guarda identidade com o conformismo de sempre em Hollywood. É, acima de tudo, uma ação paternal: é Minnelli o mais dickensiano dos realizadores cinematográficos.

Demais, Agora seremos felizes traz o primeiro passo da união da atriz Judy Garland com Minnelli, que logo se casariam. A efusividade do visual narrativo do filme traz um pouco da situação de romance em estado de lua-de-mel, como o que deveria haver entre Judy e Vincente. É algo como aquela expansão alegre de imagens que havia em Uma mulher é uma mulher (1961), ponto inicial do casamento (humano e cinematográfico) entre Jean-Luc Godard e Anna Karina. São dois polos de filmar diferentes, Minnelli e Godard, mas a alacridade da imagem pode unir estas obras distantes em algum momento.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a dcada de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicaes de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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