NA NETFLIX: O Poc,o
Num sistema prisional vertical, os encarcerados vivem de dois em dois em plataformas numeradas. Quando sao obrigados a racionar alimentos, instala-se uma crise social, gerando motins e uma onda de viol?encia e assassinatos
O Poço (El hoyo/ The platform). Espanha, 2019, 94 minutos. Horror/Ação. Colorido. Dirigido por Galder Gaztelu-Urrutia. Distribuição: Netflix
Nesses dias de isolamento social devido à pandemia do Covid-19, o Netflix comprou os direitos de um filme espanhol violento e sombrio sobre cárcere, ganhador de prêmios em festivais como Toronto, Sitges, Gaudí e Goya, que havia sido lançado na Espanha em 2019, mas pouca gente assistiu. Ou seja, não é uma produção original do Netflix, e sim a distribuição no Brasil e em outros países foi realizada por ela.
Foi filmado dentro de uma câmara fechada com poucos cenários e personagens, que vão enlouquecendo durante o longo confinamento. As pessoas dali recebem uma mesa farta de comida, por meio de uma plataforma móvel, que desce, e que deve ser consumida em tempo recorde – ela vem cheia no primeiro nível, e vai descendo, deixando as sobras para outros níveis, para os debaixo se alimentarem. O foco é no personagem Goreng (Ivan Massagué), que divide a cela com um velho misterioso. Chega o dia em que ele decide subir para ver os outros níveis, e quando todos precisam racionar comida, instala-se uma crise social sem precedentes. Pessoas vão se espancar até a morte, a trama fica sinistra, obscura, violenta, até atingir o ápice num desfecho sombrio, uma triste alegoria, aberta a interpretações. Fica a pergunta: “O que deixaremos para as próximas gerações?”
Em seu primeiro longa-metragem, o criativo e ousado diretor espanhol Galder Gaztelu-Urrutia realizou um filmaço que apela para uma crítica às camadas sociais, ao isolamento, às atitudes desumanas que as pessoas podem ter diante do caos, a disputa por comida num sistema cruel que devora a gente. No ponto em que o protagonista pretende escalar até o andar de cima, há uma metáfora sobre o atual sistema que não permite que os pobres possam ascender na sociedade (como diz na abertura, “Existem três tipos de pessoas: as de cima, as de baixo e as que caem”), ou seja, a única mudança de estágio é para baixo...
Misturando terror, ação e scifi (a história é num futuro incerto), com uma fotografia apreensiva, bem escura com tons avermelhados, é um tapa na cara, que serve como reflexão nessa terrível época de pandemia, onde muita gente estoca alimentos e não tem um pingo de solidariedade com o próximo.
Ao público claustrofóbico e àqueles que se impressionam com fitas violentas, cuidado ao assistir!
Sobre o Colunista:
Felipe Brida
Jornalista e especialista em Artes Visuais e Intermeios pela Unicamp. Pesquisador na área de cinema desde 1997. Ministra palestras e minicursos de cinema em faculdades e universidades. Professor de Semiótica e História da Arte no Imes Catanduva (Instituto Municipal de Ensino Superior de Catanduva) e coordenador do curso técnico de Arte Dramática no Senac Catanduva. Redator especial dos sites de cinema E-pipoca e Cineminha (UOL). Apresenta o programa semanal Mais Cinema, na Nova TV Catanduva, e mantém as colunas Filme & Arte, na rede "Diário da Região", e Middia Cinema, na Middia Magazine. Escreve para o site Observatório da Imprensa e para o informativo eletrônico Colunas & Notas. Consultor do Brafft - Brazilian Film Festival of Toronto 2009 e do Expressions of Brazil (Canadá). Criador e mantenedor do blog Setor Cinema desde 2003. Como jornalista atuou na rádio Jovem Pan FM Catanduva e no jornal Notícia da Manhã. Ex-comentarista de cinema nas rádios Bandeirantes e Globo AM, foi um dos criadores dos sites Go!Cinema (1998-2000), CINEinCAT (2001-2002) e Webcena (2001-2003), e participa como júri em festivais de cinema de todo o país. Contato: felipebb85@hotmail.com