A Vinganca de Uma Mulher

Foi-se o humor elaborado de Denis Diderot

19/01/2023 17:49 Por Eron Duarte Fagundes
A Vinganca de Uma Mulher

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Foi-se o humor elaborado de Denis Diderot. O que resta em cena em Mademoiselle Vingança (Mademoiselle Joncquières; 2018), de Emmanuel Mouret, é uma plasticidade cinematográfica superficial que está ali para ilustrar um melodrama ambientado no século XVIII. Extraído de uma das muitas histórias que o escritor francês Diderot pôs na boca e nas circunstâncias de suas personagens centrais (Jacques, o amo, a hoteleira, que é esta a que narra, em fragmentos interrompidos no livro, o episódio que serve ao filme de Mouret) em Jacques le fataliste et son maître (1784), Mademoiselle Vingança percorre, com a habitual leveza narrativa francesa e tentando algumas sutilezas meio literárias que nunca são aprofundadas (pense-se em Éric Rohmer e sua profundidade), a trama em que Madame de la Pommeraye tem um envolvimento sentimental com um sedutor inveterado, o marquês dos Arcis, é por ele abandonada e tempos depois, para se vingar, o faz apaixonar-se por uma prostituta (ocultando dele esta realidade da moça), casando-o com ela. O realizador francês toma algumas liberdades para com o original de Diderot (menos que aquelas que o também francês Robert Bresson tomou ao verter o mesmo trecho em As damas do bosque de Bolonha, 1945), mas mantém o centro dramático e o próprio tempo histórico em que se deram os acontecimentos narrados por Diderot, o século XVIII.

Cécile de France, na pele da Madame maquiavélica e despeitada, é um dos trunfos da realização, tanto por sua beleza dentro da paisagem como por seus insinuantes recursos dramatúrgicos. Os demais do elenco parecem, nas composições, caricaturais e diminuídos. Bonito às vezes, irregular sempre, Mademoiselle Vingança não é uma obra capaz de permanecer forte na memória do espectador. Talvez uma das cenas mais curiosas do filme seja aquela em que a mulher vingativa leva o marquês, sua esposa recém-casada e a sogra para uma zona de meretrício buscando reconstituir um trecho do bordel de época; a ironia na face de Cécile de France e o espanto ingênuo das outras personagens funcionam, quando a maldosa vingativa revela ao noivo que é daquele antro que sua esposa e sua sogra vieram. Em As damas do bosque de Bolonha, ambientado no século XX, Bresson põe a revelação da prostituição da recém-casada numa frase que a maquiavélica ex-pretendente diz ao noivo no altar logo depois da cerimônia matrimonial. Bresson é sombrio. Mouret é mais álacre, solto, no modelo de ver de nosso século de superfícies.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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