O Texto Pleno de Jos Geraldo

Jos Geraldo Vieira soube manipular as inquietaes de suas personagens como ningum

09/09/2015 09:28 Da Redação
O Texto Pleno de José Geraldo

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Eis então o último romance de José Geraldo Vieira, A mais que branca (1974). Ele faleceria em 1977. Ao longo do século XX ele foi o mais criativo romancista brasileiro. Soube manipular as inquietações de suas personagens como ninguém. E ninguém como ele elevou a língua portuguesa a seus melhores parâmetros: sintáticos, vocabulares. Um termo raro, uma sintaxe pouco vista, alguns torneios de escrever que remetem ao melhor da língua portuguesa. É um pouco como Joris-Karl Huysmans em língua francesa. Não surpreende que um certo olhar apressado da posteridade esqueça José Geraldo: ele apresenta algumas dificuldades que somente o gosto por seu texto insinuantemente verbal pode vencer. Seu verbalismo é essencialmente literário e  suas constantes metáforas se ligam cortantemente aos entrechos de sua ficção.

Em plena década de 70, quando boa parte da literatura mergulhava numa espécie de mediocridade jornalística ou publicitária, José Geraldo apresenta um romance como A mais que branca, ambientado em boa parte em solos carioca e baiano, que nunca desdenha de referências contemporâneas (uma alusão a Ziraldo, uma flecha para um Fla-Flu no Maracanã), mas onde o ficcionista permanece íntegro em usar e abusar dos grandes recursos que o português lhe dá e que ele sabe manejar admiravelmente.

O centro de A mais que branca é uma história de amor de alcova. Raymonde foi uma francesa que de certa maneira fez a vida na noite carioca. Conheceu um brasileiro, Lúcio. Relacionaram-se. Ele sumiu-se. Ela engravidou. Teve uma filha. Raymonde morreu no parto. Outras pessoas criaram a menina, Rita. Tempos depois, já no fim do romance, pai e filha se reencontram. Mas o romancista, magistralmente, suspende a pena ao anunciar este reencontro. “Rita, que se isolara em casa, saiu depressa. E tanto Lúcio, que já vinha a meio caminho, como os demais que o seguiam, a viram toda de branco, do lado de fora da cancela, surgir no acostamento como se lhe viesse ao encontro. Mas sem hesitar ela atravessou o asfalto e sumiu na mata que contornou o desfiladeiro. Ele correu imediatamente para a rampa por entre troncos, ramos e penhas; até que, ainda aturdido e já ofegante, avistou a filha iluminada pelo sol oblíquo das dez horas, esperando-o em êxtase perto da adansônia.” Uma história de amor de alcova que vai ter a um início de relação entre um pai e sua filha desconhecida.

Embora não tenha a grandiosidade de A quadragésima porta (1943) ou a agudeza sentimental de A ladeira da memória (1950), A mais que branca percorre os mesmos caminhos de sinfonia linguística praticamente única em nossa língua de que se revestem todos os livros de José Geraldo Vieira.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a dcada de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicaes de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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