A Complexidade Narrativa de Morrison

Amada (Beloved 1987), um ponto alto da literatura da norte-americana Toni Morrison

16/05/2022 16:43 Por Eron Duarte Fagundes
A Complexidade Narrativa de Morrison

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Amada (Beloved 1987), um ponto alto da literatura da norte-americana Toni Morrison, busca chegar às formas delirantemente dispersas de seus seres pela utilização de síncopes narrativas, onde as investigações interiores em torno das personagens vão propondo caminhos que se interrompem para dar lugar a outros, curvas experimentais de linguagem e narração que aproximam o ensaio quase antropológico do canto agudamente lírico duma parte da sociedade americana maltratada ao longo dos séculos, da história do país.

Os tempos são idos. O ano da história assinalado no livro é 1873. “Durante anos cada um lidou com o rancor de seu próprio jeito, mas em 1873 Sethe e sua filha Denver foram suas únicas vítimas.” As coisas desenvolvem-se em linhas sinuosas, naturalmente, quase labirínticas em termos de construção formal e temática. As evocações se sucedem: um antigo bebê de Sethe, morto há anos, é um fantasma que assombra: a assombração real. Surge um amigo de Sethe dos tempos árduos da escravidão. A personagem de Amada, do título, é uma obscura intromissão no relato cuja função incógnita parece às vezes marcar o compasso do texto.

“Uma mulher completamente vestida saiu de dentro da água.” “Existe uma solidão que pode ser embalada.” “Todo mundo sabia como ela se chamava, mas ninguém sabia seu nome.” “Não era uma história para passar adiante.” “Então a esqueceram.” “Não o alento da desmembrada e inexplicada, mas o vento nos beirais, ou o gelo da primavera derretendo depressa demais.” Assim: frases-relâmpago para evocar a densidade e a dura poesia da arte de escrever de Morrison.

Amada acaricia, terna e profundamente, com seu verbo agridoce, a grande literatura em que etnia e moral se vão conjugando a duras penas.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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