A Luz Cinematográfica

Desde sua primeira imagem, O moinho e a cruz (2010), filme polonês dirigido por Lech Majewski, é uma ode à plasticidade que se movimenta dentro do olhar do espectador.

22/12/2012 22:08 Por Eron Fagundes
A Luz Cinematográfica

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Desde sua primeira imagem, O moinho e a cruz (2010), filme polonês dirigido por Lech Majewski, é uma ode à plasticidade que se movimenta dentro do olhar do espectador. Praticamente sem diálogos, encenado entre silêncios e ruídos do ambiente, o filme recria a luz pictórica no cinema valendo-se duma possível adaptação para a imagem em movimento dos quadros sombriamente sacros de seu protagonista, o pintor holandês Pieter Brueghel; desprovido das falas entre as personagens, que se movem como peças icônicas do cenário, a narrativa só usa a palavra para as explicações do pintor para o que está pintado (o pintor está falando para um interlocutor mudo que, em cena, poderia representar o próprio espectador) ou para meditações da personagem da Mãe de Deus interpretada com absoluto estranhamento pela inglesa Charlotte Rampling.

Considerado uma adaptação da pintura “Caminho para o Calvário” para o cinema, O moinho e a cruz tem em seu centro a própria figura de Brueghel (vivida pelo holandês Rutger Hauer) e faz circulações agudas nestas relações entre a pintura e o cinema e nas busca da luz própria cinematográfica. A profundidade mística erigida por Majewski cria uma linguagem cinematográfica que ultrapassa as simples citações pictóricas. Discutindo com Brughel (para além do tempo e dos anacronismos impossíveis: Brughel é um antigo e Majewski é um nosso contemporâneo) a posição dos elementos dentro do quadro, o cineasta polonês não fica na alusão propriamente, como o australiano Peter Weier em seu clássico Piquenique na montanha misteriosa (1975), em suas referências ao angelical-perverso do pintor italiano renascentista Sandro Botticelli. A procura da luz cinematográfica dentro da pintura levou o francês Bertrand Tavernier a chafurdar no elemento impressionista de Auguste Renoir dentro do cinema realista do filho de Auguste, o realizador Jean Renoir, em Um sonho de domingo (1984). O americano Terrence Malick acentuou a plasticidade em arroubos fotográficos em Cinzas no paraíso (1978). Já o inglês Derek Jarman, cinebiografando Michelangelo Caravaggio em Caravaggio (1984), atuou sobre a montagem, criando um elo entre a estática e a dinâmica no cinema. A questão das relações entre pintar e filmar pode estender-se ainda a filmes de intenções aparentemente distantes de intenções pictóricas. Por exemplo, A idade da terra (1980), do brasileiro Glauber Rocha, traz uma ofuscação experimental por alguns excessos de luzes. A luz crua de Vidas secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos, age um pouco como um pintor nordestino.

Dentro das múltiplas possibilidades da luz cinematográfica, O moinho e a cruz adota um rigor moral (num modelo dos Países Baixos) em que a forma estética vem a ser determinada por uma certa conduta ético-cristã do cineasta. Desde já um dos grandes filmes desta segunda década do século XXI, O moinho e a cruz reconduz o observador a um gosto por assertivas plásticas intensas.

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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