A Revolucao Americana
Cenas de uma revolucao; o nascimento da Nova Hollywood (2008), um ensaio de Mark Harris sobre a possivel revolucao cinematografica
A história da roteirização e de tudo o que ocorreu antes mesmo da pré-produção de Bonnie e Clyde: uma rajada de balas (1967), de Arthur Penn, ocupa o centro do pensamento de Cenas de uma revolução; o nascimento da Nova Hollywood (2008), um ensaio de Mark Harris sobre a possível revolução cinematográfica (e também social) que ocorreu nos meios hollywoodianos em meados dos anos 60 do século passado. Harris começa referindo-se a uma tarde qualquer de 1963 quando um jovem cinéfilo americano, Robert Benton, deparou com Jules e Jim (1961) numa de suas muitas revisões; na figura de Benton, Harris deposita sua análise do fascínio que o cinema do francês François Truffaut (e da nouvelle vague em geral) exercia sobre os apreciadores do cinema mais empenhado nos Estados Unidos. Harris narra, como se fora um romance, as idas e vindas desde o roteiro inicial de Benton e David Newman, a aproximação a Truffaut, os conselhos de roteiro do cineasta francês, as tentativas de oferecer a direção a Truffaut e depois a Godard, até que as câmaras de Bonnie e Clyde caíssem nas mãos de um americano, Arthur Penn. Nesta trajetória difusa e perturbadora de um filme desde seus conceitos iniciais até sua materialização final, Harris concentra seu estudo de como as coisas operam no centro da revolução à americana; é uma revolução, certo, mas o senso de negócios muito americano nunca se aparta —uma praticidade da estética que somente americanos como Harris, ou Pauline Kael (num determinado momento, habilmente descrita em suas grandezas e contradições por Harris em seu livro), podem descrever e sentir com precisão.
Pode-se dizer que a estrutura narrativo-crítica do livro de Harris emula aquela do já clássico Como a geração sexo-drogas-e-rock’n-roll salvou Hollywood (1998), de Peter Biskind, mas Harris apõe sua própria maneira a esta estrutura. Há pelo menos uma história daquele outro ensaio que se reconta no livro de Harris: a sessão de Bonnie e Clyde para o produtor Jack Warner, que começava a descartar o filme por ser “um filme de três mijadas”, ou seja, o famoso magnata do mundo do cinema teve de retirar-se da sala por três vezes para ir ao banheiro, o que caracterizaria um filme ruim —mesmo que Warner tivesse problemas de próstata, o que facilitava as visitas ao sanitário. Uma anedota extremamente espirituosa que também de uma certa maneira ajuda a definir os caminhos e os impasses da revolução americana.
De alguma forma o belo ensaio de Harris se adapta também às facilidades dos revolucionários americanos caracterizados nos cinco filmes que foram objeto de tese de Cenas de uma revolução.
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br