Crtica da Iluso Pura

A idade pesa. No falo de dores nas costas ou de nmeros maiores na balana, mas de mudanas de ideias e caminhos. O esquecimento proposital da bssola parece ter entrado de vez na vida do diretor Woody Allen

28/08/2016 00:11 Por Bianca Zasso
Crítica da Ilusão Pura

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O Homem Irracional (Irrational Man)
Ano: 2015
Direção: Woody Allen

Disponível em DVD, Blu-Ray e na plataforma Netflix

A idade pesa. Não falo de dores nas costas ou de números maiores na balança, mas de mudanças de ideias e caminhos. O esquecimento proposital da bússola parece ter entrado de vez na vida do diretor Woody Allen. Depois de dedicar uma vida a filmar e enaltecer Nova York, ele deu alguns passeios pela Europa e agora parece ter chegado ao momento de respirar outros ares. Perto do mar, mais precisamente.

O homem irracional, lançado em 2015, apresenta alguns ingredientes que já vinham fazendo parte das novas receitas de Allen: as locações encantadoras e bem fotografadas pelo iraniano Darius Khondji, a ideia do crime perfeito e a atriz Emma Stone. E é ela e seus doces olhos azuis quem dita o ritmo da trama que tem como protagonista Abe Lucas, um professor de filosofia que encontra-se, em suas próprias palavras, no fundo do poço. Com pensamentos suicidas pairando em sua mente mais que os ensinamentos de Kant, ele resolve dar aulas numa universidade de uma pequena cidade dos Estados Unidos. Novo emprego, novos planos. Mas pouca coisa muda, mesmo ele contando com a ajuda da colega Rita e da aluna Jill. Algumas crises depois e o acaso traz a solução: em um café, um desabafo de uma mãe prestes a perder a guarda dos filhos na mesa ao lado presenteia Abe com uma razão para seguir em frente. Razão assassina. Isso porque a atitude do professor muda por completo quando ele decide que sua válvula motora é matar o juiz influente que é a pedra no caminho da mãe chorosa. Um crime e eis a redenção. A irracionalidade presente no título aparece. Percebemos que quem era para ser o amante mais voraz da razão dentro da história, se deixa levar pela adrenalina de cometer um ato ilícito como única forma de salvar sua alma da tristeza. A doce ilusão de que um gesto ousado vai mudar o mundo. O dele e o dos outros.

O ator Joaquin Phoenix imprime com competência a metamorfose de Abe, mas é Emma Stone quem mostra a que veio. Ao trazer para a inteligente Jill um ar de inocência graças a sua carinha de eterna adolescente, a atriz domina todas as cenas em que aparece. Sua perspicácia é muito mais simpática ao público que o plano diabólico que Abe arquiteta para dar sentido aos seus dias. Ele, que conquistou Jill pelo seu “intelecto charmoso” e suas divagações sobre ética, busca no assassinato de um desconhecido a cura para todos os seus males. Se ele dizia estar no fundo do poço no início da trama, parece ter ficado com a visão turva e não perceber que o fim da linha se aproxima a cada novo sorriso que ele abre. Do outro lado da história, Jill se mantém firme nas suas convicções e não se deixa fraquejar pela paixonite que o professor lhe causa. Como gosta Woody Allen, a personagem mais jovem se mostra madura enquanto o filósofo experiente age como um garoto que toca a campainha e sai correndo se sentindo o mais poderoso do bairro.

O homem irracional passa longe do poder de filmes como Hannah e suas irmãs ou Noivo Neurótico, Noiva Nervosa e não tem interpretações dignas de aplausos como a de Cate Blanchett em Blue Jasmine. O roteiro tem seus defeitos, personagens como o do namorado de Jill aparecem e desaparecem sem explicação e certas cenas parecem terem saído de alguma anotação perdida na criação de outro filme de Allen, O sonho de Cassandra, que também trabalha com a questão do crime perfeito. Isto não significa que o baixinho de óculos tenha perdido a mão para a Sétima Arte. As divagações de Abe à beira-mar não nos deixam esquecer quem assina os diálogos. Porém, há um quê de preguiça no ar, como se O homem irracional tivesse nascido apenas para que Allen mantenha sua promessa de lançar um filme por ano. Talvez ele não queira mais se levar à sério. Ou talvez seja apenas excesso de maresia.

 

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Sobre o Colunista:

Bianca Zasso

Bianca Zasso

Bianca Zasso jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitrio Franciscano (UNIFRA). Durante cinco anos foi figura ativa do projeto Cineclube Unifra. Com diversas publicaes, participou da obra Uma histria a cada filme (UFSM, vol. 4). Ama cinema desde que se entende por gente, mas foi a partir do final de 2008 que transformou essa paixo em tema de suas pesquisas. Na academia, seu foco o cinema oriental, com nfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questes flmicas e antropolgicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands. Como crtica de cinema seu trabalho se expande sobre boa parte da Stima Arte.

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