A Linguagem Absoluta em Jose Geraldo Vieira

O albatroz, em seus profundos efeitos literarios, eh marcado pela sens?vel grandiloquencia habitual de Jose Geraldo Vieira

01/06/2020 14:22 Por Eron Duarte Fagundes
A Linguagem Absoluta em Jose Geraldo Vieira

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Cada retorno meu à literatura de José Geraldo Vieira é um acontecimento. Acontece assim com O albatroz (1952), um romance em que os achados técnicos e a sensibilidade estética costuram uma narrativa que aqui e ali parece desarrazoada e desparelha pelos excessos de curvas e por uma linguagem em que a sintaxe e o vocabulário barrocos simulam perder o pé mais que em outros livros do escritor. No entanto, a densidade criativa do artista acaba por conquistar parcelas do coração de ler; são parcelas poéticas únicas que edificam um autêntico romance poemático. Acabamos, surpreendentemente, amando o desparelho, o exagerado, o tensamente anacrônico.

“Indiscutivelmente aquele telegrama —chegado horas depois da comunicação oficial— conquanto fosse mera insistência num pedido antigo, tomou em tal conjuntura um caráter lúgubre.” Assim começa O alabatroz, com um telegrama para anunciar o trágico a uma família nos tempos da guerra. Depois, o narrador recua nos tempos: passa pelo fim do século XIX, na campanha de Canudos, olha de passagem a gripe espanhola de 1918, antes estivera nas evocações da I Guerra Mundial, até desembocar de novo na II Guerra Mundial. No centro, uma mulher trágica, Virgínia, com a mesma aura de outras figuras femininas do universo de José Geraldo, a Lúcia de A mulher que fugiu de Sodoma (1931), a Renata de A ladeira da memória (1950) ou mesmo a francesa Raymonde de A mais que branca (1974). Mas O albatroz tem um pouco a gigantesca estrutura temporal e espacial de A quadragésima porta (1943); no entanto, desenvolvido em menos páginas, com um barroquismo condensado, O albatroz tem a falsa aparência de ter atropelado seu desenvolvimento por alguma coisa desconhecida nas ações mundanas e sociais do escritor; no entanto (de novo), O albatroz, em seus profundos efeitos literários, é marcado pela sensível grandiloquência habitual de José Geraldo. Há em O albatroz uma francesa, Nanny, o “caso” de Fernando, o neto de Virgínia que vai para a guerra e morre, assim como Raymonde viria a preencher a necessidade francesa do universo de José Geraldo, que viveu e estudou na França na juventude; mas é Virgínia, com suas tragédias (em fases bem marcadas de sua vida, perde tragicamente o pai, o marido, o filho e finalmente o neto), quem assoma no romance elevando-o aos patamares habituais da prosa de José Geraldo, um dos pontos mais originais e densos da literatura brasileira.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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