Sylvia Kristel, a Emmanuelle, morre aos 60 anos
A atriz foi símbolo sexual da geração dos anos 70-80
Hoje pode não dizer muito, mas houve momento em que ser Emmanuelle queria dizer muito. Símbolo sexual da geração dos anos 70-80, vinda da inesperada Holanda, Sylvia Kristel esteve algumas vezes na Brasil. Estive com ela numa entrevista exclusiva, onde ela impressionava pela pele muito clara (nunca tomava sol, insistia), por ser uma moça muito discreta, educada. Nada escandalosa como seus filmes faziam supor. Sylvia morreu de câncer dia 18 de outubro e estava internada num hospital desde julho, quando teve um derrame. Tinha 60 anos e há algum tempo tinha perdido tudo.
Tudo tinha acontecido por causa de um filme de 1974 que no final das contas não era nem tão ousado, nem muito bom. Mas virou uma lenda. As pessoas viajavam para Paris para assisti-lo e comentar as cenas (também não especialmente fortes a não ser por um show de boate em Bangkok onde se fumava de forma não convencional). Era o que se chamava de pornô chique, não explicito, mas sugestivo, o que manteve o filme em cartaz durante anos em particular nos Champs Elysées. Aqui sua última edição saiu em DVD: Emmanuelle, O verdadeiro e original (Emmanuelle, 73)
Foram tantas as imitações que quando chegou ao Brasil, em 1980, recebeu o título de Emmanuelle, a Verdadeira. Lançado em DVD como filme erótico e não como um clássico. Enorme sucesso no mundo todo (na França ficou mais de 300 semanas em cartaz, virou atração turística e foi visto por sete milhões de pessoas). No Brasil, originalmente, sofreu um corte da censura (na cena em que a mulher “fuma pelo sexo”).
A fotografia era requintada, parecendo filme publicitário, e foi apelidada de “pornô-chique”. Mas a cópia desta versão lançada em home vídeo deixa a desejar. O livro original de Emmanuelle Arsan foi escrito em 1957 e ficou proibido durante o governo De Gaulle. Seu maior enfoque é o homossexualismo feminino. Não há muita lógica ou motivação. As cenas de sexo são gratuitas e não muito convincentes. Mesmo assim provocaram escândalo e tiveram muita influência. Há muitos encontros lésbicos não explícitos e ao final uma cena com sodomia masculina. Valeu também como revelação da holandesa Sylvia Kristel, de uma beleza de porcelana. Teve inúmeras continuações.
Sylvia nasceu em 28 de setembro de 1952, em Utrecht. Descoberta pelo diretor Jaeckin, ela fez mais duas continuações antes de tentar a carreira em filmes europeus (como Julia e os Homens, 74) e até em filmes americanos, fazendo uma aeromoça com Alain Delon, em Aeroporto, Concorde (79), A bomba que desnuda (80), comédia que tentou reviver os atores da série Maxwell Smart, a comédia erótica Uma Professora muito Especial (81), que foi bastante bem-sucedida (era professora/governanta que seduz o aluno do garoto de 15 anos Eric Brown).
Esteve ainda em outros filmes como uma versão de O Amante de Lady Chatterley (81), a comedia italiana Amor na Primeira Classe (80, de Salvatore Samperi), O Quinto Mosqueteiro (79), Casanova o maior amante de todos os tempos, O Gângster René La Canne (de arte), de Francis Girod, Alice ou A Última Fuga, de Chabrol, (76), A Margem, de Valerian Borowicz, (76), Uma Mulher Fiel, de Roger Vadim (76); O Jogo com o Fogo (Le Jeu avec le Feu), de Alain Robe; Grillet, (75), A Grande Aposta, Mata Hari, de Curtis Harrington (85), Mistérios,com Rutger Hauer, Leito Selvagem, ultimo filme de Luigi Zampa (79), Por que eu Agrado aos Homens (de arte), Sangue Quente , Presidio Estrada do Inferno, Viúva Drácula, Un Linceul na paz de Poche, de Jean-Pierre Mocky (74). Seus dois últimos filmes foram Two Sunny Days (2010) e o telefilme Le Ragazze dello Swing (2012).
E sem esquecer ainda varias continuações de Emmanuelle, como Gooobye Emmanuelle e mais uma série feita para a TV, em 93, Emmanuelle no Sétimo Ceu, O Segredo de Emmanuelle, Beauty School, O Perfume de Emmanuelle, A Magia de Emmanuelle, O Amor de Emmanuelle, Veneza com Emmanuelle, A Vingança de Emmanuelle, Para Sempre Emmanuelle.
Falava holandês, inglês, francês e italiano mas não teve sorte na sua vida particular. Foi casado com o diretor Philipe Blot (divórcio em 1991) e teve que recorrer a pontas em outros filmes.
Fica a lembrança de uma bela mulher, discreta e recatada demais para ser atriz. Teve chances em outros papéis e com diretores importantes, mas nunca correspondeu, não tinha fôlego para coisas mais importantes. Foi outra que teve que viver com uma imagem sensual que tinha pouco a ver com ela!
Sobre o Colunista:
Rubens Ewald Filho
Rubens Ewald Filho é jornalista formado pela Universidade Católica de Santos (UniSantos), além de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados críticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veículos comunicação do país, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de São Paulo, além de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a década de 1980). Seus guias impressos anuais são tidos como a melhor referência em língua portuguesa sobre a sétima arte. Rubens já assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e é sempre requisitado para falar dos indicados na época da premiação do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fãs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleção particular dos filmes em que ela participou. Fez participações em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minisséries, incluindo as duas adaptações de Éramos Seis de Maria José Dupré. Ainda criança, começou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, além do título, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informações. Rubens considera seu trabalho mais importante o Dicionário de Cineastas, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o único de seu gênero no Brasil.