Daniel Galera permanece buscando uma contemporaneidade epidérmica em O deus das avencas (2021), livro feito da fusão de três novelas (três histórias) que procuram dialogar entre si, complementando-se no dizer. É bem verdade que o ficcionista busca uma criatividade de linguagem que foge aos tons menos inventivos de seus primeiros trabalhos; o universo excêntrico e futurista igualmente ajuda a dar ao leitor uma grande sensação de novidade. Mas as habituais traves narrativas da literatura de Galera emperram as ligações entre sua arte e os significados que ele aspira a ter no lado de fora da página literária. Há um romance gaúcho atual, A extinção das abelhas (2021), de Natalia Borges Polesso, igualmente voltado para o contemporâneo do colapso ambiental no globo, e as semelhanças são várias, inclusive na presença de abelhas, o que é uma simples coincidência, parece, pois são escritos concomitantes, a não ser que os livros tenham tomado uma base comum que o comentarista desconhece. Porém Natalia tem, em grau maior que Galera, o senso literário para ligar verbo e realidade de maneira aguda. Em Galera esta ligação é sempre problemática: falta algo na cadeia.

As três novelas se interligam de maneira tranquila, não há dúvida: “O deus das avencas”, a primeira, vê um casal confinado que espera o nascimento dum primeiro filho; é um presente assustador; “Tóquio’ vai para o futuro-presente em que nosso trato com o meio-ambiente destruiu o planeta; “Bugônia” mergulha num imaginário pós-apocalíptico. Tudo escrito de maneira exuberante às vezes, mas incapaz de dar o grande salto para uma reflexão cortante como aquela de Natalia em A extinção das abelhas.

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)