RESENHA CRTICA: O Sal da Terra (The Salt of the Earth)
Foi uma pena no ter estreado no Brasil antes do Oscar, quando foi indicado oficialmente ao prmio
O Sal da Terra (The Salt of the Earth)
França, Brasil, 2014. 110 min. Documentário. Direção de Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado.
Foi uma pena não ter estreado no Brasil antes do Oscar, quando foi indicado oficialmente ao prêmio. Já se temia que não fosse ganhar, não porque não merecesse, a meu ver é sem dúvida o melhor da safra. Um trabalho delicado, sincero, de fazer chorar. E pensar muito. Muito superior ao vencedor o confuso CitizenFour, mas todo mundo sabe que os americanos são muito auto-centrados e ignorantes dos problemas no resto do mundo. Ganhou, porém em Cannes, Prêmio Especial do Júri no Un Certain Regard, mais o César de melhor documentário, foi indicado ao Goya e Independent Spirit. Ganhou ainda nos Festivais de San Sebastian e Munich, ambos importantes.
Eu gosto muito também do documentário brasileiro feito sobre Sebastião Salgado e que foi premiado em Gramado, dirigido por Betse de Paula (que não consta do IMDB), chamado Revelando Sebastião Salgado (13), feito na intimidade de sua casa em Paris, por vezes muito revelador e descontraído. Não é melhor ou pior que este, é diferente. Aqui ele tem uma chance maior de revisar toda sua carreira, aprofundar a obra e até a vida pessoal. Mas é um filme pesado porque simplesmente ele por diversas vezes caminhou em pleno inferno e não se consegue nem imaginar como conseguiu escapar relativamente ileso. Ao menos de cabeça (ainda que confesse, um pouco surdo).
Sou admirador confesso da obra de Sebastião, de quem tenho adquirido as obras e ficado de queixo caído com seu poder de captar instantâneos de vida e morte, de lugares e momentos, com uma sensibilidade (e piedade!) que o levam num determinado momento do filme ao desabafo: chegando a conclusão de que o ser humano realmente não presta, não tem saída, está fadado a destruição. Embora seja fácil compartilhar desse pensamento vendo as imagens que ele captou dos incêndios de poços petrolíferos no Kuwait, das mulheres e velhos que fugiam do Sérvios, dos fugitivos de Rwana que se esconderam nas florestas do Congo, com a morte certa. De crianças que estão morrendo de fome com uma coragem inacreditável.
Wim Wenders se apresenta como admirador de Salgado, primeiro descobrindo-o por acaso numa exposição, depois basicamente ouvindo o artista enquanto relembra seus livros mais importantes, os lugares mais notáveis chegando a uma conclusão muito feliz, que é o seu retorno ao Brasil, a velha fazenda dos pais em Minas Gerais, que ele com a mulher de família conseguiu reflorestar como Mata Atlântica e hoje já é um parque. Só na natureza encontra a resposta para uma compreensível angústia em ser um repórter de guerras...
O filho participa com mais discrição já que Sebastião Salgado é a grande figura como artista e como ser humano. Confesso que tive lutar contra a emoção de muitos momentos que ele retratou. E achei a floresta a solução perfeita para encerrar este belo e sensível documentário.
Sobre o Colunista:
Rubens Ewald Filho
Rubens Ewald Filho jornalista formado pela Universidade Catlica de Santos (UniSantos), alm de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados crticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veculos comunicao do pas, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de So Paulo, alm de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a dcada de 1980). Seus guias impressos anuais so tidos como a melhor referncia em lngua portuguesa sobre a stima arte. Rubens j assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e sempre requisitado para falar dos indicados na poca da premiao do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleo particular dos filmes em que ela participou. Fez participaes em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minissries, incluindo as duas adaptaes de ramos Seis de Maria Jos Dupr. Ainda criana, comeou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, alm do ttulo, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informaes. Rubens considera seu trabalho mais importante o Dicionrio de Cineastas, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o nico de seu gnero no Brasil.