A Trilha do Manaco
Quem cinfilo sabe que alguns filmes necessitam de algumas lembranas para serem melhor analisados. o caso de O Manaco
O Maníaco (Maniac)
Ano: 1980
Direção: William Lustig
Disponível em DVD no box Serial Killers, da Obras-Primas do Cinema
Esta colunista bem que tentou fazer um texto que estivesse mais próxima da crítica e bem longe da confissão. Mas quem é cinéfilo sabe que alguns filmes necessitam de algumas lembranças para serem melhor analisados. É o caso de O maníaco, filme dirigido por William Lustig e presente no ótimo box Serial Killers, lançado pela distribuidora Obras-Primas do Cinema no mês de agosto. Lançado em 1980, o filme veio parar pela primeira vez nas mãos desta que vos escreve em uma edição em VHS bem surrada. Os anos 90 estavam chegando ao fim e a minha adolescência só começava, em paralelo com a minha paixão pelos filmes de terror. A primeira sessão de O maníaco foi impactante, mas nada como o sábio senhor tempo para fazer as coisas melhorarem. No meu caso, a audição parece ter ficado mais apurada e se tornado responsável pelo aumento dos meus arrepios durante a uma hora e meia de filme.
A trilha sonora de O maníaco, composta por Jay Chattaway, parece um corpo estranho dentro da trama quando soam os primeiros acordes. Piano, cordas, sinos e uma delicadeza que poderia muito bem ser encaixada num conto de fadas. Só que nosso protagonista, por mais que tenha criado um mundo próprio, não tem nada de delicado e sonhador. Frank Zito, interpretado por Joe Spinell, que também criou o argumento do longa, vive num quarto cheio de manequins ensanguentados e que ostentam os escalpos que ele traz para casa todas as noites depois de sua “ronda”, que torna-se ainda mais assustadora com as melodias de Chattaway. O contraste da doçura dos acordes com a violência das cenas triplica o medo, que é e sempre será o objetivo principal de um bom filme de terror. Joe Spinell está ótimo como protagonista/autor e a beleza da inglesa Caroline Munro reforça a influência do gênero giallo, já que não se fazem horrores italianos sem uma bela ragazza em perigo.
Outro dedinho da terra da pizza presente em O maníaco é a sanguinolência sem limites. Tom Savini assina os efeitos especiais e não perde o ritmo que havia mostrado em Sexta-Feira 13, outro lançamento inesquecível de 1980. Fazendo jus a seu baixo orçamento e sua produção feita com muito amor e quase nenhuma censura, O Maníaco presenteou o público com cenas ótimas, como a da explosão da cabeça do próprio Savini, fazendo uma ponta como uma das vítimas masculinas de Frank. Isso sem contar a angustiante perseguição no metrô e os monólogos de Spinell com seus manequins. Tudo isso acompanhado de uma trilha que está mais para canção de ninar do que para pesadelo. Se os sons pontiagudos que imortalizaram a cena do chuveiro em Psicose, de Hitchcock, causam calafrios, a trilha de O maníaco precisa da imagem para se tornar apavorante. Talvez seja um dos motivos de não conseguirmos esquecê-la tão fácil.
O maníaco não envelheceu, o que torna ainda mais desnecessário o péssimo remake que ganhou em 2012, e que traz Elijad Wood no papel de Frank. O figurino anos 80 pode até causar risos, mas ver o personagem-título pregando os cabelos de suas vítimas em manequins enquanto conversa com eles perturba o sono. Pode ser que a geração de Jogos Mortais considere O maníaco brincadeira de criança. E não deixa de ser, já que é um trauma de infância o responsável pelo desejo incontrolável de matar que Frank apresenta. Mas o que assusta mesmo, é saber que o seu vizinho, aquele calado que é um mistério no bairro ou no prédio, pode ser um Frank. Abra o jornal e veja. Mas, antes, assista O maníaco. Se bobear, tem menos sangue na tela do que nas páginas.
Sobre o Colunista:
Bianca Zasso
Bianca Zasso jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitrio Franciscano (UNIFRA). Durante cinco anos foi figura ativa do projeto Cineclube Unifra. Com diversas publicaes, participou da obra Uma histria a cada filme (UFSM, vol. 4). Ama cinema desde que se entende por gente, mas foi a partir do final de 2008 que transformou essa paixo em tema de suas pesquisas. Na academia, seu foco o cinema oriental, com nfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questes flmicas e antropolgicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands. Como crtica de cinema seu trabalho se expande sobre boa parte da Stima Arte.